Aborígines do Baikal querem viver em reservas

"Temo-nos sempre considerado "eleitos" felizes do Lago e tornámo-nos, no século XXI, reféns da sua grandeza - diz Valeri Starkov, representante permanente adjunto da República da Buriátia junto ao Presidente da Rússia. - Nasci aqui e lembro-me de como o Baikal era chamado inicialmente "jóia da Buriatia", depois, "jóia da Sibéria" e depois ainda, "jóia da Rússia". Agora foi proclamado ´património mundial´. Mas a vida do povo não melhorou". Para Starkov, as restrições de toda a espécie, decorrentes da legislação ambientalista, dificulta bastante a vida da população autóctone, que vive tradicionalmente da pesca e da caça. "Por isso, a ideia de reservas é muito atraente, devendo proporcionar às etnias locais meios de subsistência" - afirma Starkov.

A palavra "reserva" não se harmoniza com as realidades do século XXI, evocando associações com as reservas dos índios nos EUA e no Canadá criadas, em tempos, à força. Mas quando uma etnia reclama uma reserva por iniciativa própria é algo extraordinário, tanto mais que a República da Buriátia tem os mesmos direitos que as outras repúblicas da Federação Russa no que se refere ao desenvolvimento tecnológico, científico e cultural. Qual é então o problema?

Em 1996, o lago Baikal, o maior reservatório de água doce do mundo, 70% do litoral do qual são terras dos buriatos, foi incluído, por decisão da X Sessão da Comissão da UNESCO, na lista do património mundial. Surgido nos tempos pré-históricos em consequência de uma deformação tectónica, o lago Baikal é o mais profundo do mundo, contendo 20% da água doce do planeta, sendo fundamental para a vida das populações que habitavam nas suas margens.

É prestigioso sentir-se parte do património mundial, mas as pessoas residentes na região desde os tempos remotos sentiram logo toda uma série de incómodos. A Rússia sugere alargar a faixa reservada no litoral de 70 para 500 metros, mas a UNESCO insiste em que a zona ecológica seja de 1.500 metros de largura no mínimo.

"Muitas interdições e nenhumas compensações às populações que vivem do lago - desabafa Starkov. - Os criadores de gado tiveram, por exemplo, de retirar dali as suas explorações pecuárias. Serão igualmente necessários grandes recursos financeiros para a instalação de dispendiosos equipamentos de purificação em todos os rios que desaguam no lago, etc.".

Na Buriátia, foram proibidas todas as explorações de petróleo, estão encerradas as jazidas de chumbo e de zinco devido a estarem abrangidas pela nova zona ecológica. Por exigência da UNESCO, a área reservada deverá ser alargada de 30 mil quilómetros quadrados para 90 mil. Uma vez que a República da Buriátia já sofre grandes prejuízos financeiros devido ao novo estatuto do lago Baikal, a sociedade deverá preocupar-se com aqueles que ficam atados de pés e mãos pelo novo "património mundial".

Enquanto as novas normas restritivas não adquiriram a força de lei, a discussão prossegue. Recentemente, no Ministério dos Recursos Naturais da Federação da Rússia, foi intensamente debatido o relatório "Do Estado do Lago Baikal e das Medidas Para a sua Protecção" baseado nos resultados dos estudos de toda uma série de centros de investigação do lago Baikal. "Por enquanto, o potencial natural do lago Baikal é suficiente para neutralizar o prejuízo causado pelos resíduos industriais. Mesmo assim, não podemos ficar descansados e por isso desenvolvemos uma política de minimização da acção do Homem sobre o lago" - frisou o vice-ministro, Valentin Stepankov. - As pessoas que residem há milhares de anos à beira do lago não prejudicam, certamente, tanto o meio ambiente como as empresas industriais, nomeadamente a fábrica de papel e celulose".

Um grupo de peritos do ministério está a trabalhar na proposta de decreto sobre o procedimento de definição da área reservada em torno dos lagos e albufeiras, inclusive o lago Baikal. Este decreto permitirá estabelecer uma nova área reservada em que todas as actividades económicas serão proibidas. Mas poderão os buriatos viver longe da água? Esta questão humanitária não pode deixar de preocupar a comunidade internacional, uma vez que esta reconheceu o lago Baikal como "património da humanidade".

Tatiana Sinitsina observadora RIA "Novosti"

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