Adilson Roberto Gonçalves
Vai-se o quinto mês do ano e as discussões sobre o significado do 13 de maio foram - e são - muito importantes. Especialmente para nós brancos entendermos a situação do racismo estrutural em nosso país. Na química, o equilíbrio acontece quando as velocidades das reações direta e inversa se igualam. É fruto da termodinâmica e do tempo. Mesmo em situações quase irreversíveis, como a formação de um óxido a partir de um metal, aplicando-se energia suficiente, o equilíbrio pode ser deslocado. Socialmente, mesmo com forte reação e participação dos movimentos em defesa dos negros, a situação de violência está muito longe do equilíbrio. Transformamos bauxita (um óxido) em alumínio (um metal), mas falta-nos tecnologia social para transformar o racismo criminoso em convivência pacífica.
Além disso, a danosa pauta de costumes do desgoverno federal destrói a discussão séria sobre aborto, assédio, maioridade penal, eivada que é do discurso de ódio. A título de exemplo da falta de diálogo, há dias em que as publicações online dos jornais brasileiros passam a não aceitar comentários, mesmo de assinantes. Em um artigo sobre narrativas e discurso de ódio, tal fato aconteceu, emblemátíco, talvez antevendo o arraigado discurso de ódio entre os leitores... Um aprendizado para outras situações semelhantes, por exemplo em relação ao racismo na mídia já avaliado em artigo anterior (https://www.brasil247.com/blog/ainda-o-racismo-na-folha)
Um primeiro ponto, sobre o aborto: querem a estatização do útero, eis a política nefasta em curso. A colunista Cristina Serra, da Folha de S. Paulo, fez perfeita e necessária denúncia quando deu voz ao movimento “tire o seu rosário do meu ovário!”. Para além da rima e da conotação religiosa e mais do que não contemplar a realidade, o desgoverno atual impede o acesso ao aborto legal, como vimos com o que criminosamente fizeram em 2020 no caso da menina de dez anos estuprada. Outros articulistas têm tocado em aspectos fundamentais para tratar da questão do aborto: saúde pública, laicidade do Estado e direito da mulher a seu corpo. No entanto, o uso do termo “descriminalização” é mais adequado do que “legalização”, pois é disso que se trata: não tornar criminosos a mulher que decide abortar e os que a auxiliam na ação. Se o poder místico de um deus está acima de tudo, a opção seria individual, tal qual é a opção religiosa. Difícil que o tema prospere, ainda que em um futuro governo progressista, pois, mesmo com Dilma Rousseff na Presidência, a discussão empacou. Aborto é democracia, mas parece que no projeto de estatização do útero há dúvidas se o parlamento brasileiro tem estofo suficiente para conseguir isso.
Como segundo ponto, temos a volta da discussão sobre maioridade penal por essa turma do MBL - que se diz movimento por um Brasil livre -, que precisa ser escorraçada urgentemente da vida pública, múltiplos que são os crimes que praticam. Agora, na hora de defender os próprios abusos, como evidenciado por certos integrantes, são “meninos”. Quando é para a maioridade penal, que incidirá principalmente em pretos, pobres e periféricos (ou seja, para os outros), dizem que já se é adulto com 16 anos. Esse MBL envergonhado com a revelação de ser parte da escória que suspostamente tanto criticou coloca uma mulher em coordenação nacional. Seria apenas jogo de cena?
Por fim, sobre um caso pontual de assédio sexual, a deputada Isa Penna continua sua atuação para denunciar os criminosos na Assembleia Legislativa de São Paulo. Creio que ela teve suas razões para trocar de partido, mantendo obviamente a coerência de militar na esquerda progressista. No entanto, espero que ela saiba que nem todos os correligionários foram omissos no caso do assédio sexual que sofreu, manifestando-se ou agindo conforme suas possibilidades. No mais, continue a sua e a nossa luta no novo partido.
Adilson Roberto Gonçalves, pesquisador da Unesp, membro da Academia de Letras de Lorena, Academia Campineira de Letras e Artes e Instituto Histórico, Geográfico e Genealógico de Campinas.
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