Interesses da FIFA no Aumento de Seleções na Copa
Dona de história corrupta e autoritária, FIFA atende a interesses políticos e de marketing, não do futebol com inchaço da Copa do Mundo. Volta ao futebol romântico requer enxugamento e reorganização do torneio, uso da tecnologia para coibir "erros" de arbitragem, além de aplicação dos bilhões anuais de lucro nos atletas e clubes, com transparência radical das entidades nacionais e internacionais
por Edu Montesanti
Logo que assumiu a Presidência da Federação Internacional das Associações de Futebol (FIFA, na sigla em inglês) em fevereiro deste ano, o suíço Gianni Infantino não propôs nenhuma alternativa prática rumo à limpeza em uma das entidades mais bilionárias, autoritárias, obscuras e corruptas do planeta - exatamente este fato, o levou ao poder em substituição ao "imperador" Joseph Blatter -, mas sim uma medida que tampouco atende aos interesses do esporte e do espetáculo, a qual, na menos sofrível das hipóteses (tal hipótese, aliás, cabível apenas na mente dos mais ingênuos), atende aos interesses do monoteísmo mercado em busca do lucro desenfreado: aumento do - já alto - número de seleções na disputa da Copa do Mundo, das atuais 32 para 40. Pois no último dia 4, foi além: um aumento para 48 participantes.
"Com 40 equipes a matemática não funciona para poder formar grupos e depois fases eliminatórias como até agora, mas nossa ideia continua sendo a de desenvolver o nosso esporte, e para muitos países é importante estar numa Copa", precisou Infantino, justificando agora na matemática mais um inchaço em um torneio que, a cada quatro anos, fica cada vez mais pobre tecnicamente, inversamente proporcional aos lucros exorbitantes (dos cartolas, não dos países-sede e nem muito menos do esporte em si).
Antes de discutirmos brevemente este ponto de vista (não se requer uso mais que razoável da inteligência para contra-argumentar os lords do bem-dizer que nunca chutaram uma bola na vida), de se chegar à óbvia conclusão de quais interesses estão por trás de mais esta aparente engenharia intelectual de um dos poderes globais mais sujos e apontar alternativas para se tentar resgatar a era romântica do futebol, vale recordar alguns pontos envolvendo a autoritária FIFA (autoritarismo, justamente, em nome do lucro) e a própria Copa do Mundo em si (ou Copa do Mundo "FIFA", como esta exige sob ameaças de processos na justiça).
FIFA e Copa do Mundo: História de Interesses, de Mercado e de Poder
Logo após o término da Primeira Guerra Mundial o francês Jules Rimet, então presidente da FIFA, contrariou a decisão da entidade fundada sem muita força política em 1904, de reconhecer o torneio de futebol disputado nas Olimpíadas a partir de 1908 como campeonato de futebol mundial, como efetivamente era.
Em 1928, ainda com Rimet na Presidência da FIFA, decidiu-se criar a Copa do Mundo organizada pela FIFA a qual, através de uma canetada, anulou todos os legítimos campeões do mundo de seleções anteriores - entre eles, o Uruguai que, bicampeão olímpico em 1024 e 1928, encantava o planeta. Em outras palavras: uma decisão política a fim de centralizar o poder da entidade máxima do futebol internacional.
Pois em 1930, o Uruguai voltaria a vencer e em casa o torneio mundial, naquela ocasião já batizado de Copa do Mundo cuja taça levava o nome, exatamente, do cartola francês. Em 1950, o tetracampeão de fato voltaria a ganhar o mundial, contudo considerado até hoje apenas bicampeão pelo fato de que anteriormente as disputas não eram reconhecidas pela deusa FIFA que já nasceu autoritária, defendendo antes de mais nada seus próprios interesses em detrimento do próprio futebol que diz representar.
Desta maneira, e em nome do mercado mesquinho que se tornou o futebol, "espetáculo" cada vez mais idiotizador das massas, simplesmente se joga-se lata do lixo toda uma história, parte da era romântica do futebol. Atletas imortais da Azul Celeste, tais como o goleiro Ballesteros, e os jogadores e linha Cea, Iriarte e Castro, são colocados impiedosamente no armário do esquecimento mundial com seus respectivos espetáculos como na Olimpíada de 1924, 7-0 a Iugoslávia, 5-1 sobre a França, assim como os 3-0 na final contra a Suíça; os 4-1 na Alemanha, 3-2 na Itália nos Jogos Olímpicos de 1928.
Além disso, grandes assaltos têm assombrado o mundo em uma indústria de resultados de partidas de futebol aplicados pela FIFA, o que se estende a federações nacionais, através de árbitros fantoches acobertados por jornalistas-fantasia que recebem o famoso jabá (porcentagem financeira em futuras negociações de seus jogadores de estimação) sobre comentários que supervalorizam atletas, geralmente patrocinados por marcas famosas e negociados por grandes empresários.
Não por coincidência, muitas vezes tais favorecimentos de arbitragem dão-se às mesmas federações e confederações reconhecidamente fortes politicamente junto à FIFA [a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), uma delas], enquanto os cartolas opõem-se ferrenhamente a um uso mais efetivo da tecnologia para impedir "equívocos" de arbitragem em nome de uma "apaixonante" polêmica dos erros que, no discurso dos cartolas, gera acalorados debates nos botequins mundo afora, essência da paixão pelo futebol. Sobre isto, vale salientar que o futebol, ao contrário, é apaixonante pelas belas jogadas e se torna ainda mais encantador quando a equipe que melhor se preparou técnica, física, tática, disciplinar e psicologicamente, vence as respectivas competições.
Em nome deste esterco moral, essência dos interesses do mercadejo (ou marketing), grandes campeões acabaram saindo pelas portas do fundo da história em nome dos mesquinhos interessas da dona FIFA. Triste assim e, obviamente, com o passar dos anos à medida que cresce a influência da lógica do capital, os interesses políticos e financeiros da cúpula engravatada que rege o esporte têm predominado em detrimento do futebol em si, das mais diversas maneiras.
Inchaço da Copa do Mundo: Aparências Enganam
Nos anos de 1990, quando o futebol brasileiro assistia à sua pior decadência da história, claramente já não mais o melhor do mundo que seguiria descendo ladeira abaixo nos anos subsequentes, alguns poucos comentaristas corajosos que prenunciavam tal fato eram qualificados por outros ufanistas, medíocres jogadores da Pátria de Chuteiras (herança da ditadura militar de péssima memória), de "profetas do Apocalipse".
Vale apenas ressaltar aqui que tal caça às bruxas em "debates" esportivos que leva nada a lugar nenhum, palrados por longas horas por um bando de "jornalistas" aloprados, não se deve apenas ao "Brasil, Ame-O (sic) ou Deixe-O (sic)" como uma das heranças da velha ditadura a qual muitos ainda namoram: atende a interesses de imbecilizar cada vez mais a sociedade, utilizando para isso a "paixão nacional" como grande ferramenta (os sics - e haja sic neste país! - devem-se ao mau uso das colocações pronominais).
Pois voltando para dentro do gramado: o 1-7 contra a Alemanha - em casa - desgraçadamente veio (ou providencialmente?) e muitos brasileiros, vítimas do jornalismo de entretenimento ridiculamente disfarçado de esportivo, ainda não se deram conta de que o Brasil já não possui, nem de longe, o melhor futebol global, nem seu real motivo: exatamente o mercadejo desenfreado que toma conta do esporte tupiniquim. Por isso, e bem longe da canalha pauta do jornalismo esportivo nacional, não há perspectivas de saída do fundo do poço ao que já foi um dos grandes centros do futebol internacional.
Ao contrário do que apregoam as faculdades de Gestão Esportiva, o número de participantes da Copa do Mundo, em tempos que o futebol está nivelado cada vez mais por baixo, deve girar em torno de 14 e sem a possibilidade de ouro para manipulação de resultados proporcionada pelos chamados "play-offs", ou jogos eliminatórios: deve-se priorizar pontos corridos entre a nata do futebol mundial, sem jamais permitir a tal disputa por pênaltis. Isto sim, é premiar o melhor oferecendo, sim, chance a todos através das Eliminatórias no ano anterior.
Na Copa de 1982, fase em que o futebol romântico também já entrava em evidente declínio, o número de seleções em disputa era 24. De lá para cá, o nível técnico tem caído vertiginosamente subindo enquanto se aumenta o número de participantes, atualmente são 32 - e o dos preços dos ingressos, acessíveis apenas às elites dos países-sede, tampouco para de subir a cada Copa.
A consequência natural desse inchaço, precariamente disfarçado de "negócios do esporte" e do "interesse de todos" em nome unicamente do lucro, é comprovada a cada quatro anos na Copa do Mundo, é que o nível do principal torneio de futebol cai cada vez mais. Talvez para cartolas mundo afora, diversos comentaristas tupiniquins e aiatolás do mercado em geral, os alemães não entendam nada de futebol, mas vale deixar registrado que, dias atrás, o técnico da seleção alemã campeã do Mundial de 2014 - comandante técnico, exatamente, dos memoráveis 1-7 - afirmou: "Não acho que seja uma boa ideia [o aumento do número de seleções na Copa[, a qualidade do torneio se ressentiria".
O interesse em tal medida é tão manjado quanto, na prática, fracassado: nada mais que interesse político a fim de bajular cartolas das federações nacionais, atrás de apoio, ou ao menos conivência, blindando-se desta maneira na usurpação do poder da FIFA e da manipulação das políticas nacionais - como ocorreu, por exemplo, com o Brasil, vergonhosamente refém, em todas as esferas, da entidade para a realização da última Copa. Além do já mencionado monoteísmo do mercado que transforma tudo em produto a ser vendido a qualquer custo, e cidadãos em meros consumidores independente do bem-estar, da qualidade e da justiça.
A chance que cada seleção deve ter, ressalte-se, está nas Eliminatórias, e que ali se prove a real capacidade de se participar de um torneio cada vez mais bilionário tanto quanto banalizado, apresentando evidentes caça-niqueis nas primeiras fases. Tudo isso, aparentemente em nome da modernidade administrativa representada pelo suíço cujo nome está incluído nos Papeis do Panamá, que o citam claramente envolvido em favorecimento ilícito a entidades privadas nos anos de 2000, quando era funcionário da União Europeia de Associações de Futebol (UEFA).
Enfim, os interesses do capital e do seu promotor maior, isto é, o maldito marketing, como em tudo na vida jamais atendem aos interesses do esporte nem do atleta. Aparências enganam, quantidade não é sinônimo de qualidade e a única medida que pode promover de verdade o futebol levando-o de volta aos tempos românticos é o combate à corrupção que, de preferência, inclua varredura de cartolas instalando ex-atletas no comando da administração da modalidade além da aplicação dos bilhões do lucro anual adquirido com o futebol em sua razão de ser: o atleta e os clubes, fundamentados na transparência radical que hoje não existe, e recusada a ser colocada em debate - não por mero acaso. Isto sim democratizará o futebol, dará chances iguais a todos e melhorará a qualidade dos espetáculos esportivos. Que não se enganem quem acredita que, com mais este inchaço, a motivação dos cartolas é o bem do esporte - atletas e apaixonados pelo futebol.
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Edu Montesanti é comunicador, professor de idiomas, tradutor, escritor e filiado ao PSoL (Partido Socialismo e Liberdade - SC). Autor do livroMentiras e Crimes da "Guerra ao Terror" (2012), escreve para Jornal Pravda e Pravda Report (Rússia), Global Research (Canadá), Truth Out (Estados Unidos), e para a revista Caros Amigos (Brasil). É tradutor do sítio na Internet das Abuelas de Plaza de Mayo (Argentina), e foi tradutor do sítio da escritora, ativista pelos direitos humanos e ex-parlamentar afegã injustamente expulsa do cargo, Malalaï Joya. Escreveu para Diário Liberdade (Galiza), Observatório da Imprensa (TV Brasil) e Nolan Chart (Estados Unidos). Contato: [email protected] / www.edumontesanti.skyrock.com
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