O PROGRAMA ESPACIAL RUSSO

A Rússia pode, com toda justiça, ser considerada a terra natal da exploração espacial, pois foi pioneira em vários feitos durante o tempo da União Soviética. A lista das realizações espaciais soviéticas é longa: lançou o primeiro satélite artificial da Terra, o Sputnik I; colocou o primeiro ser vivo em órbita, a cadela Laika; mandou o primeiro homem ao espaço, Yuri Gagarin; também a primeira mulher, Valentina Tereshkova; realizou o primeiro passeio espacial fora de uma espaçonave, o do cosmonauta Aleksei Leonov; os primeiros veículos não-tripulados que pousaram na Lua e em Marte foram soviéticos; e até hoje, o único país que conseguiu descer uma nave em Vênus (planeta cuja superfície atinge mais de 400 graus Celsius de temperatura) foi a URSS. E desde a década de 70, a Rússia tem conseguido recordes de permanência no espaço que, embora não sejam tão espetaculares quanto os feitos anteriores, são importantes para preparar uma futura viagem tripulada a Marte.

Para ser justo com os EUA, este país conseguiu dois feitos que a URSS não pôde igualar: enviar seres humanos à superfície da Lua (sendo que o principal motivo que fez a URSS perder a corrida para a Lua foi seu excesso de confiança graças a seus sucessos) e mandar naves não-tripuladas para os planetas exteriores, além da órbita de Marte (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno; Plutão permanece o único planeta não explorado do sistema solar. A NASA tinha um projeto conjunto com a Rosaviakosmos, a agência espacial russa, na década de 90, para enviar uma sonda até esse planeta; projeto que teve sua verba cancelada por George W. Bush, que prefere gastar dinheiro com armas, guerras e confrontação, do que no desenvolvimento científico pacífico e em parceria com outros países). Os EUA com certeza têm uma grande importância e seu lugar garantido na história da exploração humana do espaço; mas temos que reconhecer que é bem menor do que o pioneirismo da URSS. Pioneirismo, aliás, que começa bem antes de 1957 (ano do lançamento do Sputnik I), e que data ainda do século XIX, quando um professor primário de Ijevski (na época, uma pequena cidade isolada da Rússia tsarista, hoje capital da república autônoma da Udmúrtia, na Federação Russa) começou os primeiros estudos verdadeiramente científicos acerca da possibilidade de mandar engenhos e até pessoas para além do orbe terrestre: foi Konstantin Tsiolkovski, cujos trabalhos teóricos influenciaram e anunciaram quase tudo o que Sergei Korolyov, engenheiro-chefe do programa espacial soviético nos gloriosos tempos do Sputnik e de Gagarin, iria fazer 80 anos depois.

Se um dia a humanidade chegar a colonizar outros planetas e explorar outros sistemas solares, poderão dizer que, sem dúvida alguma, foi na Rússia que tudo começou, tanto na teoria quanto na prática.

Depois do fim da URSS, porém, virou moda ridicularizar e menosprezar o programa espacial russo. Era comum chamar a estação espacial Mir (principal equipamento dos projetos tripulados russos nas décadas de 80 e 90, e a mais complexa estrutura orbital já montada por um só país) de "calhambeque espacial". Também o filme "Armaggedon", de 1998, com Bruce Willis, mostra uma estação russa (inspirada na Mir), que mais parece uma máquina a vapor do século XVIII, desmantelando-se no espaço. E quando a NASA decidiu enviar seus astronautas à Mir houve um certo repúdio da sociedade norte-americana, contrária a que fossem enviados seus homens a veículos estrangeiros "inferiores", onde eles supostamente correriam sério risco de vida.

De fato, a partir de 1996, a estação Mir passou a apresentar problemas técnicos, que incluíram uma colisão com uma nave não-tripulada, a despressurização de um de seus módulos, e até um incêndio a bordo. Apesar desses contratempos graves, nunca um único tripulante da Mir ficou ferido ou correu risco de vida (nunca o perigo foi suficientemente sério que justificasse o abandono da estação). E é natural que esta estação apresentasse problemas, uma vez que começou a ser construída em 1986, com uma vida útil estimada de 6 a 8 anos. Os soviéticos planejavam aposentá-la no máximo até 1994, e em substituição construiriam a estação Mir 2, ainda maior e mais capaz, que acabou sendo atrasada (e depois cancelada) com o fim da URSS e a crise econômica da Rússia nos anos 90 (o único módulo da Mir 2 que chegou a ser construído foi afinal utilizado na atual Estação Espacial Internacional, da qual a Rússia é parceira importantíssima). O fato da Mir ter continuado operacional por muito mais tempo do que o previsto (só foi desativada em 1999), apesar de problemas técnicos, mostra não a deficiência, mas a tremenda confiabilidade desse engenho, que superou em muito as expectativas iniciais.

Mas o que prova o enorme sucesso do programa espacial russo é a segurança de seus foguetes. Os Estados Unidos tiveram já dois acidentes fatais com suas naves reutilizáveis (os ônibus espaciais) em pouco tempo: em 1986 a Challenger explodiu na decolagem, matando seus 7 tripulantes; e neste ano a Colúmbia também explodiu, matando outra vez todos os seus 7 tripulantes, desta vez nas manobras de pouso. Em 17 anos (o que não é muito tempo, considerando que há apenas 4 ou 5 lançamentos de naves tripuladas por ano), houve dois acidentes fatais com naves norte-americanas e 14 astronautas mortos. Ao contrário do que pensava a opinião pública norte-americana, a Mir era no final das contas muito mais segura do que os ônibus espaciais da NASA. Por outro lado, o último acidente fatal com cosmonautas russos deu-se em 1971, quando uma nave Soyuz despressurizou-se durante a reentrada na atmosfera terrestre, matando 3 tripulantes.

Depois disso, a Soyuz passou por aperfeiçoamentos, é utilizada até hoje, e nunca mais houve uma única morte, um único acidente sério no programa tripulado russo. Mais de 30 anos sem nenhuma baixa ou acidente grave, considerando que a URSS lançava muitos mais foguetes tripulados nas décadas de 70 e 80 do que os EUA, é sem dúvida um recorde impressionante de segurança e confiabilidade. Nesses aspectos, o programa espacial russo supera imensamente o norte-americano.

Cabe ainda notar que, agora que todos os vôos tripulados dos EUA estão suspensos, depois da tragédia da Columbia, quem está mantendo em funcionamento a Estação Espacial Internacional, enviando-lhe tripulantes e naves de reabastecimento, é a Rússia. Só é incompreensível que, diante de todos esses fatos, a imprensa dos EUA e de vários outros países ainda tenham o despeito de desmerecer e ridicularizar o notável programa espacial russo. Carlo MOIANA Pravda. Ru MG Brasil

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