Privatizações e suas tenebrosas consequências

Quem viveu as batalhas contra as privatizações, marco principal da implantação do neoliberalismo em nossas plagas nos trágicos períodos Collor e FHC, já previa. Não há surpresa com o quadro de insegurança caótica dos transportes no Rio de Janeiro. Greves de ferroviários e rodoviários, quebradeira na estação das barcas, tudo isso era previsível quando se fazia a denúncia da entrega desses essenciais serviços públicos à sanha do lucro privado.


“Dinossauros” incapazes de compreender o avanço da modernidade e a necessidade de diminuir o papel do Estado na economia real, era o que gritavam, em retorno, os principais meios de comunicação, através de seus colunistas cooptados, ou vendidos.


Desde as tribunas da Câmara dos Deputados, ainda reverberam os discursos candentes dos ex-esquerdistas alojados na legenda do PSDB e dos reacionários empedernidos abrigados no PFL, com a anuência dos cínicos de sempre, ressaltadas as raras exceções regionais, ocultados no bonde do PMDB. Afirmavam, todos, a necessidade de combater os “privilégios dos marajás das estatais”, com apoio, aliás, de parte expressiva da bancada do próprio PT, quando na oposição.


Os que combatiam as privatizações, não mitificavam a pureza da empresas estatais. Mas exigiam, para saná-las de suas deficiências, uma democratização do controle público, sobre suas administrações. E combatiam as privatizações porque isso representaria exatamente a entrega do galinheiro às raposas. Aos que sempre haviam sido privilegiados pela privatização dos espaços governamentais decisórios.


A privatização das barcas e do Metrô, como exemplos oportunos na conjuntura atual, só se justificava pela lei da vantagem. Não havia reclamações objetivas contra o serviço público. Pelo contrário. O Metrô, principalmente, sempre foi exemplar quando administrado pelo Estado. Horários respeitados, segurança para os que dele se serviam; estava ali um exemplo de algo que pertencia ao patrimônio público e não tinha por que ser alienado. Mas a “modernidade” exigia a privataria.


Está aí o resultado. Risco de vida para entrar num vagão do Metrô no hora do rush. Risco de vida para entrar num trem da Supervia. Risco de vida para entrar numa barca para Niterói.


O governo Sérgio Cabral, principal aliado do governo Lula entre os governadores do PMDB – e que se empenha, não sabemos com que interesse, na privatização do Galeão –, não tinha outra saída mais coerente com sua história. Para reforçar a bandalheira que a empresa concessionária dos serviços de barcas continua a operar, emprestou-lhe – sem que o prezado público tenha sido informado das condições – R$ 8 milhões do Estado.

 Para quê? Para que esses predadores cumpram obrigações contratuais, já estabelecidas e assinadas no momento de privatização dos serviços, mas nunca cumpridas, principalmente no que diz respeito à estação de São Gonçalo, fundamental para desanuviar – a partir de utilização de terminal distinto na Praça XV – concentração em direção a Niterói. Pior que isso, só a declaração do porta-voz da Barcas S.A., convocando os interessados a dispensar a barca na hora de rush,trocando-a por outro meio de transporte. Sem vergonha. Por coincidência, quem controla o monopólio da linha de ônibus entre Rio e Niterói? A empresa 1001, do grupo que tem a concessão das barcas.


Mas, voltando aos R$ 8 milhões. São tirados de onde? Do erário, que continua com déficits brutais em relação à saúde e educação, “por falta de recursos” em função da famigerada Lei de Responsabilidade Fiscal, imposta pelo mandarinato tucano-pefelista de FHC, para garantir o lucro dos banqueiros. Ou seja; sacou do que falta às políticas públicas o que poderia ser um investimento lucrativo, caso o Estado do Rio de Janeiro ainda contasse com o seu banco público.


Mas qual o quê...Vamos esquecer que Sergio Cabral, então presidente da Alerj, foi quem conduziu a votação da emenda à Constituição Estadual, legalizando a entrega do Banerj, na bacia das almas – no período obscuro do governo Marcelo- Marco Aurélio Alencar –, ao Banco Itaú, um dos principais controladores dos títulos da dívida pública do governo brasileiro?


Nesse contexto, não há outra saída para o problema. A se manterem em mãos de monopólios sem compromisso com algo além do lucro sem limites, é muito mais justo entregar os serviços públicos essenciais à cidadania ao monopólio estatal, sobre forte controle social.


Vamos abrir uma discussão sobre a reestatização desses serviços essenciais. Reestatização, a despeito da inexplicável prorrogação da concessão do Metrô, por mais vinte anos, antes mesmo da extinção do prazo em andamento e não vencido. Coisa só explicável pela submissão de governantes aos interesses de Daniel Dantas.


Vamos retomar a bandeira, que nunca deveria ter sido arriada, contra as privatizações, ora ainda sendo executada, no plano federal, pelo governo Lula, com a injeção de recursos no bolso dos banqueiros, do agronegócio e nas grandes empreiteiras, para compensá-los da crise especulativa dos “mercados”.

Milton Temer é jornalista e presidente da Fundação Lauro Campos

http://www.socialismo.org.br/portal/transporte/125-artigo/867-privatizacoes-e-suas-tenebrosas-consequeencias

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey