Que há por trás da batalha legal contra Pinochet?

A defesa voltou a apelar sustentando que a Corte Suprema deveria voltar a exonerá-lo como o fez há dois anos por razões de saúde mental.

Por trás desta batalha legal se dá uma forte batalha política. Porquê o ex-general, elogiado por muitos como o primeiro autor do modelo econômico neo-liberal que logo tomaria Thatcher e o mundo, agora vai perdendo aliados?. Porquê seus antigos aliados lhe dão as costas?

Durante a guerra fria Washington incentivou uma série de golpes militares para fazer frente a fortes movimentos sociais. As ditaduras anticomunistas foram a última carta que utilizavam para arrasar o que viam como um ‘perigo vermelho’.

Depois do desarranjo da União Soviética em 1991 e o acoplamento dos principais partidos que se reclamam marxistas ao novo ordem mundial, os EUA concebem que esse recurso já é contraproducente. A melhor maneira que têm hoje para desenvolver seu modelo de abertura econômica e livre empresa consiste em fomentar democracias nas quais a antiga esquerda radical se modere e aceite administrar seus respectivos estados e economias sem ter que se distanciar das recomendações dos organismos financeiros mundiais.

Por isso é que hoje os EUA podem deixar que sejam sacrificados generais acusados de crimes em massa no Congo, Argentina ou Chile. É mas, ao permitir que eles possam ser processados conseguem três objetivos: fortalecem a imagem democratizante que pretendem dar a sua estratégia global, mostram aos seus antigos inimigos vermelhos que algumas coisas podem conseguir a condição para se desenvolver dentro do sistema, e procuram evitar alterações a nova ordem constitucional já seja mediante explosões sociais ou golpes.

A sorte de Pinochet difere da do boliviano Hugo Bánzer. Ambos generais comandaram sanguinários golpes anti-comunistas. Bánzer achatou à Assembléia Popular com sua ‘cuartelazo’ de Agosto 1971 e Pinochet fez o próprio 25 meses contra a Unidade Popular. No entanto, Bánzer foi abandonando seu passado ‘gorila’ para reciclar-se como ‘democrata’, coisa que Pinochet falhou em fazer.

Em 1978 Bánzer deixa o poder e se lança ao rodo eleitoral. Em 1985-89 apóia ao governo de Paz que executa seu plano econômico e em 1989-93 leva à presidência o Movimento de Esquerda Revolucionária, que tanto perseguiu, mas com a condição de que implemente seu programa.

Em 1998 Bánzer chega à presidência apoiado por 4 dos 5 principais partidos. Até então ele já tinha pedido desculpas e tinha mostrado capacidade para co-governar com partidos que se auto-proclamam ‘revolucionários’.

Pinochet, em troca, manteve-se teimoso, soberbo e hostil à esquerda, pese o fato de que o atual presidente Lagos provem dessa ala. Por outro lado, sua conversão democrática é mais difícil devido ao seu passado (17 anos de ditadura fortemente combatida por todos os partidos socialistas e comunistas em nível planetário).

O que chama o atenção é como a atual direita pode aceitar que se sacrifique Pinochet, algo impensável faz uma década. Quando se produziu a transição entre a junta e a atual democracia representativa, o conservadorismo mapochino temia que se se permitisse um ajuste de contas contra vários generais se poderia pôr em questão o modelo monetarista e abrir uma válvula de escape para que se gerasse uma explosão social.

Hoje, o Acordo socialista-democristão demonstrou durante mais de 3 lustros seu compromisso em manter a estrutura econômica criada por Pinochet. O empresariado chileno aceita o sacrifício de quem chegou a considerar seu protetor como uma forma de castigar excessos e recompensar Lagos pelos serviços prestados.

A esquerda extraparlamentar quer aproveitar a conjuntura para pedir a anulação das leis trabalhistas e as privatizações feitas durante o pinochetismo. Alguns de seus setores pedirão tribunais populares e uma revolução social que erradique às classes que alentaram ao ditador. O que o atual governo e a oposição ‘moderada’ quer dizer aos radicais é que devem abandonar esse caminho e confiar na corte de justiça.

Ao prender legalmente Pinochet os socialistas chilenos estariam vingando a Allende e ao golpe que ele lhes lançou em 1973. O paradoxo é que Pinochet já efetuou sua vingança antecipada. Esta consiste em que muitos de seus inimigos abandonaram seu anterior radicalismo para abraçar o modelo monetarista e privatizante que ele impôs.

Isaac Bigio Analista Internacional www.bigio.org

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