Bois, bezerros, vacas e... seres humanos

"Não há como comparar este ato (a destruição da Casa Grande) com a violência dos assassinatos. Neste conflito, só há mortes de um lado".

Ele argumenta o óbvio: os assassinatos foram algo absolutamente mais terrível, apesar de toda a grande mídia se negar em minimamente descrevê-los.

O jornal O GLOBO desse domingo (19/12/2004), que será reproduzido pela TV Globo e suas centenas de afiliadas e máquinas humanas de jornalismo, prefere estampar em suas páginas: "MST destrói e queima fazenda em Pernambuco".

Depois, a repórter se encarrega de contar com detalhes os "requintes de crueldade" do MST: "Enquanto um grupo trabalhava na destruição da casa, outro matava os dois bois no curral, a marretadas. Quando os bois foram mortos, os sem-terra descobriram que se tratava na verdade de um boi e uma vaca, e que esta estava prenhe. Depois, sacrificaram também o bezerro, que ainda se mexia dentro da placenta. Foram necessárias 25 pessoas para carregar os bois mortos até o caminhão."

Eis a descrição de O GLOBO sobre os sem-terra: "Foram mortos no sítio vizinho por três homens encapuzados."

Eis uma descrição de quem respeita a vida não só de bezerros, bois e vacas, mas também de seres humanos que lutavam por justiça: "Na noite de quarta, dois pistoleiros teriam invadido a casa de Josuel e arrastado o agricultor para fora, torturado e disparado dois tiros. (...) Segundo testemunhas, os agricultores, que eram irmãos, foram mortos por dois pistoleiros encapuzados na frente de seus familiares." (Agência Carta Maior)

Esta agência também ouviu DE FATO o MST e suas razões: "A Casa estava vazia, ninguém morava lá. Destruímos a Casa Grande (sede da fazenda e residência do latifundiário) porque é o símbolo da violência do latifúndio que escraviza os trabalhadores brasileiros há 500 anos", explica Jaime Amorim, da coordenação estadual do MST em Pernambuco."

Agora presta atenção na descrição de O GLOBO: "O quebra-quebra ocorreu cerca de três horas antes do enterro de dois sem-terra assassinados na véspera. Edeilson Rocha, de 36 anos, e Francisco Lima, de 28 anos, estavam acampados na Fazenda Recreio e vinham sendo ameaçados desde novembro. Foram mortos no sítio vizinho por três homens encapuzados. O MST responsabilizou o dono da fazenda. Os sem-terra usaram foices, porretes, marretas e enxadas. Também mataram dois bois a marretadas e mandaram a carne para os acampamentos da região. A destruição foi comandada pelo coordenador do MST em Pernambuco, Jaime Amorim, que classificou a manifestação como “uma forma de rebeldia e desobediência civil” em represália aos proprietários da fazenda."

E, por fim, é preciso DE TODAS AS FORMAS esconder esta informação: "O Estado, que tem cerca de 200 acampamentos do Movimento (somando por volta de 24 mil famílias), foi um dos mais negligenciados pelo processo de reforma agrária este ano. De acordo com os dados cadastrais do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que tinha como meta de 2004 assentar 8,8 mil famílias de trabalhadores rurais no Estado, nenhuma área foi desapropriada no este ano. A superintendência do órgão no Estado também reconhece que as vistorias das áreas para assentamento são lentas, sendo algumas esperam a visita do Incra há mais de seis anos." (Da mesma Agência Carta Maior)

Depois da intensa lavagem cerebral via TV, rádio e meios impressos, as mesmas pessoas escreverão que "brasileiro não sabe votar", que "não se interessa por política" e que "o MST é uma ameaça à democracia". Se talvez — e apenas talvez — tratassem bois, bezerros, vacas e seres humanos em pé de igualdade, estaríamos um pouco melhor.

Gustavo Barreto, 19 de dezembro, 2004

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