Revolucionários e beligerantes

Adilson Roberto Gonçalves

 

            Apresento e avalio quatro situações recentes em que beligerantes e revolucionários são relembrados. Elas não necessariamente se interligam, a não ser pela coincidência temporal da atualidade.

            Começando pela Argentina, não demorou muito para que o governo de Milei pusesse em prática sua distopia raivosa para além de seu território. Está em dificuldade para dar sequência ao mirabolante pacote legal, mas seu representante no Brasil Rodrigo Bardoneschi voltou a clamar a soberania argentina sobre as Malvinas/Falklands e outros territórios insulares como se nenhuma história houvesse sido construída ao longo dos últimos séculos, em artigo para a Folha de S. Paulo em 3/1. É típica prática diversionista, pois os reais problemas do vizinho estão lá dentro, a começar pelo ocupante da Casa Rosada.

            Por aqui também temos o estímulo à violência e à morte patrocinado pelo governador fluminense em São Paulo, o que não é nenhuma surpresa. Tarcísio de Freitas renega a evidência científica da menor letalidade de todos os lados com o uso de câmeras nos uniformes policiais, da mesma forma com que continua a apoiar o bolsonarismo golpista. A aparente aproximação à democracia representada pelo encontro com Lula é apenas protocolar para dar continuidade a projetos de interesse do país. E a ironia é que, infelizmente, mais um policial é baleado e morto, e a identificação do criminoso se dá exatamente pelas imagens da câmara corporal que ele portava durante a abordagem.

            Retrocedendo à guerra fria, a revista piauí surpreendeu na edição de janeiro de 2024 com a desconstrução do mito Henry Kissinger, em artigo de Roberto Simon (Muy amigo), em que o secretário de Estado não teria responsabilidade sobre a carnificina que depôs governos progressistas na América Latina, o Chile em particular, contrariando parte do que Walter Sotomayor havia publicado em Uma solução rápida e satisfatória (piauí_197, fevereiro de 2023) e o testemunho de Flavia Castro (A embaixada, piauí_204, setembro de 2023), apenas para ficar com duas referências de Kissinger e CIA (sic) nas páginas recentes da piauí. Não sou historiador para uma análise comparada dos estudos e reportagens realizados, ficando a dica para um eventual aprofundamento da questão. Afinal de contas, o avanço da extrema-direita continua sendo notícia quente e ardente, mesmo com a morte do centenário e polêmico personagem citado.

            Por fim, falemos de um revolucionário. José Dirceu volta a fazer uma análise precisa e necessária sobre a esquerda no Brasil e no mundo com o artigo “Desafios da próxima década”, também veiculado na Folha de S. Paulo em 22/1. Não é à toa que teve papel fundamental na primeira vitória de Lula à presidência e continua a ser um dos líderes revolucionários do país. Quando manteve um site (zedirceu.com.br), muitos puderam lá expor suas reflexões e análises. O espaço já não é mais disponível para consulta. De toda forma, sigamos, comandante!

 

 

Adilson Roberto Gonçalves, pesquisador da Unesp, membro da Academia Campineira de Letras e Artes, da Academia de Letras de Lorena, do Instituto de Estudos Valeparaibanos e do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas

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