Que todos regressem à casa

Entre a obsessão de um governante e a luz no final do túnel. É a luta e a resistência. É um imperativo da razão e do senso comum em um conflito que se agudiza e aumenta a cada dia. A essa margem do intercâmbio humanitário se deve chegar inevitavelmente e, inclusive, por cima do ódio de Uribe, que quer afunda-lo para sempre no pântano.

A Colômbia necessita de um mecanismo, de uma lei para resolver o problema e mais ainda quando não se avista no horizonte a possibilidade de uma solução do conflito. As partes contendentes vão fazer mais prisioneiros e a reclusão de militares, policiais, dirigentes políticos e guerrilheiros nas montanhas e nas prisões não se pode estender eternamente.

Enquanto no Oriente Médio dois acérrimos inimigos, o sionismo israelense e o povo palestino que luta por sua terra, acordam sem maiores fricções a troca de prisioneiros, na Colômbia a obstinação de um presidente causa mal-estar e um terrível dano moral às esperanças de muita gente. Não escuta governos amigos nem os familiares dos prisioneiros, nem os ex-presidentes, nem o Papa. Só escuta sua própria obstinação.

Uribe tem atravessado todos os obstáculos no intercâmbio humanitário de prisioneiros. Para ele não é válido nem aplicável o Protocolo de Genebra, apesar de que a Colômbia é país signatário do mesmo. Nega-se a nomear seus plenipotenciários ou negociadores quando as FARC há muitos meses designaram os seus. Entende a troca como desterro dos combatentes guerrilheiros em países de ultramar. Meteu em sua cabeça a fantasia de que liberta-los é desmoralizar as tropas. Rechaçou a carta que lhe enviaram os ex-presidentes López, Samper e Turbay, tanto a ele como ao comandante Marulanda, aduzindo que o colocavam no mesmo nível de um “chefe terrorista”. E este é outro Cavalo de Tróia contra o intercâmbio humanitário: “não vamos trocar cidadãos de bem por delinqüentes terroristas”, dizem. Diante disto caberia se perguntar: quem são realmente os terroristas criminosos? Como bem o demonstra o ex-presidente López, não tem sentido neste caso desqualificar o adversário. Para uma grande faixa de opinião é incompreensível que enquanto o presidente Álvaro Uribe se mostre benévolo com os mais tenebrosos chefes paramilitares aos quais condecora com uma lei de alternatividade penal que os exonerará totalmente de seus crimes de lesa humanidade e lavará seus capitais ilícitos, seja tão insensível e indolente diante do drama de oficiais e suboficiais da força pública que arriscaram sua pele defendendo as instituições e o governo; o mesmo que hoje os condena ao abandono, à selva e ao esquecimento.

Agora Uribe projeta e acaricia outra perversidade que não só entravaria ainda mais a possibilidade de troca, mas que significaria um alto custo para as oligarquias subservientes: a extradição de guerrilheiros colombianos para os Estados Unidos. Os familiares dos militares e dirigentes políticos em poder da insurreição devem levar a sério este assunto e se interporem com força a esta intenção que, além de jogar ao limbo o intercâmbio de prisioneiros, é uma afronta à soberania e à dignidade da pátria.

Os guerrilheiros são antes de tudo lutadores políticos. Rebeldes contra um sistema injusto que oprime. E a rebeldia é uma atitude justificada plenamente pelo direito universal. Este direito não poderá desaparecer da face da Colômbia por truculências jurídicas, e não poderá ficar enganchado entre leis concebidas como teias-de-aranha para entrelaçar nelas o povo e para perpetuar o abuso e a opressão. Desnaturalizar o delito político, como o faz a oligarquia colombiana, é lançar ao mar a chave que haverá de abrir algum dia as portas da paz negociada. E o mais grave é que o faz através de mentiras abomináveis como essa do “narcoterrorismo”.

A extradição de compatriotas, quem quer que sejam eles, mais cedo do que tarde deve ser julgada como delito de alta traição à pátria. O país que tem resistido durante quase dois anos aos furiosos bombardeios midiáticos do governo, começa a reagir. Não vai ser fácil satanizar a dignidade das pessoas que se opõem com decoro à prostração de nossa soberania diante das cortes ianques. Quem erigiu o grande terrorista universal e violador dos direitos humanos em juiz supremo dos povos do mundo? O governo dos Estados Unidos não tem moral para nada.

É de se supor que o povo que derrotou o referendo uribista derrotará também a ambição reelecionista do incendiário do país que quer prosseguir uma guerra que não está ganhando e nunca ganhará e que se opõe, teimosamente, à troca de prisioneiros.

Para o justo anseio de intercâmbio humanitário é muito valioso o pronunciamento de Semana Santa da hierarquia católica da Colômbia. E igualmente seu respaldo à solução política do conflito. Sabem eles que a troca de prisioneiros pode criar as condições para a necessária abertura das alamedas do entendimento e do pacto social.

Queremos Simón Trinidad e todos os nossos guerrilheiros de regresso à casa; e também queremos que Ingrid, o ex-ministro de Estado Fernando Araújo, os ex-parlamentares e deputados, os militares e policiais, e inclusive os gringos prisioneiros, retornem à sua casa como resultado de um acordo entre o governo da Colômbia e as FARC. Que todos regressem à casa!

A todos os compatriotas que anseiam e lutam por uma pátria com trabalho, pão, teto, saúde, educação, liberdades políticas, por umas Forças Armadas Bolivarianas e pelo respeito a nossa soberania nacional:

“Há anos sei que o cárcere é também uma possibilidade em nosso caminho da vitória. Por isso, em minha condição de prisioneiro de guerra, continuarei a luta. Assim me dita a consciência, continuo convencido de que a causa popular, essa que abracei anos atrás e pela qual abandonei todos os privilégios econômicos, sociais, culturais e políticos que algum dia tive, é a mais justa e nobre que um revolucionário de verdade deve assumir. Assim me ensinaram com seu exemplo milhões de compatriotas simples, humildes, mas muito valentes, que em variadas formas de combate popular procuraram e procuram historicamente realizar as profundas mudanças que requer, urgente, a Colômbia”.

A minoria uribista no poder pretende desmoralizar os lutadores populares e suas organizações ao fazer crer que, com minha captura no Equador, deram um golpe demolidor contra as FARC – Exército do Povo.

Vã ilusão. Sou apenas mais um dos tantos milhares de guerrilheiros da organização. As FARC-EP continuarão sólidas em toda a Colômbia porque as causas que deram origem ao nosso levantamento em armas continuam vigentes: um regime político oligárquico, corrupto e terrorista que entregou nossa soberania aos Estados Unidos; a concentração indignante da riqueza; as profundas desigualdades sociais que dividem os colombianos; e umas Forças Armadas que mantêm com a guerra tudo isso e traidoras do ideário do Libertador Simón Bolívar.

No Equador eu adiantava uma missão importante para o futuro da paz na Colômbia, mas não estou autorizado a dizer qual. Ninguém me delatou em Quito. Pelo monitoramento que faziam à pessoa com a qual me alojei, a Polícia me descobriu e informou aos militares colombianos e agentes gringos, os quais fizeram o operativo de captura. De modo que o pagamento de milhares de dólares a um delator fantasma é mais um roubo dos corruptos que manejam os orçamentos multimilionários para a “segurança democrática”.

Agradeço as vozes de alento dos jornalistas, dos homens e mulheres postados à entrada do Tribunal, espero, isso sim, objetividade na informação. Não se deixem manipular por seus chefes e donos desse aparato de propaganda oligárquica em que se transformaram os meios de informação.

E não mais, porque estou violando determinações superiores, não estou autorizado para dar opiniões públicas, só o Estado Maior e seu Secretariado estão se pronunciando publicamente e eu não pertenço nem a um nem a outro.

Abraço revolucionário a todos os combatentes das FARC – Exército do Povo, aos milicianos populares e bolivarianos, aos camaradas do Partido Comunista Clandestino Colombiano e, sobretudo, aos milhares de operários, camponeses, estudantes populares, indígenas, profissionais, artistas, militares patriotas e sacerdotes de base membros do Movimento Bolivariano.

Viva Bolívar! E adiante com a luta Contra o imperialismo, pela pátria! Contra a oligarquia, pelo povo!

Iván Márquez

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