Alejandro Nadal
Diz-se que a manipulação cambial é a prática de fixar artificialmente um tipo de câmbio para obter uma vantagem desleal no comércio internacional. Trata-se de uma táctica que distorce os fluxos de comércio e está proibida por acordos internacionais e pela legislação de alguns países.
Essa é uma forma de subsidiar as exportações, promover o emprego e o crescimento numa economia. Claro, é também uma forma de passar para os vizinhos o problema do desemprego.
Durante anos, os Estados Unidos acusaram o Japão de manter o iene artificialmente subvalorizado relativamente ao dólar. Mas hoje a acusação dirige-se principalmente à China. Segundo a American Manufacturing Association, o yuan chinês mantém uma subvalorização artificial de 40 por cento, o que permite ao gigante asiático manter o seu extraordinário nível de exportações. Se isso for verdade, a legislação federal obriga o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos a activar sanções contra a China.
O Departamento do Tesouro em Washington ameaçou há pouco carregar Pequim com a acusação de realizar manipulação cambial. A sobretaxa alfandegária que acompanharia esta decisão seria de até 25 por cento para compensar o que se considera ser um subsídio desleal. Esta arrogância é a resposta de Obama aos congressistas e grupos de pressão que têm estado a exigir represálias contra China. Mas a Casa Branca argumentou que devia esperar que terminasse a minicimeira antinuclear em Washington à qual assiste o presidente chinês Hu Jintao. Por certo, essa conferência está mais preocupada com preparar o terreno para aplicar sanções ao Irão do que com o tema da segurança nuclear, mas esse é outro assunto.
Uma sobretaxa alfandegária teria implicações delicadas, sobretudo no contexto da suposta recuperação da economia mundial. A China é particularmente sensível às acusações sobre manipulação cambial, em boa medida porque 30 por cento do PIB chinês se explica pelas suas exportações.
Existe uma manipulação cambial por parte de China? Desde meados de 2008 Pequim fixou o tipo de câmbio em 6,83 yuans por dólar para promover as suas exportações, dada a contracção do comércio mundial. Durante os 13 meses seguintes, as exportações chinesas diminuíram e o superávit comercial reduziu-se em 34 por cento. No mês passado, A China experimentou o primeiro déficit comercial em seis anos, deixando a acusação sobre manipulação cambial muito mal parada.
Por uma série de razões técnicas, não é fácil determinar quando existe manipulação cambial. Os dados chineses são questionados por muitos analistas. Mas a Reserva Federal calcula que o yuan se apreciou em 16,5 por cento entre Junho de 2008 e Fevereiro de 2009. Por outro lado, a Banca Internacional de Pagamentos (BIS) afirma que entre Fevereiro de 2007 (quando rebentou a crise de hipotecas-lixo nos Estados Unidos) e Janeiro de 2010, o tipo de câmbio real do yuan aumentou 10,7 por cento, enquanto o do dólar se contraiu 8 por cento. Para o BIS, estes números indicam que foi o dólar que sofreu uma desvalorização. De facto, isso é parte do plano de Washington para restabelecer o equilíbrio na deficitária balança comercial.
Algo que não deve ser esquecido é que a subvalorização do yuan foi fundamental para manter a inflação sob controle nos Estados Unidos nos últimos anos. Uma câmbio na paridade dessa moeda poderia ter efeitos importantes sobre a taxa de inflação na economia estadunidense, o que poderia levar a um aumento na taxa de juro e ameaçar a suposta recuperação.
Por outro lado, um bom número de empresas transnacionais estadunidenses realiza operações de maquiladora com a China ou tem operações com verdadeiro grau de integração vertical nesse país (Apple, Bank of America, Boeing, IBM, Intel, etc.). Estas empresas são os principais beneficiários da entrada chinesa na OMC, pouco lhes importa o emprego nos Estados Unidos e não estão interessadas na apreciação do yuan. De facto, o seu lóbi em Washington (o Conselho de negócios Estados Unidos-China) pressiona para manter o status quo.
Um interessante estudo de Robert Scott (disponível em www.epi.org ) argumenta que os Estados Unidos perderam 2,4 milhões de empregos no período 2001-2008 devido a esta concorrência desleal da China. A conclusão central do estudo é que é necessário um ajuste na paridade para remediar as coisas.
A realidade é algo diferente e bastante conhecida. Os custos laborais na China são uma minúscula fracção do nível que têm nos seus competidores no mercado mundial. O dumping comercial chinês baseia-se mais nos salários baixos que noutra coisa. Mas como isso entra na definição de "vantagens comparativas" da teoria convencional sobre comércio internacional, é mais difícil encontrar uma crítica séria a esta dimensão do problema. Afinal de contas, o dumping social e laboral é uma forma pela qual o capitalismo resolve o seu problema de procura agregada na globalização neoliberal.
14 de Abril de 2010
Original: La Jornada
Fonte: Informação Alternativa
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