Desindustrialização: riscos

Mauro Lourenço Dias (*)

Pelo segundo ano consecutivo, a China deverá ocupar o posto de principal país comprador de produtos brasileiros, desbancando os EUA, que eram até 2008 o principal parceiro. A se levar em conta os números do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), até o final do ano, a China deverá comprar do Brasil US$ 8 bilhões, enquanto os EUA importarão US$ 5 bilhões em itens nacionais.

Entre os destaques das vendas aos asiáticos, estão principalmente a soja em geral, petróleo bruto, celular, aviões e minério de ferro. Em contrapartida, o Brasil vem importando da China máquinas e equipamentos e muitos produtos de baixa qualidade que entram por meio de um recurso nada ético, que até agora não foi combatido porque a burocracia brasileira, ainda que tenha constatado a irregularidade, demora para reagir.

O esquema é simples: para burlar as leis antidumping, os chineses recorrem a outros países que funcionam como fornecedores do Brasil. Entre esses países, estão a Malásia, Tailândia e Indonésia, que, se até 2009 não figuravam como grandes exportadores de manufaturados, neste ano passaram a apresentar aumento significativo em suas exportações para o Brasil. É a chamada triangulação que se aproveita de falhas na legislação brasileira para fazer entrar no País produtos com preços artificiais, que acabam solapando a produção nacional.

Essas práticas lesivas, obviamente, precisam ser combatidas. E isso não pode ser tomado como protecionismo. É, antes, uma legítima defesa comercial, praticada tanto pelos EUA como pela União Europeia, que têm normas para evitar esse tipo de distorção até mesmo em relação a componentes para a produção final. Tais normas prevêem, inclusive, direitos compensatórios.

A par disso, a importação de bens de capital e equipamentos não constitui ameaça de desindustrialização, como argumentam alguns pregoeiros da catástrofe. De fato, a compra de máquinas de outros países deve chegar neste ano a US$ 35 bilhões, igualando ou superando um patamar histórico alcançado em 2008. Mas é preciso analisar o cenário com cuidado.

Afinal, há no País uma série de empresas que vêm anunciando investimentos em produção de bens de capital. E, para tanto, estão importando equipamentos de países asiáticos. Sem contar empresas chinesas que estão se instalando no País em parceria com sócios brasileiros: o que essas indústrias pretendem é criar linhas de montagem e nacionalizar seus equipamentos. Para isso, naturalmente, precisam importar equipamentos de seus países de origem.

Além disso, o parque industrial brasileiro está obsoleto: muitos tradicionais exportadores de manufaturados não conseguem competir com concorrentes estrangeiros não só por causa do custo Brasil – que pesa e muito –, mas por falta de maquinário moderno. Ao mesmo tempo, importadores vêm apostando numa desvalorização do real diante do dólar e tratam de adiantar importações. Seja como for, a verdade é que hoje a taxa cambial favorece compras no exterior.

Portanto, não se pode falar ainda em processo de desindustrialização, embora os riscos existam. O que falta é o empresariado do setor reagir em defesa de seus legítimos interesses, pressionando o novo governo para que tenha entre suas prioridades a reforma do sistema aduaneiro e promova um efetivo combate às barreiras internas que impedem a expansão do comércio exterior. Até porque do atual governo já não se pode esperar nada.

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(*) Mauro Lourenço Dias é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br

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