Breve comparação do 25 de abril - 1974 e 2018
Breve comparação do 25 de abril - 1974 e 2018
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A crise global de 1973 marcava o início do neoliberalismo, aliás bem presente no Chile de Pinochet. A derrota americana no Vietnam e a lufada de ar fresco vinda de Maio/68 gerava um fervilhar de ideias, ainda que em meios estritos
Comemoração sem reflexão não passa de estéril saudosismo
1974
- O regime fascista já ia nos 48 anos e sofria de um cancro terminal
- A crise global de 1973 marcava o início do neoliberalismo, aliás bem presente no Chile de Pinochet. A derrota americana no Vietnam e a lufada de ar fresco vinda de Maio/68 gerava um fervilhar de ideias, ainda que em meios estritos
- A situação nas colónias arrastava-se e ameaçava ficar descontrolada na Guiné e em Moçambique; a tropa começava (finalmente) a ver que teria de se safar antes de um desastre militar
- Pretendia-se continuar a ancorar a viabilidade económica na ligação às colónias, em paralelo com a continuidade da prevalência do têxtil/couro, onde os salários eram (e são) baixos, empurrando o excedente de mão-de-obra para a emigração, de onde viria a bênção das suas remessas
- A ideia da acrescentar ao modelo económico, grandes estaleiros navais, refinação de petróleo e petroquímica, ficou inviabilizada com a reabertura do Suez
- O empresariato estava dividido. Uns, alicerçavam os seus negócios na relação com as colónias; outros, sabendo da inviabilidade do império colonial pretendiam uma aproximação à então CEE sobretudo, após a entrada da Grã-Bretanha
- A banca era essencialmente de capitais portugueses e o seu breve afundamento viria, através das nacionalizações de 1975, a constituir um primeiro momento de colocação do povo a pagar os desmandos dos banqueiros
- O perfil de instrução da população era baixíssimo, um dos mais baixos da Europa, com elevado número de analfabetos
- A inflação resistiu às mudanças derivadas de 25 de Abril, mantendo-se elevada até meados dos anos 90, alimentando enormes perdas de poder de compra
- A emigração para a Europa, basicamente para trabalho duro e pouco qualificado, estancou com a crise global; por outro lado, a descolonização gerou a integração de centenas de milhares de retornados
- O regime político incorporava três tendências; os ultras (Kaulza, Casal Ribeiro e Tenreiro), o centro (Marcelo, o padrinho do avatar dos abraços) e a "esquerda" (a ala dita liberal que tinha Sá Carneiro como chefe)
- A justiça enchia-se do prestígio colhido através das penas atribuídas aos presos políticos previamente definidas pela Pide
- A contestação política era baixa, a despeito de alguma atividade armada, como resultado de um afastamento - por medo ou ignorância - da esmagadora maioria da população. No entanto, o potencial de revolta estava latente e mostrou-se até ao golpe militar de 28 de novembro, a partir do qual decaiu verticalmente
2018
- O actual regime cleptocrático já vai nos 44 anos e está podre, tal como o fascismo em 1974. E, naturalmente, não é imaginável um golpe militar
- O neoliberalismo patina, dominado pelos ciclos financeiros e pela decadência ocidental face ao bloco euro-asiático que se prefigura, liderado pela China. A essa decadência corresponde uma maior agressividade comercial e militar dos EUA, que pretendem ancorar na NATO a sua hegemonia sobre a Europa
- Não se perspetiva transformação democrática da UE, com a criação de uma união solidária de povos, e a desaparição de classes políticas evidentes instrumentos do capital financeiro e das multinacionais. A contestação democrática é frágil, submergida pelas derivas patrioteiras de direita e de "esquerda"
- Portugal é apenas um corredor periférico atravessado pelos fluxos das multinacionais e um abastecedor do capital financeiro, sem qualquer relevo político ou económico na Europa, na Península Ibérica ou mesmo na CPLP
- As intervenções externas do FMI de 1977, 1983 e, mais recentemente, a da troika, em 2014 - cujos prolongamentos estão em curso - vieram mostrar que a independência é somente hino e bandeira
- O único projeto do empresariato indígena baseia-se na tradicional corrupção para o assalto ao pote, na obtenção de isenções e contratos leoninos junto dos governos e no acesso aos fundos comunitários, cavalgando a precária onda turística e da especulação imobiliária. Um arrastamento, sem qualquer visão estratégica
- Na sequência, os principais setores da economia são dominados por capitais estrangeiros, o mesmo acontecendo com a banca, depois de a plebe ser colocada a arcar com as burlas dos banqueiros nativos
- O perfil de instrução da população é o mais baixo da Europa, com o analfabetismo a ser substituído por uma iliteracia construída em telemóveis e smartphones
- A elevada inflação cedeu o lugar à desvalorização interna; isto é, não havendo desvalorização da moeda há desvalorização real do preço do trabalho
- A emigração voltou, absorve os não qualificados de sempre mas também muitos qualificados. Mas não consegue manter disfarçado o grande peso estrutural de desempregados, precários e contratados pelos negreiros do trabalho temporário
- Tal como o regime fascista terminal, o actual regime incorpora três tendências; a direita dos interesses, o centrão e os pândegos do lado esquerdo do parlatório de S. Bento. Todos, muito coesos e criativos quando se trata de beber no pote
- A justiça atola-se em processos inconclusos. Por... coincidência, aqueles onde há crimes protagonizados por altos capitalistas ou corruptos oriundos da classe política
- A contestação política é pequena e com contornos naïves; há um sentimento misto de impotência da contestação e de aceitação passiva da situação. Quando há períodos de maior contestação, logo surgem infiltrações dos partidos ditos de esquerda para jugular ou desviar o sentido dos protestos, como aconteceu em 2010/13
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