Lula e Bush discutem prazo da Alca

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, decidiram concluir as negociações para a criação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) até janeiro de 2005 — dentro do prazo previsto, mesmo com todos os impasses envolvidos, como na área agrícola e em compras governamentais, informou a Agência Brasil. Brasil e EUA dividem o comando das negociações.

Lula, no entanto, enfatizou que o Brasil não deseja ter sua economia massacrada pelos países desenvolvidos. “Em discussões bilaterais entre dois países, não pode prevalecer interesses comerciais de nenhuma corporação, ou de nenhum setor econômico. É preciso prevalecer os interesses das duas nações. E eu estou convencido de que nós temos condições de quebrar todas as barreiras que existem, primeiro se tivermos paciência, segundo se tivermos perseverança”, afirmou.

Contrariando as expectativas iniciais, a criação da Alca não foi a pauta principal do encontro, segundo Lula. Ele disse que os dois discutiram o tema, mas detalhes técnicos, como o fim dos subsídios aos produtos norte-americanos, foram mencionados de forma superficial.

“Não foi um encontro para fazer negociações, os temas da Alca foram apenas mencionados de maneira geral. Mas os dois países têm muita importância na Alca”, disse o ministro Celso Amorim (Relações Exteriores). Segundo ele, os dois chefes de Estado concordaram sobre a necessidade de liberalização comercial para que ambos os países possam se desenvolver.

Lula embarcou ontem à noite em Washington, com chegada ao Brasil prevista para a manhã deste sábado. Segundo o porta-voz da Presidência, André Singer, Lula ficou muito feliz com a reunião com Bush, não somente pelo “ambiente acolhedor” na Casa Branca, mas também pela série de encontros que manteve na embaixada brasileira com autoridades.

Apoio aos países pobres

Durante o encontro, o presidente Lula enfatizou também a necessidade de os países desenvolvidos olharem com carinho para as economias menos valorizadas, para que as nações mais pobres voltem a crescer.

"Cabe ao país que seja grande, que tenha a economia mais forte, ter generosidade no trato com parceiros mais frágeis", disse Lula, lembrando uma analogia com uma luta de boxe: "O boxeador que nocauteia o outro é que tem que ter a humildade de abraçar o que está caído. Na relação política é a mesma coisa: aqueles que são mais fortes na economia, que tem mais força política, é que precisam ter generosidade com os mais frágeis, para que todos tenham oportunidade".

Lula defendeu ainda a maior integração física do continente americano como forma de promover o desenvolvimento da região. “Até porque quanto mais crescer a economia brasileira, a economia argentina, da Venezuela, mais consumidores teremos não só para nossos produtos, mas também de outros países”, disse.

Ele ressaltou que o Brasil não vai mais manter a postura de esperar outros países o procurarem para negociações. “Não temos que esperar que alguém nos procure. Nós vamos procurar”, disse. A intenção do presidente é firmar parcerias com países como a Índia, China e a própria América do Sul.

Lula destacou o convite recebido para participar na semana que vem na Colômbia da reunião de países do Pacto Andino. Pela primeira vez na história, segundo ele, os países andinos vão abrir as portas para a presença de um presidente estrangeiro.

Bom-humor

Depois do encontro de quase três horas com o presidente norte-americano, Lula reagiu com bom-humor ao ser questionado se tinha gostado pessoalmente de seu colega norte-americano. “Eu gosto mesmo é da dona Marisa Letícia Lula da Silva”, disse o presidente, arrancando risos dos jornalistas e funcionários da embaixada do Brasil que acompanharam a entrevista na qual fez um balanço do encontro.

Segundo Lula, o fato de os dois presidentes serem pessoas “com pensamentos ideológicos diferentes” isso não impede que mantenham uma relação civilizada em questões de interesse dos dois países. “Sabemos a importância dos Estados Unidos, de investidores norte-americanos no Brasil, e queremos tratar isso com muito carinho. Da mesma forma que acredito que o presidente Bush esteja vendo no Brasil um parceiro importante”, destacou.

Lula afirmou que a relação com o presidente norte-americano não é pessoal, mas de chefes de Estado. “Estou convencido de que nós temos a chance de fazer a mais perfeita relação Brasil-Estados Unidos”, afirmou.

“Eu acredito nas relações humanas. Se dois seres humanos forem sinceros, a relação pode ser muito positiva”, enfatizou Lula. A “química” com Bush, segundo Lula, é algo que ele não pode medir. “Acho que precisaríamos perguntar a um analista. Essa coisa de química não entendo bem”, brincou o presidente.

Paz mundial

Para Lula, o momento mais marcante do encontro com Bush foi a discussão sobre a busca da paz no mundo. “O Brasil pode e deve ter papel importante na América do Sul. Mas não se consegue papel importante só com palavras. É preciso recuperar o tempo perdido e pensar um modelo de desenvolvimento para a América do Sul”, disse.

Lula aproveitou o encontro na Casa Branca para afirmar a Bush que o Brasil pleiteia uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas). “Acho que ele vai fazer uma reflexão porque temos o apoio de muita gente no mundo, de toda a América Latina”, ressaltou o presidente.

Ele disse ainda que cobrou de Bush mudanças na ONU, afirmando que o Brasil tem todo interesse em mudanças na organização internacional, especialmente após a guerra entre os Estados Unidos e o Iraque.

Lula foi o primeiro chefe de Estado que não apoiou os EUA na guerra a ser recebido por Bush. Segundo Lula, o Brasil teve a sua posição com relação ao conflito no Iraque e os Estados Unidos teve a dele, mas cada um respeita a posição do outro.

“Sempre haverá temas que são motivo de discordância. E nós precisamos ter inteligência e competência para fazer com que a gente discuta as coisas em que concordamos. Eu não vim aqui para discutir o Iraque, eu vim aqui para discutir relação Brasil–EUA”, afirmou. “E a democracia continua acontecendo nas nossas relações.”

Histórico

O ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, classificou como “histórico” o encontro de Lula e Bush. Segundo o ministro, o clima entre os dois chefes de Estado foi de franqueza, e os problemas foram colocados com bastante clareza e objetividade. “Acredito que se estabeleceu com essa visita uma nova etapa nas relações Brasil-EUA. Nós vamos tratar é das convergências: mais comércio, mais investimentos”, enfatizou.

Questionado se foi fácil para Lula negociar com um presidente com pensamento tão distinto do seu, Dirceu disse que sim, porque o presidente está buscando as convergências e “concordando nas discordâncias”. Além disso, segundo o ministro, os assuntos que fazem parte das divergências entre os dois países não estavam na pauta da agenda.

Além de Celso Amorim e José Dirceu, acompanharam o presidente os ministros Antônio Palocci (Fazenda), Luiz Fernando Furlan (Desenvolvimento), Roberto Rodrigues (Agricultura), Dilma Rousseff (Minas e Energia), Marina Silva (Meio Ambiente), Humberto Costa (Saúde), Jaques Wagner (Trabalho) e Roberto Amaral (Ciência e Tecnologia).

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