Mais do que escolher entre o atual presidente e o ex-governador de São Paulo, os eleitores brasileiros irão optar por uma dentre duas visões políticas. Ou manifestarão sua inclinação pelo projeto neoliberal, privatizador e favorável ao ingresso na Alca (Área de Livre Comércio das Américas) ou optarão por governo que não crê que o funcionamento do mercado traz, por si mesmo, equilíbrio aos desníveis sociais e promoção do desenvolvimento econômico, além de recusar a suposição de que se pode aderir à ALCA sem comprometer a vitalidade de nosso parque industrial e o mercado de trabalho.
Todos e cada um podem dar-se mil e uma explicações para votarem neste ou naquele candidato, mas, queiram ou não, estarão optando por uma dentre estas duas escolhas. É que ambos os disputantes, ao longo de suas histórias políticas e de seus governos, tanto como seus principais apoios, já deram provas amplamente suficientes de que se afiliam, cada qual, a estas respectivas correntes de pensamento. Nenhuma declaração que façam às vésperas das eleições merecerá credibilidade suficiente para desfazer tais certezas. Nestas épocas, políticos assumem compromissos formais que depois descumprem com a maior naturalidade. E os eleitores não os desprezam por isto.
Basta lembrar que o importante líder do PSDB, que até há pouco era o Prefeito da Capital, quando candidato àquele cargo, desafiado pelo apresentador de um programa de televisão de grande audiência, garantiu formalmente que se vencesse a disputa continuaria na Prefeitura de São Paulo até concluir o mandato e comprometeu-se a aconselhar os eleitores a não votarem nele se descumprisse sua palavra .... É o governador recém- eleito!
Seria falsa a suposição de que as áreas políticas que dão suporte aos candidatos à Presidência representam padrões de moralidade pública contrapostos. Nesta matéria nenhuma das acusações contra o atual governo pode se comparar à gravidade do que sucedeu no período de seu predecessor.
Por muito convicto que se esteja acerca do conhecimento presidencial sobre sérios desmandos ocorridos na atual gestão, nada se compara ao fato de que seu predecessor, à época do leilão da Telebras, foi flagrado em plena prática de comportamento qualificável como crime pela Lei de Licitações e enquadrável na Lei de Improbidade Administrativa: a gravação de uma conversa sua com o ex-ministro Mendonça de Barros, concordando em que seu nome fosse utilizado para pressionar o fundo de pensões do Banco do Brasil no apoio ao licitante Opportunity.
Dito ministro teve conversas suas, entremeadas, aliás, de palavras de baixo calão, gravadas e divulgadas pelos meios de comunicação, nas quais ficou transparente que procurava operosamente interferir no leilão. Foi uma das autoridades que, naquele governo, caiu em razão destes escândalos, os quais, todavia, não tiveram maiores conseqüências. Opostamente ao que hoje ocorre, o procurador-geral da República da época foi apelidado pelos seus críticos como "engavetador geral da República".
Outrossim, a compra de votos de parlamentares igualmente ocorreu no governo pessedebista, de FHC. Não em favor de projetos de lei considerados desejáveis pelo governo, mas em prol de uma emenda constitucional que possibilitasse sua reeleição. Dentre os deputados acusados de mercadejarem o voto, dois deles, que, conforme se dizia receberam R$ 200 mil cada, renunciaram para não serem cassados. Houve naquele tempo grande número de escândalos, com abafamento das CPIs. Assim, sem querer crucificar ninguém, o certo é que seria incorreto qualificar a um período presidencial como ofensivo à moralidade administrativa e esquecer que vícios da mesma índole afetaram ao outro grupo político que ora disputa a presidência.
Daí porque se disse que o verdadeiro confronto é, na verdade, simplesmente, entre duas concepções político administrativas. A imprensa, baseada nas pesquisas, anota que uma das candidaturas conta com maior apoio entre os mais instruídos. Se, na ultima hora, estes quiserem guiar-se pela racionalidade, como seria natural, haveriam de perguntar-se pelos resultados obtidos na condução do País pela ação de uma e de outra linha política. Basta cotejar os sucessivos governos. No último ano do governo neoliberal, a inflação foi de 12,3%; no mês de agosto de 2.006 reduziu-se a 3,84%. As reservas internacionais, em milhões de dólares, eram de 37.823 e em setembro deste ano de 73.456; a dívida com o FMI era de 14,7 bilhões de dólares e com o Clube de Paris de 5 bilhões. Hoje é de 0 dólares em ambos os casos; o risco-país caiu de 1.529 pontos para 222 em 31 de agosto de 2.006.
Em três anos as exportações passaram de 60 para 120 bilhões e o saldo comercial, dantes negativo em mais de 8 bilhões de dólares passou a mais de 100 bilhões positivos. O salário mínimo que equivalia a 55 dólares passou a corresponder a 152 dólares, o que explica os dados sociais favoráveis que foram divulgados pela imprensa. O desemprego, de 12,2% caiu para 9,6%.
Foram gerados mais de 4 milhões de empregos com carteira assinada, com média anual de 1,14 milhão contra 700 mil no governo anterior, ou seja, média anual de 87.500. Entre 2002 e 2004, os 20% mais pobres da população tiveram um aumento de renda de 33%: cerca de 10% ao ano. O programa "Luz para Todos" já atendeu a 3 milhões e 300 mil pessoas contra os 2 milhões e 700 mil nos oito anos do governo precedente. O programa de distribuição de leite no semi-árido, que inexistia anteriormente, beneficia a 3 milhões de brasileiros.
Estes são alguns dados que podem ser colhidos entre um número imenso de indicadores representativos de acentuada melhoria tanto na esfera econômica quanto na social. Uma comparação fria entre ambos os períodos é altamente vantajosa para este último. Eis porque, com o devido respeito pelos que pensam de maneira diversa, creio poder dizer, apoiado em razões sólidas e despojado de preconceitos: estou com Lula e não abro.
In Gazeta Mercantil,
Celso A. Bandeira de Mello - Jurista, especialista em Direito Administrativo
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