O presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, deu um pequeno aumento de verbas à agência espacial de seu país (Nasa) no orçamento deste ano: 16,5 bilhões de dólares, um incremento de 2,4% em relação ao ano anterior. Esse aumento se deve às novas metas, estabelecidas pelo presidente no ano passado: enviar uma missão tripulada para a Lua antes de 2020, e outra para Marte por volta de 2030.
Essas novas metas se devem a um fato conhecido por todos: há mais de 20 anos que a Nasa não consegue nenhuma grande realização no espaço. Seu último grande feito foram as sondas não tripuladas Voyager, lançadas em 1977, as primeiras a chegar aos planetas além da órbita de Marte (Júpiter, Saturno, Urano e Netuno). Na área de viagens espaciais tripuladas, a situação é ainda pior: seu último grande feito foi em 1969, quando enviaram os primeiros homens à Lua. Os EUA foram os primeiros a construir um veículo espacial reutilizável em 1980 (um avanço tecnológico, mas nada que atraia a opinião pública), mas esses veículos se revelaram caros, de pouca capacidade e, pior, muito inseguros, como ficou provado com a destruição de dois de seus ônibus espaciais (de uma frota total de cinco), o Challenger e o Columbia.
Daí a ênfase tão grande nas missões para a Lua e para Marte, por parte de Bush: quer que seu país volte com missões tripuladas ao satélite terrestre, antes que qualquer outro país o faça, e quer ser o primeiro a enviar pessoas a outro planeta feito ainda não alcançado.
Desde que perderam a corrida à Lua, a URSS vinha trabalhando silenciosamente numa missão tripulada para Marte a longo prazo. Enviar homens ao planeta vermelho é muito mais complicado que ao satélite terrestre: a viagem à Lua, ida e volta, leva 8 dias, e para Marte cerca de 2 anos. Uma falha, como a que ocorreu com a Apollo 13 (a nave enviada à Lua, conhecida pelo filme feito sobre ela, cujo tanque de oxigênio explodiu), seria fatal a uma distância tão grande da Terra. Além disso, é necessário preparar física e psicologicamente seres humanos para poderem aguëntar tanto tempo sem gravidade.
Foi por isso que, ao longo das décadas de 70 e 80, a URSS construiu uma série de estações espaciais: sete do tipo Salyut, e por fim a Mir, a maior e mais complexa estrutura orbital já contruída por um só país. Para não ficar atrás dos soviéticos, os EUA construíram a Skylab (que foi tripulada por apenas uma missão, e destruída na reentrada da atmosfera muito antes do previsto pelos seus projetistas), e na década de 80 anunciaram a Freedom, um projeto extremamente ambicioso de uma estação ainda maior que a Mir. Gastaram milhões com projetos, maquetes e principalmente propaganda mas nunca construíram sequer um parafuso da Freedom. Na década de 90 o projeto foi abandonado, e os EUA aceitaram participar do projeto da Estação Espacial Internacional (EEI), junto com a Rússia, países da Europa, Japão, Canadá e Brasil.
Os soviéticos, sem todo estardalhaço dos norte-americanos, começaram a construir a substituta da Mir, a Mir 2, maior que sua antecessora, e desenvolveram as tecnologias para uma missão para Marte: inclusive um motor elétrico, completamente novo e único. Planejavam chegar a esse planeta no começo do século XXI, e provavelmente teriam alcançado tal objetivo, se não fosse a terrível crise econômica que se seguiu ao fim da União Soviética, na década de 90, e que levou ao cancelamente de vários programas: o foguete de grande porte Energiya, a nave reutilizável Buran, a nave-robô a Marte Marsokhod, e a Mir 2. As partes já construídas para a nova estação foram aproveitadas na EEI.
Atualmente, a Rússia possui um projeto quase totalmente completo para uma missão tripulada a Marte, com um custo total de cerca de 14 bilhões de dólares um valor muito baixo para uma viagem de tal magnitude. Há rumores de que o projeto segue, e que a Rússia planeja chegar a Marte antes que os EUA, em 2015 embora não tenham anunciado nada oficialmente, nem façam alarde. Os EUA não têm nenhum projeto completo nem dispõe de várias tecnologias para enviar seres humanos a outro planeta: nem sequer possui um veículo para mandar pessoas à órbita terrestre, e necessitam usar naves russas. E estima-se o custo da missão marciana dos EUA em 100 bilhöes de dólares.
O orçamento da Nasa, mesmo com o aumento deste ano, não é suficiente para uma tal missão. Para destinar mais recursos à missão marciana, a Nasa está abandonando projetos científicos exitosos, mas que não são tão espetaculares para propaganda, como o telescópio espacial Hubble. Muito provavelmente, o custo e o prazo para uma missão dos EUA a Marte serão muito maiores do que o anunciado, considerando que terão que iniciar do zero o desenvolvimento de quase todas as tecnologias necessárias para a missão (das quais a Rússia já dispõe).
A Nasa só conseguirá enviar esta missão se tiver orçamento ilimitado, como teve na década de 60 para enviar homens à Lua antes dos soviéticos. Mas com o imenso déficit e o gasto militar crescente dos EUA, a Nasa terá que se contentar com um orçamento muito limitado. A missão marciana dos EUA provavelmente terá o mesmo destino da Freedom: muito estardalhaço, muita propaganda, e nenhuma realização concreta. Na verdade, os EUA têm duas opções: ver amargamente os russos chegarem primeiro a Marte, por volta de 2015; ou unirem-se a eles para uma missão conjunta, algo que dificilmente seria aceitável para o ultra-nacionalismo do atual presidente norte-americano. Carlo MOIANA Pravda.ru Argentina
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