Opinião: Informalidade e Corrupção

O sentimento de frustração que invade todos os que têm a sensação de que o Estado desapareceu caminha junto com a perplexidade com que se constata a absoluta inocuidade das leis que regem, ou melhor, deveriam reger, a conduta dos cidadãos. Se as leis vigentes são falhas, o Estado parece de faz-de-conta, embora os impostos que quase todos pagam sejam reais e pesados.

Dois senadores em apuros apresentam explicações surreais para se defenderem das acusações, as pessoas têm sua paciência testada à exaustão e fica tudo por isso mesmo. Invoca-se o direito aos sigilos bancário, das telecomunicações e fiscal como se fossem sacrossantos e se acusam os policiais federais de abusarem da escuta legal. O protesto dos ofendidos segue a linha de sempre, uma hora é contra a imprensa, outra, como agora, é dirigido à Polícia e ao Judiciário, de cujos integrantes se diz concederem mandados genéricos de busca e escuta.

Com tantos indícios, ante esse quadro tenebroso de investigadores tão ou mais suspeitos que os averiguados, as pessoas percebem facilmente que a legislação foi feita sob medida para garantir certas exceções, que, aliás, são comuns e recorrentes.

O sigilo patrimonial não é um direito absoluto, nunca foi: informações sobre o patrimônio e as finanças pessoais são partilhadas com o fisco na declaração anual do Imposto de Renda e não há notícias de abusos cometidos pelos responsáveis pelo resguardo dessas informações. Todavia, sem acesso automático aos detalhes da movimentação bancária de pessoas e empresas, a Receita Federal do Brasil não tem como saber se saldos, aplicações financeiras e “recursos não contabilizados” foram ocultados.

A obrigação legal de instituições financeiras informarem a movimentação de grandes somas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) nem sempre é obedecida, e eventualmente saques milionários só são descobertos por acaso. Quer dizer, a lei só é obedecida quando o guarda está de olho. E quem garante que cartórios, imobiliárias e outros cumprem a obrigação de enviar à Receita Federal do Brasil informações sobre transações com imóveis, nem sempre muito úteis, haja vista a prática disseminada de passar escrituras por valores abaixo dos efetivamente negociados?

Restringir os valores dos saques em dinheiro, como pretende fazer a Itália, o paraíso europeu da sonegação, seria uma boa medida a ser adotada por aqui contra essa gente que transporta altas somas em malas e cuecas. Não há, hoje em dia, justificativa para o manuseio de grandes quantias em dinheiro, especialmente por pessoas físicas. Todo pagamento de salário ou honorários pode ser creditado em contas-correntes ou de poupança. Nosso sistema bancário é ultramoderno, através dele é possível fazer transferências instantâneas com efeito de dinheiro vivo para qualquer parte do País.

Só pode ser contra a formalidade e o fim do sigilo bancário – exclusivamente para a Receita Federal do Brasil - quem tem conduta duvidosa. Pergunte-se à maioria das pessoas, a todos os que têm seus salários tributados na fonte, se elas se importam em que o governo conheça sua movimentação bancária.

Os ralos por onde escorre o dinheiro da corrupção são grandes e variados, é preciso estreitá-los, e a maneira pode ser essa, mais formalidade, simplesmente tornando transparentes para o fisco as contas bancárias e restringindo-se a movimentação de dinheiro em espécie.

Não é difícil concluir que as leis brasileiras protegem pouca gente além do razoável – foro privilegiado, prisão especial para quem tem curso superior, imunidade parlamentar – e deixam o Estado, que em última instância é o bem comum, à mercê de seus incontáveis predadores.

Luiz Leitão

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