Júlio Mendes (JM):Senhor Director, há quanto tempo reside em Portugal?
Timothy Bancroft-Hinchey (PRAVDA.Ru): Senhor quê? Meu nome é Timothy. Vivo cá há uns 27 anos mas agora estou entre Portugal e Brasil e Moscovo, claro.
JM: O senhor tem adoptado às vezes uma posição muito crítica contra Portugal e os portugueses. Pode explicar como concilia viver entre nós e criticar-nos?
PRAVDA.Ru: Primeiro vamos lá ver as coisas como estão. Eu não adopto uma atitude que critica Portugal e os portugueses. Eu elogio muitas vezes Portugal e os portugueses, pois têm grandes qualidades e há exemplos amiúde por aí na Internet dos meus artigos a falar destas qualidades, se quiser fazer alguma pesquisa.
É importante realçar também o facto que quando cheguei a Portugal, não me caparam nem ataram minha língua. Tenho o direito de falar aqui como em qualquer outro país. Ora bem, se eu estivesse aqui a enriquecer e a fugir ao fisco, aí sim, tinha de ficar calado mas não é o caso. Até ao contrário, minha esposa foi penalizada agora porque declarou algo que tinha ganho extra, às Finanças
Critico às vezes e quando achar adequado e merecido não Portugal e os portugueses, o que seria um absurdo, mas sim as autoridades ou responsáveis por certos sectores, muitas vezes o SEF, pois os imigrantes merecem ser defendidos. Segundo, e aí é que vai levar uma crítica você. Vocês os portugueses em geral têm um problema patológico em aceitar uma crítica, especialmente quando é proferida por um estrangeiro.
Em vez de prestarem atenção, escutarem com atenção e analisarem a questão objectivamente, ficam defensivos e depois lançam aquela frase que eu acho o cúmulo de estupidez: Quem não está bem, vai-se embora. Dá vontade de responder que se quiserem chafurdar na porcaria, então façam o favor de continuar.
Acho que tenho o direito de falar, pois vivo aqui há quase três décadas, pago por mês muito dinheiro em impostos para beneficiar muitos portugueses. Ora bem, exigir que eu pago tanto dinheiro sem ter o direito de falar seria admitir que estamos num regime fascista ou então a viver sob um estado chulo, por isso falo de viva voz quando necessário, mas nunca contra o país ou o povo, sempre contra um alvo responsável.
JM: E quais os assuntos que mais critica em Portugal?
PRAVDA.Ru: Poucos, de facto. Vocês conseguiram criar aqui uma sociedade aberta, com plena democracia, tem dois partidos políticos que trabalham muito para o bem público, nomeadamente o PCP e Bloco de Esquerda e tem muitas pessoas competentes no PS também. É um lugar agradável e há possibilidades para uma pessoa desenvolver várias actividades, que é meu caso.
O que não gosto é a teimosia em não utilizar formas modernas de comunicação na resolução de questões banais. Por exemplo, eu há dois anos atrás, passei uma semana das minhas férias para renovar meu cartão de residência. Duas vezes por ano acompanho imigrantes que pedem o visto de trabalho e passamos um dia inteiro no ACIME só para receberem um carimbo. Mas que absurdo! Onde estão as tecnologias novas? Por quê não marcar dia, hora e sítio, dizer às pessoas para trazer documento A, B e C e dar o carimbo aí, em quê? Dois minutos? Veja, quantas horas-homem são perdidas nessa estupidez?
Outra questão que levanto é que é praticamente impossível tratar de qualquer coisa que fosse se uma pessoa não for ao edifício sede, porque tentar tratar ao telefone é inútil, porque ou cai a chamada, ou o número na lista já não existe, ou simplesmente não respondem, ou por qualquer outra razão absurda.
Mas isso a parte, só tenho elogios para dar aos portugueses. Está a ver? Uma pessoa levanta duas críticas e é logo rotulado como anti-português. Longe disso, amigo, longe disso
JM: Vejo que o senhor tem um serviço gratuito de ajuda aos imigrantes. Como funciona?
PRAVDA.Ru: Eu não tenho, PRAVDA.Ru é que tem. Pois, nós prestamos um serviço de consultoria gratuita para as pessoas que querem vir a Portugal ou a Europa trabalhar ou pessoas que já cá estão e têm problemas. Ou damos a informação directamente ou encaminhámo-los para os serviços competentes e é de realçar que há muita boa gente aqui a trabalharem a favor dos imigrantes, SOS Imigrante, SOS Racismo, Casa do Brasil entre muitos outros organismos. As pessoas contactam-nos e nós damos nossa opinião. Sempre encorajamos as pessoas a virem ou permanecerem em estado legal, é fundamentalmente importante que as pessoas saibam isso.
JM: Como vê a lusofonia?
PRAVDA.Ru: Não a vejo, oiço.
JM: Mas...qual é sua opinião sobre a lusofonia? O senhor Timothy tem dado muitas entrevistas no Brasil acerca deste tema.
PRAVDA.Ru: Estou a brincar consigo. Pois, a Lusofonia é uma palavra muito referida em Portugal, legado do passado e nem por isso muito bem definido no presente. Se há uma lusofonia, há também uma lusografia e isso passa pela leitura também.
Vejo a lusofonia e lusografia, ou seja, a língua portuguesa, razoavelmente bem implantada em oito países, uns mais que outros mas não se pode pensar que já está, a CPLP fala português, estamos em quinto ou sexto lugar na tabela das línguas mais faladas (por causa do Brasil) e pronto, que bom!
Não é nada assim, as línguas são fluidas e flexíveis, mudam, alteram, são quinéticas e por isso exigem uma grande vigilância. Nem pensem por um momento que toda a população de Cabo Verde, da Guiné-Bissau, de Angola, de Moçambique, de São Tomé e Príncipe, de Timor Leste fala português bem, ou até fala algum português. Não é verdade.
Por isso a lusofonia e lusografia são projectos duma implantação e implementação permanente.
JM: Já passou férias entre nós?
PRAVDA.Ru: Não, vou normalmente ao Brasil passar férias, onde vou agora dia 3 para Fortaleza, passar lá uns 16 dias no sol cearense.
JM: Gosta mais de Portugal ou de Brasil?
PRAVDA.Ru: Ha!Ha!Ha!Ha!Ha! Isso é lusofonia a falar ou algum desejo de realçar seu orgulho nacional? Nem gosto mais ou menos de qualquer país em relação aos outros. Adoro o Brasil, adoro os brasileiros, adoro Portugal e os portugueses, adoro Moscovo, adoro a Rússia e os russos.
Temos de aceitar os países e pessoas como são, dar umas sugestões para quem estiver interessado em ouvir mas fundamentalmente respeitar.
JM: Fala-me dos seus outros projectos.
PRAVDA.Ru: Bem, PRAVDA.Ru ocupa muito tempo mas também colaboro em outras publicações em língua russa, como o jornal de comércio externo da Federação Russa e sou sócio e coordenador internacional da revista ÁFRICA TODAY.
Todas as edições são pontes culturais. Acho importante que a imprensa tenha algum poder de intervenção quando isso é para o bem comum. Além disso, adoro escrever, por isso posso dizer que sou um homem muito feliz, graças a Deus.
Júlio Mendes
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