PCP sobre medidas do governo

1. As medidas do Governo PS para combater o défice das contas públicas

Uma bem encenada peça «dramática» da culpa, mais uma vez a morrer solteira, de preparação mediática do anúncio de novos sacrifícios e penalizações para os mesmos de sempre – trabalhadores, reformados, pequenos empresários – para pretensamente responder a um «surpreendente» défice de 6,83%, foi ontem concluída na Assembleia da República pelo primeiro-ministro. Descontadas as intenções e juras, o Governo PS anunciou a repetição das receitas e soluções neoliberais dos governos do PSD/CDS-PP e dos governos PS de António Guterres, que são a causa da crise e do agravamento da situação económica e da degradação das finanças públicas. Seria difícil descobrir as diferenças!

Num rol extenso de medidas em dois objectivos centrais:

O aumento de impostos indirectos – IVA, imposto sobre os combustíveis e o tabaco. Um novo, violento e injusto ataque aos trabalhadores da administração pública – congelamento das progressões na carreira e de suplementos remuneratórios, aumento da idade da reforma para os 65 anos e retirada de direitos na protecção à doença, inclusive no pagamento das baixas, reduzindo o seu valor para 65%. Isto não estava no programa eleitoral do PS! Sublinhe-se que as receitas de fundo agora repostas pelo PS não têm qualquer originalidade. São uma complementaridade de políticas e medidas de direita!

Recorde-se que o governo de Durão Barroso, após a dramatização e depois do discurso da tanga, como primeira medida de combate ao défice, também aumentou o IVA, e depois congelou os vencimentos da função pública e impôs, para além dos 36 anos de serviço o critério dos 60 anos para o acesso do direito à reforma. A «novidade PS» é que as decisões gravosas que agora anunciou aparecem bem «embrulhadas» por um conjunto de propostas para o combate à evasão e fraude fiscais, e moralização do exercício de altos cargos públicos há muito reclamados e avançados na Assembleia da República pelo PCP, e sempre negados pelo PS e PSD. Os portugueses já têm a dolorosa experiência da diferença entre o discurso, a promessa e a prática política!

A prová-lo está que, enquanto o aumento de impostos e redução de direitos dos trabalhadores da administração pública entrarão em vigor imediatamente (após a aprovação de um orçamento rectificativo), as referidas propostas não passam, para já, de um enunciado de boas intenções remetidas “lá mais para o inverno”.

2. As medidas apontadas são politicamente inaceitáveis, socialmente injustas e economicamente desastrosas

São inaceitáveis porque significam, mais uma vez, que um partido faz promessas eleitorais para ganhar votos e uma vez no governo nega-as, frustrando as expectativas dos eleitores que nele acreditaram. A encenação de sempre que o PS agora faz, face ao valor indicado do défice, não é verdadeira nem sincera. Toda a gente sabia – disse-o o PCP durante o debate do Orçamento do Estado, disse o líder do Grupo Parlamentar do PS na mesma ocasião, disse-o o Governador do Banco de Portugal em Janeiro –, que os números e previsões do OE apresentados pelo governo de Santana Lopes eram completamente irrealistas. Sabíamos do vício “dos orçamentos virtuosos e da contabilidade criativa” que nem sequer é uma originalidade portuguesa!

São socialmente injustas, porque agravam as injustiças do sistema fiscal português, ao aumentar o peso dos impostos indirectos – os que fazem pagar a mesma taxa de imposto ao rico e ao pobre. Só que, aos mais pobres e remediados, dói mais! Portugal é já dos países da União Europeia em que o desequilíbrio de impostos directos/impostos indirectos é maior.

São injustos ainda, porque atingem fundamentalmente os trabalhadores por conta de outrem e os reformados, e particularmente todos os assalariados do Estado.

E é particularmente chocante, que um dos partidos responsáveis, nos últimos anos, pela precarização, pelos recibos verdes, pela política salarial que alargou as diferenças de estatuto laboral entre os trabalhadores portugueses, fazendo do leque salarial português dos maiores da União Europeia, venha agora reclamar a aproximação, através de um nivelamento por baixo, do estatuto dos trabalhadores da administração pública aos dos outros trabalhadores, em nome de um combate a pretensos privilégios daqueles! É espantoso que, mais uma vez, os principais responsáveis (PS, PSD e CDS) pelo mau funcionamento e gestão da administração pública e serviços públicos procurem fazer dos seus trabalhadores os bodes expiatórios da sua má governação e opções políticas na gestão do Estado.

As medidas anunciadas são um desastre económico porque juntam mais crise à crise, reduzindo o mercado interno através do ataque ao poder de compra da população e agravando os custos das empresas, em particular através de uma maior factura energética. As consequências inevitáveis serão mais falências e encerramentos, mais desemprego, menos receitas fiscais, mais défice, mais dívida pública.

3. Não estamos perante uma inevitabilidade! Há outras opções e soluções para fazer crescer a receita e conter a despesa pública

Como várias vezes tem proposto o PCP, é possível e decisivo fazer crescer as receitas fiscais, sem mexer nas taxas hoje aplicadas, através do alargamento da base tributária e do combate à fraude e à evasão fiscais. Fazendo pagar impostos a quem hoje não paga ou foge legalmente ao pagamento, através do planeamento fiscal. Fazendo pagar impostos aos que fogem ilegal e fraudulentamente às suas obrigações fiscais. Não é um acto corajoso fazer pagar o preço das dificuldades aos mesmos do costume. Acto corajoso era tocar nos intocáveis, no capital financeiro, nos grandes grupos económicos.

Nós defendemos, entre outras, as medidas para a reposição da tributação efectiva e socialmente justa das mais-valias, impondo, em sede de IRS, o princípio do englobamento das mais-valias relativas a partes sociais e outros valores mobiliários, e no que concerne às SPGS (sociedades gestoras de participações sociais) instituindo um sistema efectivo de tributação das mais-valias obtidas; o aprofundamento do regime de tributação das empresas financeiras, aproximando as suas taxas de IRC da taxa nominal (25%); estabelecendo um quadro claro e restritivo das relações das instituições de crédito residentes com as suas sucursais instaladas em «zonas francas»; a revisão do regime de reporte de prejuízos em sede de IRC, visando impedir o planeamento fiscal ilícito; a revisão drástica dos privilégios ilegítimos concedidos às zonas francas (off-shores), nomeadamente às operações e instituições financeiras e às sociedades gestoras de participações sociais, tendo por meta a sua completa abolição (só aí o Estado poderia arrecadar 4 mil milhões de euros!); a reforma dos impostos sobre o património, com a criação de um imposto geral sobre o património mobiliário e imobiliário; a tributação das operações de venda de títulos em Bolsa ou fora dela, e bem assim das operações cambiais não suportadas em transacções comerciais; o reforço efectivo do combate à fraude e evasão fiscais.

Para o PCP, o combate ao desequilíbrio das contas públicas exige uma intervenção privilegiada e decidida do lado das receitas, o que não significa abandonar uma intervenção persistente do lado das despesas. Para o que temos proposto um permanente rigor e disciplina na realização das despesas públicas e um aumento da eficiência das administrações públicas. Rigor, disciplina e eficiência nas despesas públicas, o que não é sinónimo de redução da despesa global. O peso global da despesa em percentagem do PIB é inferior à média dos países da área euro e está largamente abaixo da registada nos países nórdicos. A opção pela redução drástica da despesa, que domina o discurso e a prática da direita e do centro do espectro político, tem um suporte de natureza essencialmente política, visando criar as condições que conduzam à «inevitabilidade» de conter ou congelar os salários na administração pública e de promover a mercantilização, a privatização dos serviços e funções públicas, com particular enfoque nos sistemas de saúde e da segurança social.

Há muito que propomos o fim do laxismo nas dotações de despesas não essenciais, desnecessárias e injustificáveis; o combate à multiplicação de instituições e serviços públicos com funções sobrepostas; a imposição rigorosa de transparência na concessão de auxílios públicos a interesses privados; a restrição nas despesas nos gabinetes dos membros do governo; o reforço do controlo e promoção da racionalização financeira dos serviços da administração pública, incluindo os serviços e fundos autónomos.

Como medidas concretas imediatas propomos o fim da publicidade institucional não obrigatória; a redução dos custos com o software nos serviços do Estado (o Linux) em vez do pagamento de verbas avultadas à Microsoft; o por termo às derrapagens de milhões e milhões de euros nas obras públicas e às despesas excessivas com a contratação exterior de serviços, estudos e pareceres com o desaproveitamento da própria administração pública.

4. Mas o défice orçamental (e a dimensão da dívida pública) não é a questão central da nação. É um problema mas não é o problema crucial. Os problemas centrais do País são o crescimento económico, o desenvolvimento sustentado, a defesa e expansão dos sectores produtivos e o combate ao desemprego.

Temo-lo dito e reafirmamo-lo: não há saída para os nossos problemas nacionais persistindo nas mesmas políticas que têm engordado o grande capital financeiro e os grandes grupos económicos que medraram à sombra das privatizações e dos negócios especulativos ou protegidos da concorrência externa sem qualquer vantagem, sem arriscarem um tostão para o desenvolvimento da economia portuguesa, para o emprego e para a qualidade de vida das populações que pagam cada vez mais caro os diversos serviços espoliados ao sector público. A crise e o pagamento da factura foi para a maioria mas não foi para todos!

A grande questão com a qual o país está confrontado é a do crescimento económico que passa pela valorização da produção e do aparelho produtivo nacional, como o ilustra o caso do sector têxtil, a exigir medidas urgentes de apoio à sua modernização e defesa. O que exige um significativo investimento público, nas funções sociais do Estado (educação, saúde e segurança social) na concretização de infra-estruturas públicas e uma política de combate decidido aos défices estruturais da economia portuguesa: na produção de bens materiais transaccionáveis, e em particular agro-alimentar, energético, tecnológico e na estrutura de transportes e logística.

Um défice combatido no essencial pelo ângulo da despesa e pelo corte no consumo é meio caminho andado para afundar a economia em nova depressão e prolongá-la por muito tempo.

E cujo resultado final, como a história recente dos défices demonstra, será um novo défice e nova dívida pública, ainda mais agravados! O Governo PS parece que não retirou nenhuma lição nem ensinamento do passado!

Estaremos nós perante uma fatalidade ou má sorte?

5. O PCP considera que este caminho não é inevitável e apela à mobilização dos trabalhadores, em particular dos trabalhadores da função pública, e das populações para que respondam a esta nova e mais gravosa ofensiva contra os seus legítimos interesses e direitos. Que se juntem ao PCP na luta por um rumo diferente na política nacional!

Um grande esclarecimento dos portugueses é necessário para evitar que se confundam as decisões do Governo PS com uma «política de esquerda», e para contrariar a ideia de que não há alternativa a esta política que não seja a política de direita (à moda do PS ou do PSD/CDS-PP).

Há outros caminhos e outras alternativas, inclusive para o equilíbrio das contas públicas, libertos das orientações monetaristas do Pacto de Estabilidade e do Banco Central Europeu, e que o projecto da denominada “Constituição Europeia” pretende institucionalizar.

Neste sentido, sob o lema “Basta de sacrifícios para os mesmos”, o PCP vai desencadear uma campanha de esclarecimento entre os dias 2 e 5 de Junho, com a distribuição de documentos e a realização de uma série de comícios, em vários pontos do País.

O PCP apela ainda à participação na manifestação da administração pública, promovida pela Frente Comum dos Sindicatos e marcada para 17 de Junho, e à Jornada de Luta anunciada pela CGTP, para 28 de Junho.

O PCP interpreta a mensagem e a opção da maioria do povo português nas eleições legislativas. É preciso uma mudança a sério. É preciso assumir a ruptura com a política do passado e encetar uma política alternativa capaz de promover o progresso, a justiça social e o desenvolvimento de Portugal!

26 de Maio de 2005 Partido Comunista Português

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