A questão do aborto nunca deveria ter vindo à praça pública, desculpem-me aqueles que vêem no veredicto popular a fonte da Verdade E não deveria, pelo simples facto de haver mais dúvidas do que certezas, até entre os meios académicos.
E, salvo melhor opinião, não nos parece que um referendo alguma vez possa resolver um tão candente problema, que é sobretudo de consciência, e menos ainda os problemas sociais que lhe estão na origem. Tal explica o absurdo e a falta de respeito pela Vida de alguns argumentos que têm vindo a lume.
Um dos aspectos do debate sobre o aborto, talvez o mais recorrente, tem sido o momento zero a partir do qual o embrião é um Ser Humano. Ninguém em rigor o sabe Esta preocupação em determinar esse momento crucial revela, apesar de tudo, a importância que a Vida Humana representa na nossa cultura, mesmo para os defensores do SIM, e a consciência de que nestes termos um aborto constitui um atentado contra a integridade física do embrião. Caso fosse possível determiná-lo com rigor, talvez o problema não fosse tão controverso
Mas como não é, torna a Vida intra-uterina uma questão que sobreleva a todas as outras, como a pseudo dignidade da mulher face ao Artigo 140 do Código Penal. Na dúvida, porque nos transcende, somos pela defesa da Vida a todos os níveis.
A relativização da Vida que observamos, um modismo da época que vivemos, em que tudo é submetido aos ditames do pragmatismo utilitarista, leva a argumentos sibilinos do tipo do que lemos recentemente no semanário Tal & Qual a propósito do embrião uma infusão divina, a alma, desce sobre nós no segundo em que o espermatozóide feliz mergulha no óvulo. Mais adiante o escriba de serviço acrescenta: A alternativa menos metafísica, é reconhecer que às dez semanas de vida de um embrião não dispõe ainda de sistema nervoso central, quedando-se a boa distância do humano.
Tais opiniões, além de evidenciarem ignorância sobre o processo biológico da formação do Ser Humano, que não é descontínuo como certo cientismo pretende fazer crer, revelam leviandade em relação à Vida intra-uterina, que a actual lei pretende proteger.
Um Nascituro tem o seu início de Vida intra-uterina num zigoto, célula que resulta da fecundação do óvulo por um espermatozóide. Contudo a futura mãe não terá consciência do facto senão ao cabo de alguns dias, quando o fluxo menstrual é interrompido, o que pode corresponder a cerca de duas semanas após a concepção. Precisamente nessa data começa a funcionar o cérebro, o que significa que a formação do sistema nervoso central teve início num momento imediatamente anterior, logo muito cedo, sendo esse um passo fundamental para pôr em funcionamento todas as funções vitais do novo organismo. O coração, em obediência àquele, entra em funcionamento uma semana depois e só vai parar com a Morte. Este facto nega o argumento daqueles que afirmam que às dez semanas ainda não há um cérebro e um coração no embrião, podendo por isso ser descartado.
Há também quem evoque a falta de inteligência no embrião para lhe negar o estatuto de Ser Humano. O cérebro é comparável a um computador, com uma"motherboard" que permite operar o "software" instalado. No nosso caso, o "software" é instalado no momento da concepção com os genes da mulher e do homem, que por sua vez transportam o ADN, a essência da vida que tornará o futuro Ser Humano num exemplar único, entre milhões dos seus semelhantes, e distinto dos restantes seres vivos. Será isto a evidência material da nossa alma?
Significa que mesmo antes da fertilização, as células da mulher e do homem já são portadoras de inteligência, de uma inteligência primordial, que é produto de uma evolução de muitos milhões anos. Aliás esta inteligência, uma inteligência primária e essencial, está presente em toda a Natureza, bastará olhá-la com atenção. O instinto de sobrevivência que observamos nos animais, e até nas plantas, é uma evidência desse facto.
Se o argumento da falta de inteligência no embrião fosse levada a sério, então teríamos que abortar muita gente burra que anda por aí mais, dado que o Ser Humano é a espécie que nasce mais incompleta, tendo inclusive necessidade de acompanhamento maternal até se tornar biologicamente num elemento adulto, logo num Ser Humano completo, o que acontece lá pela puberdade, então podíamos considerar possível o aborto até a esse momento Ora tenham dó!
Com efeito, a Vida Humana tem valor intrínseco e absoluto desde a sua concepção. Abrir mão deste conceito, é, no nosso entender, expô-la ainda mais à arbitrariedade de homens do tipo Adolfo Hitler, José Estaline e Pol Pot, por exemplo.
Artur Rosa Teixeira
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