Fretes marítimos: falta bom senso

Mauro Lourenço Dias (*)

SÃO PAULO – Depois de uma fase em queda, os fretes cobrados pelos armadores de contêineres passaram a sofrer reajustes tão intensos que já começam a extrapolar as raias do bom senso. Como conseqüência da menor capacidade disponível nos navios, em razão de cortes de espaço feitos pelas companhias marítimas a fim de se adequarem à queda dos volumes motivada pela crise global, as principais linhas anunciaram, nos últimos dias, reajustes em praticamente todos os trades.

Como justificativa, os armadores alegam que foram obrigados a tomar essas medidas para fazer frente à crise e tentar arcar com os valores do transporte. Com isso, os armadores estão praticando aumentos no bunker e aplicando taxas de GRI e Peak Season. No comércio entre a Ásia e os Estados Unidos, responsável pela maior movimento comercial do mundo, os reajustes têm sido freqüentes, em função da diminuição da frota disponível. Com pouco espaço em disputa, os serviços passam a ganhar valores estratosféricos, já que os volumes começam a ficar acima da capacidade de espaço em oferta.

Tanto MSC como Maersk e Evergreen elevaram as taxas para as cargas do Mediterrâneo, da mesma maneira que MOL e NYK. A MSC anunciou aumento de US$ 200 por TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés) nos serviços entre o Sudeste asiático e o Noroeste da Europa. As linhas japonesas também aumentaram as tarifas do Oeste da Ásia e da Índia para o Mediterrâneo e Norte da Europa. Transportadoras marítimas, incluindo Maersk, CMA CGM e Hapag-Lloyd, começaram a aplicar aumentos de US$ 200 até US$ 500 por TEU este mês.

Em setembro, a Maersk, o maior armador do mundo, decidiu empreender a reestruturação nos seus serviços intra-Américas. Os maiores incrementos foram verificados nas rotas entre a América do Norte e a Costa Oeste da América do Sul, tanto na exportação como na importação -- US$ 300 para um TEU e US$ 600 para um FEU (unidade equivalente a um contêiner de 40 pés).

Os armadores argumentam que os níveis de movimentação ainda estão distantes dos patamares da época pré-crise, alegando que os fretes, na comparação com o ano passado, ainda estão de 20 a 30% mais baixos. Mas esse é só um lado da moeda porque antes não havia sequer disputa por espaço em embarcações. Hoje, se ainda não existe um problema generalizado de falta de espaço para a exportação em direção à Ásia, essa é uma hipótese a se colocar na mesa, como resultado de uma combinação explosiva que pode desorganizar o mercado: a redução de frotas e, em conseqüência, de espaço nas embarcações pode coincidir com o reaquecimento do comércio global.

No Brasil, o reaquecimento da economia e a valorização do real frente ao dólar fizeram com que as importações, sobretudo de bens duráveis e não-duráveis, voltassem a crescer. Segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC), a melhora está sendo liderada pelos países emergentes, em especial as nações do continente asiático, com a China à frente, hoje a maior nação exportadora do mundo, superando Alemanha e os Estados Unidos. Mas aqui também se pode incluir o Brasil e os demais países do Bric (Rússia e Índia).

Esse reaquecimento da economia, obviamente, começa a se refletir no transporte marítimo, o principal termômetro das trocas internacionais. A expectativa que se tem é que, em 2010, o comércio internacional volte aos patamares dos volumes do começo de 2008, mas, para isso, não se pode esperar que os fretes marítimos, a pretexto de recuperação de perdas passadas, venham a alcançar preços exorbitantes.

Nesse caso, os números que a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) projeta para este ano – de US$ 124,8 bilhões para importações (queda de 28%) e US$ 146,2 bilhões para exportações (queda de 26,1%), com saldo de US$ 21,4 bilhões – teriam de ser redimensionados para baixo. Portanto, o momento exige bom senso também por parte dos armadores.

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(*) Mauro Lourenço Dias é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br

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