A carta do embaixador da Venezuela ao Estadão

Estado de S.Paulo

Sr. Ruy Mesquita diretor de Opinião

Sr. Antonio Carlos Pereira editor responsável de Opinião

Sr. Ricardo Gandour editor de Conteúdo

Senhores,

É com grande preocupação e mal-estar que a República Bolivariana da Venezuela, por meio de seu Embaixador no Brasil, dirige-se a esse jornal, de reconhecidas qualidade e tradição entre os veículos da imprensa brasileira. E a razão não é outra senão nossa surpresa e indignação com os termos e o tom de que sua edição de hoje (20/07/10) lança mão para atacar o presidente de um país com o qual o Brasil e os brasileiros mantêm relações do mais alto nível e qualidade.

O respeito à plena liberdade de imprensa e de expressão é cláusula pétrea de nossa Constituição e valor orientador do governo de nosso país. A estas diretrizes, no entanto, cremos que devam sempre estar associadas a lhaneza na referência a autoridades constituídas democraticamente eleitas e a plena divulgação de todos os fatos associados a uma cobertura jornalística.

Cremos descabido que um jornal como O Estado de S.Paulo se refira ao presidente Hugo Chávez, eleito e reeleito pelo voto livre da maioria dos venezuelanos, com o uso de termos e expressões como lúgubre circo de Chávez, autocrata, protoditador, circo chavista, caudilho, lúgubre picadeiro, costumeira ferocidade, rugiu, toque verdadeiramente circense da ofensiva chavista no gênero grand guignol.

Mais graves ainda são a distorção e ocultação de informações que maculam os textos hoje publicados.

O presidente Hugo Chávez nunca atropelou a Constituição Bolivariana, instituída por Assembleia Nacional e referendada em plebiscito. Ao contrário, submeteu-se, inclusive, a referendo revogatório de seu próprio mandato, prática democrática avançada que pouquíssimos países do mundo têm o orgulho de praticar.

O editorial omite que o cardeal Jorge Savino já foi convocado pela Assembleia Nacional para apresentar provas de sua campanha difamatória frente aos deputados também democraticamente eleitos , mas o mesmo rechaçou a convocação. Prefere manter suas acusações deletérias a apresentar aos venezuelanos e à opinião pública internacional os fatos que lastreariam suas seguidas diatribes.

Outros trechos do texto só podem ser lidos como clara campanha de acobertamento de um terrorista, como o é, comprovadamente, Alejandro Peña Esclusa: O advogado de Esclusa assegura que o material foi plantado pelos policiais que invadiram a casa de seu cliente - considerando o retrospecto, uma acusação mais do que plausível (grifo nosso)

Esclusa foi preso em sua residência em posse de explosivos, detonadores e munição, após ter sido denunciado, em depoimento à polícia, pelo terrorista confesso Francisco Chávez Abarca - este criminoso, classificado com o alerta vermelho da Interpol, foi preso em solo venezuelano quando dirigia operação de terror, visando desestabilizar o processo eleitoral de setembro deste ano.

A prisão de Esclusa ocorreu de forma pacífica, com colaboração de sua família, e segue os ritos jurídicos normais: ele tem advogado constituído, direito a ampla defesa e será julgado culpado ou inocente de acordo com o entendimento da Justiça, poder independente de influência governamental ou partidária, assim como no Brasil.

Inadmissível seria o governo da Venezuela ter permitido que um terrorista ceifasse vidas e pusesse em risco a democracia, que nos esforçamos arduamente para defender, ampliar e aprimorar em nosso país, assim como o fazem, no Brasil, os brasileiros.

O Estado de S.Paulo tem pleno conhecimento desses fatos, tendo inclusive recebido, em 14/07/10 a Nota de Esclarecimento desta Embaixada, a respeito do desbaratamento da operação terrorista internacional que estava em curso (cópia anexa). O responsável pela editoria Internacional, Roberto Lameirinhas, inclusive confirmou seu recebimento à nossa assessoria de comunicação.

Daí manifestarmos nossa estranheza com a reiterada negativa do jornal em dar tais informações a seus leitores. E ainda tomando como verdade declarações do advogado do referido terrorista.

Temos certeza que os senhores não desconhecem, até pela história recente do Brasil, o quão frágil pode ser a liberdade diante do autoritarismo tirano da intolerância e do uso do terror como método de ação política.

Reafirmamos que não nos cabe emitir qualquer juízo de valor sobre as opiniões político-ideológicas do jornal dirigido por V. Sas., por mais que delas discordemos. O que nos leva a enviar-lhes esta correspondência é, tão somente, a solicitação de que se mantenha a veracidade jornalística e o respeito que se deve sempre às pessoas, sejam ou não autoridades constituídas, mesmo quando o jornal as considere, de moto próprio, como seus inimigos ou desafetos.

Esta Embaixada permanece à disposição do jornal e de seus leitores, para esclarecimentos adicionais sobre quaisquer dos assuntos supracitados, bem como de novos temas julgados pertinentes e reivindica, formalmente, a publicação da presente carta, com o mesmo destaque dado ao editorial de hoje, intitulado O lúgubre circo de Chávez, publicado à página A3.

Atenciosamente,

Maximilien Arvelaiz

Embaixador da República Bolivariana da Venezuela no Brasil

Brasília, DF

http://www.viomundo.com. br/voce-escreve/a-carta-do-embaixador-da-venezuela-ao-estadao.html

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