Por: Isabel Vasconcellos
Marina saiu da palestra meio atônita. Nunca, em seus 13 anos de vida, ouvira falar daquelas mulheres. A moça palestrante - Silvia, era o nome dela, Marina jamais se esqueceria, enquanto vivesse que fora ao seu colégio dar a palestra, era integrante, como ela mesma explicara, de um grupo de mulheres, uma ONG.
Comparecer à palestra não era obrigatório, mas aumentaria 0,5 ponto na nota da prova de história. Por isso, a maioria dos estudantes das séries mais adiantadas fôra.
Na verdade, na escola, estavam todos rindo dessa tal palestra:
História Recente do Sexo Feminino. A princípio, pensaram que fosse uma aula de educação sexual, matéria que a garotada se orgulhava de já dominar de sobra, algumas meninas e meninos mesmo já tinham tido a experiência prática. Mas quando ficaram
sabendo que se tratava de Feminismo, aí então começaram as gozações.
- Deve vir uma velha horrorosa disse Marcela igual àquela que
morreu outro dia e eu vi no jornal da TV a cabo.
- Não gritou Marina vai ser uma mulher de jeans, camisa de homem e um sapato muito grande!
O que Marina e seus colegas não poderiam imaginar é que chegaria aquela moça magrinha, de óculos, com a roupa da moda e que, em uma hora e meia de palestra, conquistaria a todos.
Silvia começou contando como viviam as mulheres, no século XVIII, quando Mary Woolstonecraft, considerada a primeira feminista, lançou seus escritos: tuteladas pelos homens, sem direito à cidadania, à propriedade, ao voto. Proibidas de falar em público. Raramente alfabetizadas.
Depois, contou a história da luta pelo voto, história das sufragistas. Falou de Emmeline Pankhurst, uma mulher da classe alta na Inglaterra, que sofrera horrores na prisão, apenas por querer que as mulheres também tivessem o direito de votar. Como Emmeline, na Inglaterra, também Alice Paul, nos Estados Unidos, fora presa várias vezes e sofrera horríveis violências na prisão, como ter uma sonda enfiada a força goela abaixo para que se alimentasse, já que ela estava em greve de fome. Ou apanhar tanto que, por seqüela, ter que passar o resto da vida numa cadeira de rodas.
Falou no desprezo e na segregação social que sofreram feministas históricas como Susan B. Anthony,Lucretia Mott e Elizabeth Stanton, que eram ridicularizadas, até mesmo pelas próprias mulheres, porque queriam igualdade de direitos para os sexos.
Falou das brasileiras, de Bertha Lutz à Pagu, perseguidas, presas, desprezadas. Falou da luta de Margaret Sanger, na Nova Iorque dos anos 1910, para que as mulheres parassem de morrer por abortos clandestinos, praticados porque elas não tinham condições de criar mais um filho; uma luta pela implementação de métodos contraceptivos que custou à Margaret, além da execração pela sociedade americana, um ano de exílio, no estrangeiro, longe do marido e dos filhos.
Falou das mulheres de hoje, que apesar de tantos direitos
conquistados, ainda são desprezadas, caso se recusem a serem mães; ainda ganham salários inferiores aos dos homens que ocupam a mesma função; ainda são consideradas pouco inteligentes, sem raciocínio lógico e ainda apanham (25% das brasileiras) de seus companheiros. Marina saiu zonza da palestra. Como ninguém contara tudo isso a ela antes? Como as revistas, as TVs, as rádios, nunca se referiam a essas mulheres lutadoras e sofridas?
Como, se, sem elas, ela, Marina, certamente não poderia estudar, não poderia votar, não teria direito à tomar pílulas anticoncepcionais e certamente nem a dirigir seu próprio carro? Nem direito ao trabalho?
Ao seu próprio dinheiro?
Quando, no fim da tarde, a mãe de Marina, saindo de seu próprio
trabalho, foi buscá-la na escola, Marina entrou no carro e disse:
- Mãe, aconteceu uma coisa hoje.
- O que, minha filha?
- Eu virei feminista
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