Fala José Sá Fernandes

1. O Parque Mayer e a Feira Popular são duas estruturas emblemáticas e vitais para a identificação da cidade de Lisboa. O actual executivo camarário prometeu viabilizá-las, mas chega ao fim do seu mandato sem o conseguir, lançando o marasmo e a maior confusão acerca do seu destino.

A terminar, escolheu opções verdadeiramente ruinosas, que os Lisboetas e os Portugueses devem conhecer. 2. O Parque Mayer integra uma área consolidada de edifícios de utilização colectiva terciária, nos termos previstos no art.º 62º do Plano Director Municipal. 3. Acresce que o Parque Mayer integra a Unidade Operativa de Planeamento e Gestão (UOP) nº 11 – eixo terciário das avenidas –, prevista no art.º 125 e anexo IV do Plano Director Municipal. 4. Por outro lado, cerca de 30% dos terrenos da antiga Feira Popular integram igualmente uma área consolidada de edifícios de utilização colectiva terciária e o referido eixo terciário das avenidas. 5. Nas áreas consolidadas de utilização colectiva terciária devem predominar serviços, comércio e equipamentos para utilização colectiva. 6. Nessas áreas não se devem admitir novas construções ou mudanças de uso fora do quadro de um plano de urbanização ou de pormenor. Veja-se o que consta do preâmbulo do PDM: “As áreas de terciário deverão ser objecto de regulamento ou plano de pormenor. Só no âmbito destes regulamentos ou planos poderão ser licenciados loteamentos, novas construções, ou alterações profundas aos edifícios existentes ou às mudanças de uso. Pretende-se obrigar a regulamentar ou planear prioritariamente todas as áreas destinadas predominantemente ao terciário, no sentido do seu controlo e qualificação urbanística. Criam-se normas supletivas para a gestão, aplicáveis enquanto não existirem regulamentos ou planos aprovados, as quais permitem a realização de obras de beneficiação e pequenas ampliações, nos edifícios existentes.” 7. É por isso que os arts. 62º e 63º do Plano Director Municipal proíbem alterações à edificabilidade ou uso dos prédios que integram tais áreas consolidadas sem que tenha sido aprovado um plano de urbanização ou de pormenor que as abranja. Fora disso, só obras muito pontuais é que podem ser feitas, não se admitindo que a superfície de pavimento – soma das superfícies brutas de todos os pisos – aumente em mais de 20% ou em mais de um piso. 8. Neste contexto legal – que indiscutivelmente se aplica ao Parque Mayer e a cerca de 30% dos terrenos da Feira Popular –, é escandalosamente ilegal, abusivo e inexplicável à luz de um padrão mínimo de exigência prever uma edificabilidade de 50 000 m2 para o Parque Mayer e 120 000 m2 para os terrenos da Feira Popular. 9. A permuta feita entre o Município de Lisboa e a Parque Mayer Investimentos Imobiliários S.A. – entre o Parque Mayer e cerca de metade dos terrenos da Feira Popular – é nula e de nenhum valor, porque assenta em pressupostos de edificabilidade que não existem, o que se vai requerer que seja declarado pelos tribunais. 10. Do mesmo passo, é nula a hasta pública de venda de parte dos terrenos da Feira Popular, porque igualmente assenta num pressuposto de edificabilidade da zona mais próxima da Av. da República (cerca de 30% da área total) que também não existe, o que igualmente se vai requerer que seja declarado pelos tribunais. 11. Acresce que os procedimentos camarários em causa violam ainda de forma grosseira os princípios da prossecução do interesse público e da proporcionalidade. 12. Não é possível conceber parâmetros de comparação entre terrenos que se querem permutar sem previamente se saber o que neles se pode construir. 13. O Parque Mayer (com 18 388 m2) é uma zona com grandes restrições construtivas, decorrentes da sua classificação patrimonial e das áreas de protecção em que está inserido, enquanto os terrenos da antiga Feira Popular (com 44 625 m2) só em cerca de 30% é que integram uma área consolidada de edifícios de utilização terciária; todavia, são-lhes apontadas perspectivas de edificabilidade proporcionalmente equiparadas (50 000 m2 no Parque Mayer e 120 000 m2 na Feira Popular), o que não é razoável pressupor. 14. E, em qualquer caso, não é razoável que uma autarquia local permute terrenos sem saber a viabilidade da respectiva edificabilidade, quando depende de si accionar os planos de ordenamento que permitirão avaliar essa viabilidade. 15. É um jogo-de-cabra-cega que não tem qualquer justificação. 16. As deliberações em causa consubstanciam, pois, uma deficiente prossecução do interesse público, que aconselharia fazer depender qualquer permuta do conhecimento dos respectivos planos de ordenamento. 17. E favorecem de forma injustificada a Parque Mayer Investimentos Imobiliários S.A., em termos que encerram uma clara violação do princípio da imparcialidade. 18. É ainda merecedor de forte censura que o planeamento municipal previsto para os terrenos da Feira Popular – parte dos quais nem estão abrangidos pela permuta e ficarão para o Município – tenha sido confiado sem concurso, nem qualquer justificação, a um gabinete privado de arquitectos, que não se explica como apareceu neste processo. 19. Por outro lado, quanto à venda em hasta pública de um lote com uma área de construção prevista de 59 000 m2 (que é a parte que ficaria para o Município) – a admitir-se –, a melhor prossecução do interesse público também aconselharia uma venda autónoma de cada um dos blocos previstos (15 blocos), em vez de uma única venda de um lote com 15 blocos, o que, em condições normais de mercado, permitiria obter uma receita significativamente superior àquela que assim pode ser obtida. 20. Optando pela venda apressada de um único lote, o valor base de licitação é de 56 milhões de euros, a que muito poucos grupos económicos podem chegar, diminuindo a concorrência num sector em que há médios construtores que, em condições normais de mercado, facilmente se abalançariam à aquisição de um dos 15 blocos em causa, mas dificilmente terão capacidade para se lançarem na aquisição do lote que agrega esses 15 blocos. 21. Também por aí a opção do actual executivo camarário se revela ruinosa. 22. Finalmente, a permuta realizada não respeitou o dever de comunicação ao IPPAR previsto no art.º 36 nº 1 da Lei nº 107/2001, nem o direito de preferência do Estado previsto no art.º 37 nº 1 da mesma lei, considerando que abrange prédios classificados, ou em vias de classificação, ou abrangidos por perímetros de protecção de áreas classificadas ou em vias de classificação. 23. E essa omissão deveria até ter impedido a celebração da escritura de permuta nos termos do art.º 38 nº 1 daquela lei. 24. A outro nível, é verdadeiramente inexplicável que se pretenda negociar um contrato com o Arquitecto Frank Gehry com base num pressuposto de edificabilidade que não está garantido e, ainda por cima, “às escondidas” dos órgãos municipais, particularmente da Assembleia Municipal, que há meses que aguarda que lhe sejam remetidos os acordos celebrados com aquele arquitecto. 25. A minha proposta é muito simples: a) Expropriar o Parque Mayer pelo seu justo valor; b) Fazer os planos de pormenor para a Avª da Liberdade e sua zona envolvente e para a área da Feira Popular; c) Desenvolver uma área consolidada de edifícios de utilização colectiva no Parque Mayer, que integre os seus edifícios históricos e estabeleça uma ligação harmoniosa com o Jardim Botânico e com a Avª da Liberdade; d) Rentabilizar os terrenos da Feira Popular em benefício do Município de Lisboa, mas respeitando os condicionamentos do eixo terciário das avenidas; e) Abrir concurso público para uma proposta de loteamento dos terrenos da Feira Popular; f) Abrir um concurso de ideias para definir a localização da nova Feira Popular, salvaguardando os legítimos interesses dos feirantes, que devem ser justamente indemnizados. Lisboa, 14 de Julho de 2005

A candidatura de José Sá Fernandes

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