Enquanto o mundo se prepara para a sexta-feira, ponta-pé de saída para a fase final da Copa do Mundo na África do Sul, a primeira vez neste continente, e já que a pandemia global de Soccermania promete mais uma vez varrer a comunidade internacional, a Organização das Nações Unidas tem como objectivo canalizar o entusiasmo público pelo esporte, criando consciência sobre outras questões sociais mais prementes.
Biliões de pessoas ao redor do mundo têm seus frigoríficos cheios de cerveja gelada e petiscos, dezenas de milhões de pessoas têm sua bandeira nacional pendurada nas janelas e centenas de milhares de pessoas saíram para comprar a vuvuzela, o chifre que os agricultores africanos usavam para comunicar uns com os outros, e da qual versões de plástico prometem fazer um barulho ensurdecedor durante os jogos. É, chama-se Soccermania e este vírus varre o mundo uma vez a cada quatro anos.
Soccermania é contagiosa. Ela varre todas as classes sociais enquanto varre questões políticas, sociais e económicas para debaixo do tapete, anunciando o início da silly season, quando muitos políticos correm para seus iates enquanto outros passam tão publicamente as suas férias em casa. Mas quem se importa? Rooney marcou um par de gols. Alguns dizem que com o cotovelo, outros com o seu traseiro. O árbitro disse que com a mão, então ele invalidou ambos. Filho de mãe, hein?
E é isso sobre que o mundo estará falando durante o próximo mês desde 11 de junho a 11 de julho. Um estudo recente revelou que a imprensa em Espanha, França e Reino Unido dedica apenas 3,5% do seu espaço a temas de desenvolvimento internacional, tais como HIV/Aids, pobreza, fome, educação, direitos das mulheres etc.
Além desta falta de informações, imagens coloridas de futebol espalhadas pelas páginas da imprensa internacional, juntamente com contos de hooligans que não souberam tomar sua cerveja e esmagaram uma dúzia de cadeiras de plástico e filmagens ao vivo de espetaculares lutas de gatinhas entre as Esposas e N amoradas dos jogadores, garante que ninguém vai falar sobre as quase oito milhões de pessoas no Níger, no outro lado de África, que correm o risco de morrer de fome devido à seca à falha da colheita.
Não só os armazéns familiares de alimentos se esgotaarm, não há alimento para os animais e as crianças emaciadas já começaram a aparecer em centros de ajuda, oriundas das zonas rurais. Aqueles que não conseguiram chegar, já morreram. Não há Copa para eles.
É essa onda mexicana de indiferença insensível, que acompanha a pandemia global de Soccermania, que a ONU espera combater na África do Sul através de programas de consciencialização pública. Estas serão destinadas a aumentar os esforços para alcançar os Objectivos do Milênio, um tema que a ONU pretende manter vivo toda a Copa com festivais comunitários, programas de televisão, cartazes, jogos eletrônicos, campanhas de multimídia e uma nova canção (8 gols para a África , no Youtube). A canção foi gravada por oito artistas african@s de todo o continente Africano e é baseado no tema das Nações Unidas, aos 8 Objetivos do Milênio, que será discutido na sede da ONU em Nova York em setembro.
No jantar gala Sports for Peace, ontem, em Joanesburgo, o secretário-geral Ban Ki-Moon referiu aos poderes unificadores do esporte, tão evidente na África do Sul hoje, onde mais uma vez as diferentes comunidades do país se reunem como uma nação (a bandeira da África do Sul é o bem mais procurado nas lojas). Portanto, a ONU pretende utilizar a Copa para levar esse espírito mais um passo além e, enquanto as pessoas ao redor do mundo estão comemorando os gols, eles poderão jogar juntos no mesmo campo, na mesma equipa para marcar oito Golos para África.
Como de costume, muito vai depender da mídia internacional, se decidir apresentar informação e formar a opinião pública de forma responsável e equilibrada, ou se vai ceder aos caprichos daqueles que decidem que uma nua na página 3 cria mais cliques ou vende mais cópias do que um reles oito milhões de crianças morrendo de fome no deserto, para quem o rabo ou o cotovelo de Rooney não fazem sentido algum.
Esse é o mundo em que vivemos. Mas não tem de ser assim.
Timothy BANCROFT-HINCHEY
PRAVDA.Ru
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