DUMA De Estado decide em que sentido avançará a Rússia

Lembre-se que após uma série de grandes actos terroristas na Rússia, o presidente Putin propôs, para reforçar a contraposição ao terrorismo, introduzir algumas alterações no sistema político do país. A principal inovação, aliás, não diz respeito à "nomeação" dos governadores, mas à alteração da ordem de eleição dos dirigentes de poder executivo nas 89 unidades da Federação Russa.

Até hoje, os governadores das regiões, dirigentes das câmaras municipais e presidentes das 21 repúblicas nacionais na composição da Rússia foram eleitos através das eleições universais locais.

Putin declara que daqui em diante eles devem ser eleitos pelas respectivas assembleias legislativas (naturalmente, eleitas nos seus territórios) por recomendação do presidente da Rússia. A seguir, ele propõe um procedimento bastante rígido: se as candidaturas recomendadas forem declinadas duas vezes, o chefe de Estado tem o direito de dissolver a assembleia legislativa e, no caso da perda de confiança ou falhas no trabalho do novo dirigente da região, de demiti-lo também.

Qual o sentido da futura reforma e por que motivo, apesar de protestos dos partidos de oposição e críticas em relação ao projecto em algumas unidades da Federação, as inovações foram de facto já apoiadas nas audiências preliminares pela Assembleia Federal e a maioria dos órgãos de poder de regiões russas? Falando brevemente, o projecto de lei visa eliminar do sistema estatal russo os elementos excessivos de politização e substituir os políticos desnecessários para o seu trabalho eficaz em gerentes e administradores.

Deste ponto de vista, a futura reforma insere-se na política que Vladimir Putin está a aplicar na Rússia durante cinco anos.

A particularidade de Putin como presidente consiste em que ele se tornou o líder do sistema político, cuja organização e o carácter de actividade do qual não lhe convieram categoricamente. E não apenas a ele. O novo presidente herdou de Ieltsin um Estado corrupto e incapaz, sem uma sólida base económica e prestígio moral. Em Maio de 2000, depois do início do seu primeiro mandato, Putin podia sentir-se como uma pessoa ao volante de um automóvel indirigível que avança desorientadamente. Esta comparação ajuda a compreender, por que ele começou a reformar o Estado desde o primeiro dia da sua presidência e, provavelmente, continuará a fazê-lo até ao último.

Durante o seu primeiro mandato presidencial, Putin sem grandes esforços mostrou o devido lugar aos chamados "oligarcas", pessoas que receberam quase de graça os melhores "pedaços" da antiga propriedade soviética nos anos de governo de Ieltsin e acostumados desde então a entrar sem bater à porta no Kremlin, influenciando à socapa as decisões políticas mais importantes.

Um pouco mais tarde, por força do deslocamento do foco da política russa para o lado do centrismo pragmático, foi reduzida a tensão da luta política entre, falando condicionalmente, os "liberais" e "comunistas", da luta que desviava significativos recursos, mas, não correspondendo ao ciclo económico russo, não produzia um efeito positivo para o crescimento económico e a realização das liberdades cívicas para a maioria da população.

Finalmente, durante o seu primeiro mandato presidencial, Putin começou também a "reformatar" as elites regionais, privando-as de uma parte de funções políticas e tentando elevar a sua responsabilidade pelos resultados do desenvolvimento económico das regiões. Em 2002, os líderes regionais perderam o privilégio de fazer parte da câmara alta do Parlamento russo, cedendo em resultado lugar no "ranking" de principais políticos a figuras de envergadura de facto federal.

Se a seguinte etapa da reforma estatal de Putin, relacionada com a ordem de eleição dos dirigentes regionais, for concretizada, a tendência para "despolitizar" a actividade das elites regionais pode tornar-se irreversível. Afinal de contas, as reformas políticas de Putin visam resolver os problemas económicos. A "competitividade" é um dos mais frequentes termos nas suas mensagens anuais à Assembleia Federal. No ano passado, o presidente propôs como orientações nacionais a duplicação do PIB no período de dez anos e a luta contra a pobreza, que, diferentemente das reformas políticas, não são os meios, mas sim os objectivos estratégicos do Estado. Contudo, apesar de todas as reformas aplicadas, a política até hoje impede bastante seriamente o desenvolvimento da economia. A Rússia bate recordes de crescimento económico, mas o presidente e muitos outros estão descontentes apontado que o petróleo e gás ocupam grande espaço no desenvolvimento: o que acontecerá se os preços de matérias-primas caírem? Que recursos de crescimento serão mobilizados então?

Recentemente, o ministro das Finanças, Aleksei Kudrin, pessoa que os peritos consideram "próxima" de Putin, reconheceu que no país não há espaço económico único. Em cada região existe o seu próprio mercado, limitado e relativamente isolado, defendido por diferentes formas de proteccionismo local, que tem como cobertura política a instituição dos dirigentes regionais eleitos pelo povo.

Possivelmente, Kudrin carregou as tintas, mas no entanto expressou exactamente o conteúdo do problema e a sua visão pela equipa presidencial. Uma das causas que até agora impedem o desenvolvimento económico da Rússia é a politização hipertrofiada dos processos económicos, sobretudo nas regiões. Tal acontecia na Rússia imperial e na Rússia soviética orientada ideologicamente à economia planificada independentemente da sua eficácia económica.

Um recente exemplo da primazia da política sobre a economia é a actividade dos "fundamentalistas de mercado" na Rússia nos anos 90 do século passado, que afirmavam que as ideias liberais são mais importantes do que a redução paralela do PIB, das receitas "per capita" e da esperança média de vida.

A actual divisão territorial-administrativa da Rússia é também no fundo uma consequência das causas políticas e ideológicas e não económicas. O seu objectivo e a principal causa de vitalidade é a renda política recebida pelas elites regionais à conta da sua posição privilegiada e não controlada nem pelo centro federal, nem, o mais estranho que pareça, pelos eleitores. O exemplo mais patente disso é o Cáucaso do Norte que nos anos 90 do século passado se transformou num viveiro de criminalidade e fornecedor de quadros para o terrorismo internacional. Naquela região encontram-se sete repúblicas nacionais com os seus presidentes, governos, bandeiras estatais, hinos e outros atributos nacionais. Os representantes das etnias titulares poderiam com certeza orgulhar-se com tudo isso, se a taxa de desemprego não seja aqui a mais alta na Europa abrangendo 70 a 80% da população activa no Daguestão, Inguchétia e Chechénia, se as receitas "per capita" não sejam as mais baixas mesmo pelos modestos indicadores russos e se os membros dos clãs dirigentes não sejam ao mesmo tempo "padrinhos" das mafias locais. Isso sem falar que eles são incapazes de controlar como se deve a situação na região e tanto menos fazer frente ao terrorismo, o que foi patentemente demostrado pelo comportamento inadequado dos presidentes caucasianos durante os acontecimentos em Beslan.

O principal que aprenderam a fazer as elites do Cáucaso do Norte desde que o presidente Ieltsin propôs no início dos anos 90 que todas as unidades da Federação Russa "assumissem tanta soberania quanto pudessem digerir" é trazer pelo freio a sua população indigente, recebendo em troca subsídios do centro federal.

A reforma de Putin visa limpar este pântano para os rebentos de vida civilizada, sujeitar a situação ao controlo do Estado para formar as bases de administração racional e responsável, sem o que são impossíveis tanto a democracia e os direitos humanos, como um mercado comum. Naturalmente, as medidas concretas podem ser corrigidas, inclusive sob a influência de críticas por parte de dirigentes regionais, porque não em todas as repúblicas nacionais da Rússia a edificação estatal em princípios étnicos sofreu tão tremendo fracasso como no Cáucaso do Norte. Contudo, a direcção do movimento já é definida.

Yuri Filippov observador político RIA "Novosti"

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