Esta semana decorreram dois eventos internacionais em paralelo na Rússia: a 10ª Conferência Sobre Segurança Internacional (15-16 de Agosto) em Moscovo e, na base aérea de Kubinka, nos arredores da capital, o 8º Fórum Internacional de Tecnologia Militar, ambos os eventos foram organizados pelo Ministério da Defesa russo. Com excepção de duas ou três citações do discurso de abertura de Vladimir Putin, a imprensa portuguesa ignorou-os piamente.
Estiveram presentes delegados oficiais dos 54 governos do continente africano, TODOS os países africanos estiveram lá. Também esteve presente grande parte da América Latina e da Ásia bem como o Médio Oriente, com destaque para as presenças de delegações paquistanesas, israelitas e iranianas, a excepção foram basicamente os países mais pálidos do globo: Nova Zelândia, Canadá, Austrália, as várias nações da União Europeia, os EUA e respectivos aliados/dependentes... leram isso em algum jornal? Claro que não!
Quando lemos em toda a comunicação social de massas que a "comunidade internacional" está contra a Rússia, devemos ler que "o Ocidente liberal" está contra a Rússia... De acordo com os dados do Kremlin estiveram presentes um total de setecentos delegados.
Uma das oradoras da Conferência Sobre Segurança Internacional foi Thandi Modise, ministra da Defesa da África do Sul, que recordou que “a Rússia nunca colonizou África”, o que lhe ganhava um certo “respeito” junto das nações africanas ao qual se une “o respeito por nunca ter escravizado os africanos quando lhes concedeu empréstimos e prestou serviços”. A ministra sul-africana destacou que “em termos de desenvolvimento, a Rússia tem o potencial de investir, de se tornar num parceiro comercial, de fazer crescer as nossas economias, levando-nos a menos pobreza e a menos dependência”.
Modise afirmou que esta cooperação económica devia decorrer no seio dos BRICS (o bloco constituído pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e que o seu país serviria de ponte de ligação para as restantes nações africanas, sendo que todos os 54 países do continente africano marcaram presença com delegados próprios.
No que diz respeito à pressão ocidental para cortar laços com a Rússia, a governante sul-africana recordou que a África do Sul não gosta que lhe digam com quem pode ou não falar. “Há laços fortes entre os nossos países que datam já do tempo da União Soviética e temos vários acordos bilaterais”, reconhecendo que “a Rússia tem o direito de se defender”.
O Fórum serviu também para a BrahMos Aerospace, empresa que conta com capital russo e indiano bem como com fábricas em ambos os países, apresentar o seu novo míssil balístico para os jactos Sukhoi Su-30MKI. Note-se que os jactos Sukhoi são uma das principais exportações militares da Rússia, fazendo já parte dos respólios militares de Angola, da Índia, da Algélia, da Arménia, da Bielorrússia, da China, da Indonésia, do Cazaquistão, da Malásia, do Uganda, da Venezuela e do Vietname, sendo que a Argentina, as Filipinas e o Irão manifestaram interesse em adquirir também estes aviões no decorrer do fórum deste ano.
Não querendo ficar atrás do eterno rival indiano, o Paquistão marcou presença na pessoa do Secretário de Estado da Defesa, Mian Hilal Hussain, que assumiu que o seu país tencionava firmar vários acordos bilaterais com a Rússia. O Paquistão já firmou um tratado de cooperação mútua em 2014, sendo frequentes os exercícios militares conjuntos. Se a presença da Índia e do Paquistão vos parece estranha, o que dizer da presença de Israel e do Irão? Na incerteza do ocaso ocidental e no que aparenta ser a ascensão de uma Nova Ordem Mundial Multilateral, ninguém quer ficar para trás num momento que se afigura como histórico.
A União Europeia e os EUA estão a tentar retractar a guerra na Ucrânia como uma potencial guerra contra a Rússia e, por arrasto, contra a China alegando que a "comunidade internacional" está do nosso lado... contudo a esmagadora maioria dos países do mundo têm acordos de defesa e parcerias estratégicas, comerciais e militares com Moscovo e Pequim, de Brasília (é irrelevante se ganha Bolsonaro ou Lula, o Brasil vai continuar como aliado preferencial da Rússia porque a geopolítica não se deixa levar por emoções ideológicas efémeras) até Jacarta passando pela Cidade do Cabo, Luanda e Islamabad, não é a Rússia que está isolada: somos nós na União Europeia.
Recorde-se que na Segunda Guerra Mundial os europeus eram a hegemonia mundial por força da colonização em África e na Ásia, mas esses países são independentes agora e têm muitas contas para acertar com a Europa às quais se juntam os acertos de contas da América do Sul com os Estados Unidos da América.
Uma guerra com a Rússia como tanto pregam os hipócritas e emotivos comentadores e jornaleiros portugueses na realidade será uma guerra contra o mundo todo e o suicídio de facto da Europa se se concretizar, não se deixem enganar pela propaganda de guerra da União Europeia, que não consegue livrar-se do jugo militarista dos EUA e que atirou a Ucrânia para o actual massacre, ignorando piamente uma guerra que já decorria de facto desde 2014!
Flávio Gonçalves
Exclusivo Pravda.ru
Flávio Gonçalves é cronista, crítico e difusor literário na edição em língua portuguesa do jornal digital Pravda.ru, director das revistas "Libertária" e “Prontidão e Sobrevivência”, editor, tradutor, ex-autarca, membro do Conselho Consultivo do Movimento Internacional Lusófono, sócio fundador do Instituto de Altos Estudos em Geopolítica e Ciências Auxiliares, activista do Conselho Português para a Paz e Cooperação e das campanhas internacionais Tirem As Mãos da Venezuela e Hands Off Syria Coalition, é colaborador do Centre for Research on Globalization (Canadá) e do Center for a Stateless Society (EUA), ex-jornalista na revista "Your VIP Partner" e no semanário "O Diabo", pode segui-lo em Twitter.com/Flagoncalv.
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