Mauro Lourenço Dias (*)
Não deixa de ser uma boa notícia a promessa do governador José Serra de que até abril, quando provavelmente ocorrerá o seu afastamento do governo do Estado para que possa concorrer à presidência da República, haverá uma definição quanto ao lançamento da licitação para a construção da ponte estaiada entre os bairros da Ponta da Praia, em Santos, e Santa Rosa, em Guarujá. Mais alvissareira ainda é a notícia de que o governo do Estado desistiu de cobrar pedágio para a passagem por essa ponte que será erguida na entrada do Porto de Santos.
Como se sabe, em maio de 2009, quando foi anunciado o projeto da construção da ponte, em substituição ao projetado túnel submerso, fontes do próprio governo do Estado cogitaram a cobrança do pedágio ao mesmo preço da utilização do sistema de balsas, que à época era de R$ 7,50. A alegação era que os recursos arrecadados com o pedágio serviriam para bancar o custo da obra, que àquela época estava orçada em R$ 500 milhões. Não se sabe como, mas, depois de alguns meses, o empreendimento tornou-se menos custoso, já que hoje a verba disponível para a construção da ponte é de R$ 400 milhões. Seja como for, a solução será bem menos onerosa que a proposta anterior, ou seja, a construção do túnel, que, segundo especialistas, não sairia por menos de R$ 2,5 bilhões.
Além disso, a construção do túnel poderia constituir, no futuro, um obstáculo à livre navegação no canal do estuário porque não dá para imaginar a que profundidade teria de ser construído para evitar possíveis colisões com cargueiros. Como se sabe, cada vez mais, são construídos megacargueiros capazes de transportar cargas acima de 12 mil TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés), que necessitam de um calado de 17 metros. Hoje, o canal de navegação do Porto de Santos tem em média de 12 a 13 metros de profundidade, mas, depois da obra de dragagem de aprofundamento, a partir de 2012, provavelmente, estará nesse patamar. Hoje, muitas empresas de transporte internacional cada vez mais preferem usar megacargueiros que podem carregar até 300 mil toneladas.
Dizem os técnicos que a profundidade do canal não pode ir além desse limite, mas ninguém pode prever as conquistas da tecnologia. Num futuro não muito distante, é possível que esse limite seja superado. Afinal, o maior navio petroleiro do mundo, o Jahre Viking, tinha um calado de 24,5 metros quando carregado, altura equivalente a um prédio de oito andares. E, se assim o construíram, é porque havia portos capazes de recebê-lo, ainda que em plataformas localizadas quase no alto-mar. Construído em 1976, esse navio, o mais pesado objeto móvel já idealizado pelo homem, acaba de ser desmontado para que funcione apenas como tanque de armazenagem.
Mas, se esse risco o Porto de Santos já não corre, o mesmo não se dá com a altura do vão livre da projetada ponte (70 metros). Parece que a altura da ponte não constituirá obstáculo à passagem de navios, pelo menos, a curto e médio prazo. Afinal, o governo de Hong Kong acaba de construir uma ponte estaiada com 73,5 metros de altura acima do nível do mar, o que permitirá a entrada de grandes navios de carga no terminal portuário de Kwai Chung.
Seja como for, aos olhos de hoje, parece que o vão livre estabelecido pelos técnicos do governo do Estado aproxima-se do ideal, mas daqui a 50 ou 100 anos não se sabe se continuará a sê-lo. Basta olhar para a quase centenária Ponte Pênsil, em São Vicente, para se concluir que os técnicos que a idealizaram não levaram (nem poderiam levar) em conta os obstáculos que traria à livre navegação naquele trecho que é o menor entre a ilha e o continente.
Diante disso, só resta a definição do traçado para a rampa de acesso no lado de Guarujá, já que em Santos existe consenso entre a Prefeitura e o governo do Estado a respeito do assunto. A Prefeitura de Guarujá quer que o traçado, ao contrário do idealizado pelos técnicos estaduais, passe pela lateral da Dow Química, conectando-se à rodovia Cônego Domênico Rangoni, sem atrapalhar o comércio da Avenida Ademar de Barros, no bairro de Santa Rosa. É uma proposta de bom senso.
O importante é que a Prefeitura de Guarujá e o Estado cheguem logo a um acordo porque a construção dessa ponte irá representar um desafogo para uma série de operações desenvolvidas no Porto de Santos, ainda que não seja o fim dos gargalos logísticos na área portuária. Porque há outros. E não são poucos.
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(*) Mauro Lourenço Dias é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br
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