O filme mais esperado pelos suíços exibido, no gigantesco telão da Piazza Grande, é um retrato do líder populista e nacionalista da extrema-direita suíça, uma versão light do que eram Haider, na Áustria e Jean-Marie Le Pen, na França. Com uma diferença - excelente comunicador, é graças a ele, Christoph Blocher, que o Partido do Povo
Suíço se tornou o primeiro partido do país e chegou a ter 27% dos votos. Trata-se do filme A Experiência Blocher, do cineasta suíço Jean-Stéphane Bron.
Considerado o político mais odiado e mais amado pelos suíços, a ascenção de Blocher, filho de pastor de classe média que se tornou um dos mais ricos da Suíça, começou quando liderou uma campanha contra a entrada da Suíça no Espaço Econômico Europeu, num referendo, em 1992.
Diabolizando a União Européia, Blocher conseguiu derrotar todos os outros partidos e o próprio governo, então favoráveis à EEE, essa adesão não significava uma entrada na União Européia, embora pudesse ser considerada como um etapa para isso.
Hoje, diante da crise na União Européia, alguns são tentados a considerar Blocher como um visionário, naquela época, porém se esquecem do isolamento econômico da Suíça e da falência da Swissair, primeira consequência imediata desse isolamento.
Costuma-se dizer que a Suíça perdeu o momento oportuno de aderir à União Européia, ainda em formação, pois poderia ter exercido sua influência junto com a Alemanha, França e Inglaterra na sua organização e assim assegurar uma posição de influência.
O Não à Europa, em 1992, condenou a Suíça a uma política de acordos bilaterais, na qual tem de aceitar o decidido pela UE sem poder participar das decisões. Mas isso não impediu a Blocher de se afirmar como o líder mais conhecido na Suíça, propagando um discurso populista que acentuava os temores nacionalistas nas relações com os europeus e um discurso racista contra os estrangeiros emigrantes e refugiados.
Porém, ao mesmo tempo, Blocher se enriquecia, o jovem que fizera uma formação para ser agricultor não possuía nenhum pedaço de terra, mas aproximando-se de famílias ricas acabou conquistando amizades importantes. ao terminar o curso de advocacia, ia se tornando industrial e a compra simbólica de uma empresa acabou por torná-lo milionário, graças ao seu espírito empreendedor.
De um lado, era o líder populista da classe média suíça conservadora e racista e, ao mesmo tempo, era amigo dos financistas e banqueiros, a alta classe suíça dirigente do país.
No começo da carreira, coisa hoje um tanto esquecida, fazia parte da associação Suíça-África do Sul, não respeitadora do embargo contra o apartheid. Para ganhar as eleições, fazia campanhas racistas com out-doors como a dos carneiros negros expulsos pelos carneiros brancos, dos estrangeiros todos bandidos ameaçando a
Suíça, contra a construção de minaretes muçulmanos pintados nos cartazes com ogivas no lugar de torres.
Ao final do perfil de Blocher, o cineasta afirma uma verdade - embora antes rejeitadas, suas idéias isolacionistas e anti-estrangeiros se banalizaram. Assim, fora do filme, se pode ver essa comprovação - a atual ministra socialista da Polícia e Interior, cargo antes ocupado por Blocher, aplica uma política ainda mais rigorosa contra os estrangeiros, sem provocar protestos ou rejeições.
Na busca dos votos dos eleitores do Partido do Povo, todos os partidos, inclusive os socialistas, baixaram suas exigências e aderiram à política da Suíça para os suíços. Essa a grande vitória de Blocher, hoje em franco declínio dentro do seu próprio partido.
Não me autocensurei
Embora o conceito de jornalismo objetivo seja sempre sujeito a dúvidas, o cineasta Jean-Stéphane Bron garante ter sido sua intenção fazer um filme isento de parcialidade - nem a favor e nem contra Blocher, talvez por ser a neutralidade uma especialidade suíça.
Explicando se tratar de uma regra, o cineasta afirmou ter mostrado o filme já montado para o ex-conselheiro federal suíço, sem que este pedisse qualquer corte. Mesmo não querendo ser um filme político, fica evidente a ascenção, o sucesso e o declínio de Blocher.
Com seu populismo nacionalista, chegou ao mais alto cargo suíço - era um sete conselheiros federais, equivalentes a ministros, que governam a Suíça. Porém, a maneira agressiva como seu partido agia, pressionando o governo, e a maneira pessoal e prepotente de Blocher, julgando-se intocável, provocou uma união dos outros partidos, suficiente para o Parlamento não renovar seu cargo.
Depois dessa derrota fragorosa e inesperada, o Partido do Povo perdeu alguns referendos xenófobos e, nas últimas eleições legislativas, perdeu algumas cadeiras. Em lugar de chegar aos 30% dos votos, como esperava Blocher, seu partido baixou para 25% e, pior de tudo, certos líderes de seu partido por ele criados pediram uma renovação na direção, naquela clássica maneira de se dar um cargo de honra e tirar os poderes de decisão.
É o canto do cisne para Christoph Blocher que, como revelou o cineasta, viveu quando criança a situação de ser marginalizado por ser estrangeiro, pois seu pais era um pastor reformado alemão. E, na Suíça, os alemães eram, logo depois da guerra e ainda hoje, mal vistos. Seria essa a deformação pela qual Blocher, transformado pela riqueza num verdadeiro suíço, tem como principal objetivo político impedir a entrada e expulsar os estrangeiros da Suíça?
Rui Martins
Subscrever Pravda Telegram channel, Facebook, Twitter