Adilson Roberto Gonçalves
Em sua participação no Jornal Nacional, Simone Tebet não conseguiu se desvencilhar do peso da fragmentação de seu partido, que apoia majoritariamente os dois candidatos com maiores intenções de voto para presidente. O MDB pratica com a senadora o jogo de faz-de-conta que o PSDB promoveu com Dória. Naquela entrevista também se mostrou ingênua ao propor que “pedirá aos mais ricos” pagarem mais impostos. Ainda que tenha usado bem a oportunidade de se mostrar aos eleitores, consolidou a tese de que a terceira via nunca existiu. No debate com outros candidatos, dias depois, já se saiu melhor porque o contraponto com o misógino e machista-mor foi evidente.
Já Lula falou como estadista na entrevista que deu ao mesmo programa jornalístico. E como foi bom ouvi-lo. Ele teve alguns deslizes ao não separar atos de seu governo dos de Dilma, mas em nada se compara às mentiras deslavadas do despresidente dois dias antes. O ex-presidente - e, quiçá, futuro presidente - trouxe o povo para dentro do Estado em seu governo, enquanto o atual mandatário empurrou-o para abaixo da linha da pobreza. A entrevista foi destinada principalmente à classe média e cumpriu magistralmente seu papel.
A importância dos debates com presidenciáveis é questionável e articulistas pressupõem que vence aquele em quem o eleitor já decidiu votar. Discordo, pois entendo que Simone Tebet venceu aquele primeiro debate, com sua postura assertiva e aproveitando as oportunidades que teve para mostrar suas propostas, mesmo não tendo meu voto. Minha decisão por Lula já está consolidada. No mais, minha total solidariedade à jornalista Vera Magalhães pelos covardes ataques misóginos e machistas que sofreu por parte do despresidente nesse debate. É inconcebível que o ocupante do governo fale o que falou e saia impune. As urnas já o estão julgando, mas espero que as associações representativas dos jornalistas tomem alguma atitude mais enérgica e imediata.
Os resultados das recentes pesquisas Datafolha e Ipec mostram que agora a campanha eleitoral toma o rumo mais equilibrado, com maior conhecimento dos candidatos em função do debate, da entrevista e da campanha no rádio e tv. Isso fica evidenciado com o significativo aumento de intenção de voto em Simone Tebet e Ciro Gomes. Já a vitória de Lula no primeiro turno dependerá do equilíbrio entre a sensação de alívio econômico imediato (fruto das benesses palacianas de compra de voto) e memória da economia melhor de 10 anos atrás. Os de menor renda revelam uma melhor percepção da fragilidade dos ganhos econômicos das últimas semanas enquanto os mais ricos ganham de qualquer jeito.
Por fim, é importante analisar o que alguns articulistas pregam acerca dos entrevistadores nesses programas apresentarem uma “cara pôquer”, ao falar da necessidade do jornalista/entrevistador esconder sua parcialidade em perguntas teoricamente imparciais. É um jogo estratégico em contraponto com a teoria da existência de um jornalismo isento, que habita o mesmo mundo do saci pererê e da mula sem cabeça, aproveitando a proximidade com o passado Dia do Folclore.
Adilson Roberto Gonçalves, pesquisador da Unesp, membro da Academia de Letras de Lorena, da Academia Campineira de Letras e Artes, do Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas e do Instituto de Estudos Valeparaibanos.
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