A crise avança

RIO DE JANEIRO. O presidente do PT, José Genoíno, foi desmentido grosseiramente sobre o fato de o empresário Marcos Valério, dono das agências de publicidade DNA Propaganda e SMP&B, ser avalista do PT em uma dívida no Banco de Minas Gerais (BMG). Valério, que também ficou em profunda contradição, tem 144 milhões de reais em contratos com o governo, que chegaria a 400 milhões de reais, a longo prazo. Delúbio Soares, tesoureiro do PT (e da campanha de 2002), e o próprio Genoino também aparecem como avalistas, revela a revista VEJA (ed. 1912, 6/7/2005) ao citar documentos do Banco Central.

Valério disse no sábado (2/7) por meio de advogados que não vai comentar as denúncias porque houve um desrespeito à lei do sigilo bancário. Antes, entretanto, em entrevista ao Jornal Nacional desta semana, disponibilizou seus sigilos bancário e fiscal, e depois chorou por conta da "perseguição da imprensa" que disse estar sofrendo. Uma contradição absolutamente inacreditável, apesar da suposta ilegalidade cometida pela revista. Genoino preferiu pôr a culpa na 'falta de comunicação': disse que assinou o contrato para o empréstimo de R$ 2,4 milhões com o BMG sem ler e sem discutir com Delúbio. Falou ainda que isso é comum entre os presidentes do PT.

Nova denúncia atinge campanha de 2002

E tem mais "bomba", e das sérias. Desta vez vindo da revista ÉPOCA que sai também no sábado. A reportagem mostra que alguns dias antes das eleições de 2002, quando o cenário era amplamente conhecido – Lula tinha quase o dobro das intenções de voto, seja qual for a fonte –, duas empresas de propriedade de Antonio Augusto Morato Leite Filho doaram 800 mil reais ao caixa do PT e conseguiu, até o fim de 2003, contratos com os Correios que alcançam a cifra de 104 milhões de reais – 130 vezes o valor doado. O Ministério Público entra nessa semana, afirma ÉPOCA, com uma ação contra Antonio por fraudes nestes contratos. Além do MP, estão atrás dele a CPI dos Correios, a Polícia Federal e até a Comissão de Sindicância da Câmara.

A revista ÉPOCA deixa no ar a relação doação/contratos, mas evidentemente que há interesse público na publicação dessa possível conexão. Principalmente porque Antonio Augusto foi ouvido por ÉPOCA e deu duas explicações, como conta o repórter Andrei Meireles: "Primeiro disse que participou de um jantar de empresários com o candidato petista e, impressionado com o carisma de Lula, decidiu dar o dinheiro em cima da hora. Depois, admitiu que não poderia 'ficar de fora' quando já estava definido de quem seria o futuro governo do país" (ed. 372, de 4/7/2005).

As empresas de Antonio – Promodal e Tecnocargo – constituíram a terceira maior doação para a campanha de Lula em 2002. Por meio de um contrato de 21/7/2000, as empresas de Antonio dividiriam os contratos dos Correios meio a meio com a Skymaster, caso uma destas ganhasse as licitações. Documentos mostram que a parceria feria claramente a transparência nas licitações da estatal e a Skymaster é, hoje, alvo de investigações.

"Quem estiver sujo vai dançar"

As páginas de ÉPOCA continuam, fartas de muita informação, sobre diversos temas ligados à corrupção, e dá a muitos o que faltava até agora: mais fatos concretos do que denúncias oriundas de depoimentos. Existindo ou não um projeto de direita interessado em romper a institucionalidade da nossa democracia – seja de que forma for, em que nível for –, certamente que não temos exatamente nos dirigentes do Partido dos Trabalhadores (PT) um referencial ético, pelo menos não nos dias atuais.

"Não podemos enfrentar este problema como uma tese de conspiração, ainda que haja, junto com o sentimento de indignação, tentativas de faturamento político sobre o assunto", afirmou o assessor especial da Presidência da República para Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, durante o 12.º Foro de São Paulo, que reúne partidos e entidades de esquerda da América Latina e Caribe. "Estou tranqüilo porque as instituições vão saber desempenhar seus papéis. Quem estiver sujo, do lado de lá ou de cá, vai dançar".

Infantil, no entanto, é imaginar que temos na oposição do PFL e do PSDB um referencial. Com o cuidade de não generalizar parlamentares, estes e outros partidos tradicionais fazem parte da 'sujeira' antiga, e se juntam aos novos 'companheiros' oriundos do governo 'de esquerda'. Se o PT se esquivar de sua responsabilidade por distribuir os cargos, no tal "governo de coalizão" que busca o "pacto social", complica mais ainda seu lado. É como dizer: "A corrupção está aí, é antiga, e há pouco o que podemos fazer em quatro anos para barrá-la". Faz sentido, mas não quando o discurso anterior era o de que "este governo não rouba e não deixa roubar". Absolutamente contraditório. A reação do governo e do PT virá. Tudo o que se espera é que seja profunda e estrutural.

Reações diversas

O partido está alerta. Reune-se na terça (5/7) em São Paulo, para discutir a crise. O deputado Arlindo Chinaglia (SP) estranhou as denúncias. Quer explicações. O senador Eduardo Suplicy (SP) foi talvez o mais enfático: defendeu uma acareação entre Genoino e Valério e disse estar "muito triste e decepcionado" com as denúncias e "pretende manifestar ainda hoje [2/7] sua preocupação ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva". Isso após Genoino afirmar que acareação "lembra a ditadura", mas que se for convocado está disposto a ir.

Ao mesmo tempo em que habita em vários petistas a ponderação e a dúvida, predomina entre alguns dirigentes do campo majoritário a arrogância. Enquanto o deputado federal Chico Alencar (PT-RJ) dava entrevista criticando dirigentes do seu partido que teriam lhe pedido para "pegar leve" no depoimento de testemunhas da CPI dos Correios, o representante do Ministério da Educação no Rio, William Campos, interrompeu os jornalistas para que ouvissem representantes da tendência interna Articulação (maioria). "Vou interpelar ele (Alencar) para que diga quem são esses dirigentes. Deputado é profissão de segunda classe, o Chico Alencar só quer aparecer. Quero ver ele governar", disse Campos, conforme a Agência Estado.

Na tevê

Neste domingo (3/7), o programa Canal Livre, da TV Bandeirantes, entrevista Roberto Jefferson, às 22h. Já o Roda Viva, que vai ao ar na segunda (4/7) às 22h30 na TV Cultura, entrevistará José Genoino.

Gustavo Barreto www.consciencia.net

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