Dimensões e posições políticas necessárias

Adilson Roberto Gonçalves

Quanto mais debate, mais consolidada é a democracia. Porém, candidatos raramente respondem ao que são perguntados e limitam-se a fazer pronunciamentos e propaganda de suas propostas, quando as têm. O grande diferencial naquele debate que antecedeu o primeiro turno das eleições presidenciais foi a explícita dobradinha do incumbente inominável com o autointitulado padre. Não que causasse surpresa, mas o descaramento da tabelinha foi suficiente para atenuar os impactos da ausência do ex-presidente petista. Como sempre, as mulheres fizeram boa figura, o que será importante para suas vidas políticas futuras, como estamos vendo no protagonismo que Simone Tebet assumiu neste segundo turno.

Outro coadjuvante a voltar a apoiar o despresidente, quase inesperado, foi o ex-juiz Sergio Moro, cuja parcialidade era evidente desde o início do julgamento dos primeiros processos contra Lula. Quando se colocava o julgador (e não o promotor) em combate com o acusado revelava-se a distorção criminosa do processo jurídico, como vimos no desdobramento dos processos e inocência de Lula. Os interesses escusos e personalistas eram óbvios, levando os apoiadores a rotularem-no de “inimigo da Lava Jato”, e discussões de agora apenas atualizam a postura já sabida do agora senador eleito. A análise das aparentes idas e vindas da relação do ex-juiz com o atual governo dá a dimensão da necessidade de ser menos superficial quando é a própria democracia que está em jogo nas eleições.

Articulistas ainda perguntam se as instituições funcionaram em relação aos ininterruptos ataques à democracia que vivenciamos. É claro que não, haja vista a existência de um governo protofascista sem escrúpulos e sem controle. Mas não foi em poucos meses a reversão dos poucos avanços institucionais, mas, sim, uma desconstrução que antecede o pleito de 2018, vencido apenas e tão somente devido à rede de mentiras. Ali os freios e contrapesos já falharam por não julgar a “Máquina do Ódio”, denunciada por Patrícia Campos Mello, dentre outros. Hoje continuam muitas as distorções eleitoreiras. O Auxílio Brasil dado a famílias de apenas uma pessoa é apenas uma delas havidas neste governo, que apenas pensou em sua reeleição desde antes de assumir o mandato. Fosse em um governo progressista, tal escândalo já teria motivado passeatas, greves e impeachments. Ao menos passamos a saber que a direita ativista deste país possui uma moral vergonhosa.

Assim, o despresidente candidato à reeleição se arvora em conquistar e defender o título de “o dono da mentira”. No mais recente debate e no desespero da última semana de campanha isso ficou explícito e parece que é estratégia que convence sua bolha de cegos fiéis. Foi-se o tempo em que o objetivo de um político era o estabelecimento da verdade acima das versões. O ainda ocupante do Palácio do Planalto até mentiu sobre o fato comprovado de não haver discursos quando era parlamentar contra os governos petistas nas duas décadas de mandato. Uma nota de três reais é mais verdadeira, portanto.

No momento, vemos que o Tribunal Superior Eleitoral agiu corretamente ao dar-se o poder de vetar conteúdo falso nas propagandas eleitorais, mas a dúvida é por que não fez isso antes, há quatro anos? Repito que a  eleição do atual despresidente em 2018 somente foi possível pela rede de mentiras construída que, desde então, tem sido constante e sistematicamente aprimorada, pois o governo foi aparelhado para esse fim. Parlamento comprado e Judiciário moroso nos trouxeram à beira do caos institucional de agora. Veremos se tais medidas darão algum resultado. Antes a tarde do que o nunca, como diz o poeta.

Por fim, há que se registra que a Folha de S. Paulo até tentou fazer um importante editorial na capa de 23/10, denunciando a “ameaça autocrática” do atual despresidente, mas ficou longe de contribuir para contê-la. Fiz minha parte clamando: Vamos lá, Folha! Ouça o povo e a maioria de seus articulistas, incluindo o ombudsman. Dia 30 é Lula, para resgatar a democracia e sem medo de ser feliz!

 

 

Adilson Roberto Gonçalves, pesquisador da Unesp, membro da Academia de Letras de Lorena, da Academia Campineira de Letras e Artes, do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas e do Instituto de Estudos Valeparaibanos.

 

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