Mas, se Bernie Sanders é radical quando fala sobre mudanças econômicas nos EUA, é apenas mais um cachorrinho amestrado quando se trata de mudar alguma coisa na questão da Palestina versus Israel e pregou a manutenção da ajuda militar que os EUA dão a Israel e mais ajuda econômica "aos palestinos"
"Desde a eleição de Jeremy Corbyn como novo líder dos Trabalhistas britânicos, o noticiário em Israel está em surto. "Novo líder trabalhista britânico: Antissionista" - lia-se na manchete de Yisrael Hayom, o jornal mais lido em Israel, que pertence ao fiel apoiador de Benjamin Netanyahu e rei dos cassinos Sheldon Adelson."
(NEVE GORDON, 18/9/2015, "Israel em armas contra a ameaça Corbyn", Counterpunch)*
Assisti ontem, pela CSPAN I a um discurso entusiasmante de Bernie Sanders em New Hampshire, no qual se pôs a favor de uma "revolução política". Clamou por mudanças "radicais" para tomar as corporações e deslocar os bilionários, incluindo movimento do governo para desmontar as grandes instituições financeiras de Wall Street. Sanders há muito tempo apoia essa ação.
Mas, se Bernie Sanders é radical quando fala sobre mudanças econômicas nos EUA, é apenas mais um cachorrinho amestrado quando se trata de mudar alguma coisa na questão da Palestina versus Israel.
Há cinco dias, Sanders concedeu uma entrevista ao Little Village, publicação alternativa em Iowa, e pregou a manutenção da ajuda militar que os EUA dão a Israel e mais ajuda econômica "aos palestinos"
[ATENÇÃO: O mundo se divide entre quem fala de "os palestinos" e quem fala de "a Palestina"; os primeiros não reconhecem direito de estado e território ao povo palestino, que veem como grupo étnico sem existência política; os segundos falam de "a Palestina". A tradução abaixo segue rigorosamente a diferenciação entre "os palestinos" (como aparece na fala de BS) e "a Palestina" (que ali não aparece): BS pertence ao primeiro grupo (NTs)].
Não condenou a ocupação por Israel de terras da Palestina, mas distribuiu as culpas 'equanimemente' para os dois lados; e, embora não tenha apoiado Benjamin Netanyahu, tampouco apoiou qualquer dos programas em que trabalham os movimentos de esquerda contra a ocupação israelense, sobretudo o movimento "Boicote, Desinvestimento, Sanções" (BDS).
Aí vão algumas de suas palavras:
"Acho que os EUA precisam é de uma política equilibrada e justa para Israel e para os palestinos. Temos de garantir e assegurar que Israel possa existir em paz e segurança e que os palestinos tenham seu próprio estado e economia independente para permitir que o povo tenha padrões decentes de vida.
[Sanders observa que boicotou o discurso de Netanyahu em março passado no Congresso, porque foi "golpe de campanha eleitoral" e porque discorda de "muitas das políticas que ele prega"]
Não sei se alguém conhece alguma resposta mágica, mas eu entendo que o papel que os EUA podem ter é reunir as pessoas e desenvolver uma proposta justa e equânime para os dois lados.
[Pergunta: E como o senhor abordaria a questão política?] Ora, veja bem, não vou sentar aqui e dizer que tenho alguma solução mágica que teria escapado à inteligência e argúcia de todos os presidentes antes de mim. Essa questão é difícil. E há forças dos dois lados, em termos do conflito Israel-palestinos, que têm sido contraproducentes. Isso não se discute.
Acho que o melhor que podemos fazer é tentar aproximar os dois lados. Nosso objetivo deve ser garantir mais assistência econômica ao povo daquela região, do que só assistência militar.
Nesse momento, os EUA proveem ajuda militar substancial para Israel e Egito. Espero que, em anos futuros, a quantidade de ajuda militar possa ser reduzida e de fato substituída por ajuda econômica. Há grande miséria econômica na comunidade palestina. A recente guerra em Gaza tornou ainda pior, uma situação que já era terrível. Eles precisam de ajuda e espero que consigamos andar nessa direção."
São respostas para enganar ingênuos, além de profundamente conservadoras. Sanders nunca condena ações de Israel, nem o massacre de 500 crianças ano passado. As palavras dele me mostram claramente que Sanders realmente acredita num estado judeu e que cuida atentamente de proteger Israel.
Sanders com certeza vê como terrorismo a resistência palestina - o que põe suas ideias sobre a Palestina a léguas de distância de suas ideias sobre economia.
Sanders jamais diria que a desigualdade de renda é "questão difícil" e que todos temos de ter compreensão e paciência, porque "há forças dos dois lados, em termos do conflito Wall Street-eleitores de BS" e que, assim sendo, ninguém espere de BS alguma "solução mágica" contra Wall Street.
A verdade é que Sanders já tem solução para a Palestina! A conversa de Sanders sobre a questão é perfeita repetição-reforço do valor e da importância que ele atribui à teoria que o lobby pró-Israel prega.
Aí fala um judeu sionista ex-radical, agora aos 70 anos, o mesmo que, na juventude, mudou-se para Israel antes de mudar-se para Vermont, e que nunca deixou de apoiar Israel nas arenas do poder.
Esse tipo de socialista 'radical' é parte ativa do lobby israelense; e não porque ele deseje promover o avanço do império colonialista dos EUA ou do complexo militar industrial norte-americano -como reza a análise padrão, única análise que a esquerda norte-americana faz da política dos EUA para o Oriente Médio. Não. Bernie Sanders apoia Israel porque crê emocionalmente, profundamente, no estado judeu e na necessidade do estado judeu no século 20.
Com certeza, a esquerda materialista argumentaria que gente como Sanders não é importante para a política exterior dos EUA, porque essa mesma política já é conduzida pelos interesses financeiro-empresariais. Não é tão simples.
Eu, que sou também homem de esquerda com formação sociocultural religiosa, posso assegurar que Sanders e o grupo dele (que é o meu) de judeus inicialmente marginalizados, que alcançamos os píncaros do privilégio norte-americano ao longo dos últimos 40 anos, têm/temos tido, sim, enorme influência sobre a cultura política dos estados azuis [onde predomina o Partido Democrata].
Como se explica a decisão, da Comissão de Bem-estar e Ação Comunitária de Berkeley, de demitir um funcionário que pregou o desinvestimento contra Israel? E, atenção, estamos falando da República Popular de Berkeley, não da Halliburton ou de Washington DC -, a mesma Berkeley que apoiou sem vacilar todas as ideias que a esquerda propôs para a reforma econômica e de preservação do meio ambiente. E a mesma Berkeley que vota com a direita, na questão israelense. Por quê?
Porque os sionistas são muito ativos dentro da cultura política da esquerda norte-americana, também ali. O lobby israelense está incorporado na esquerda, porque judeus já idosos, que creem em Israel como local de abrigo e segurança de um povo perseguido são componente muito considerável da esquerda norte-americana.
No discurso de ontem, Sanders falou de seu voto contra a Guerra do Iraque e Deus o abençoe por esse voto. Chama-a de Guerra de Cheney e Bush e Rumsfeld. Mas não critica o lastro neoconservador mental que fomentou aquela guerra.
A esquerda e os liberais norte-americanos jamais se posicionarão efetivamente contra o militarismo norte-americano, até que a esquerda e os liberais norte-americanos confrontem o ramo do lobby israelense que opera também entre eles.
E os judeus norte-americanos não saberão o que fazer contra os fazedores de guerra - inclusive o que fazer do apoio que Bernie Sanders dá à guerra de Gaza - enquanto os judeus norte-americanos não enfrentarem a questão do sionismo.
No fim, os dois assuntos tratam de uma única verdadeira coisa: o infindável apoio que os EUA dão ao racismo e ao segregacionismo racista [orig. "unending U.S. support for Jim Crow in Palestine"] na Palestina. Todos esses demônios estarão a solta em 2016.
Porque jovens eleitores do Partido Democrata (predominantemente mulheres e predominantemente negros e negras) já entenderam isso e já se posicionaram a favor dos palestinos que os racistas israelenses segregam. Todos esses quererão ser ouvidos.*****
20/9/2015, Philip Weiss, MondoWeiss
* Epígrafe acrescentada pelos tradutores [NTs]
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