Defesa da Pátria, defesa do führer ou sujeição ideológica?
por Pedro Augusto Pìnho
Discorrendo sobre as primeiras manifestações literárias na Grã-Bretanha, Jorge Luis Borges (Curso de Literatura Inglesa, wmfmartinsfontes, 2016) nos chama a atenção para os poemas épicos e baladas, escritos na língua saxã ou dos vikings noruegueses e dinamarqueses, que ocupavam áreas das ilhas britânicas.
A primeira, ao analisar o fragmento da "Batalha de Finnsburth", é a falta de entendimento da pátria, que Borges designa "raça", como no texto que se segue:
"Os escandinavos não tinha consciência de raça. Houve um momento na história da Inglaterra em que podia ter havido um império escandinavo. Aquele momento em que Canuto, Knut, foi rei da Inglaterra, da Dinamarca e da Noruega. Mas ele não tinha consciência de raça. Escolheu imparcialmente como governadores e como ministros saxões e dinamarqueses. A verdade é que a ideia de império era uma ideia romana, uma ideia totalmente alheia à mente germânica" (4ª aula).
A segunda ao estudar a "Balada de Maldon", batalha ocorrida em 991 d.C., onde discorre sobre o rapaz que deixa a vida cortesã para se transformar em guerreiro, e seu sacrifício pelo líder e não pelo País ou por alguma ideia, e que se lê:
"Um guerreiro está disposto a morrer, não por sua pátria, porque o conceito de pátria teria sido anacrônico então, mas por seu senhor, o alcaide, que por sua vez combatia, não pela Inglaterra, mas por seu senhor, o rei" (5ª aula).
Mas Borges nos fala também da revolução causada pelas "elegias". A introspecção que busca a descrição ou a reflexão sobre a existência individual. Não é mais o guerreiro a serviço do senhor, mas o homem que se descobre. Ao discorrer sobre a célebre elegia "Wanderer", a "Elegia do Homem Errante", escreve:
"O homem que perdeu numa batalha seu protetor, seu senhor e está procurando outro. O homem ficou fora da sociedade. Isso é muito importante numa sociedade de estratos como a da Idade Média. O homem que perdia seu protetor ficava sozinho ..... e tem como companheiro o pesar e o anseio" (6ª aula).
AUSÊNCIA DE ESTADO NACIONAL
Ninguém, de qualquer espectro político, contestaria que o Brasil vive hoje uma grave crise. A manifestação econômica é apenas a mais imediatamente sentida por provocar a falta de condições de sobrevivência.
Mas se for aprofundar a compreensão da crise, vai chegar à ausência de soberania nacional, a inexistência de um projeto de nação que oriente as decisões, que estabeleça as prioridades.
Os partidos políticos e suas lideranças caminham perdidos, como "o homem que não encontra apoio algum" do Wanderer. E não é por acaso que surgem inexpressivos e oportunistas Cabo Daciolo, João Amoêdo, José Maria Eymael com fantasias oníricas no lugar de programas. Nem que surjam as pregações totalitárias e excludentes do Capitão Bolsonaro ou da Vera Lúcia ou de Álvaro Dias.
Pergunto aos caros leitores: quem ou quais tem um projeto de País? um projeto de construção do Estado Nacional, desfigurado pelo golpe, e que não seja uma imposição arbitrária de um führer ou de uma ideologia?
E sem o Estado Nacional Brasileiro como tornar realidade qualquer proposta de melhoria de vida para o povo e, até mesmo, da garantia de riqueza para os banqueiros de Meirelles, Alckmin, Marina ou Amoêdo?
Esta situação que vivemos atualmente, de modo grave e totalitário no Brasil, também encontra similar, até bélica, na Síria, na Argentina, na Ucrânia, recentemente na Turquia, pois decorre do domínio do sistema financeiro internacional (a banca) e seus agentes midiáticos, judiciais, militares e de espionagem e golpista profissionais pelo mundo.
CANDIDATOS A PRESIDÊNCIA
Tomaremos, como exemplo, o que está no Monitor Mercantil de 14/08/2018, à página 3, com título "Propostas de Alckmin e Ciro".
Alckmin "defende um agenda de competitividade para o país. Ele observa como essencial um trabalho de desburocratização para destravar a economia, promover a abertura comercial e inserção internacional, estimular maior competitividade no setor bancário e administrar o tripé de política fiscal, cambial e monetária".
Vamos traduzir esta proposta e verificar se leva ao Estado Nacional Brasileiro. Primeiramente o que iguala e identifica o plano de dominação da banca em todo mundo: a desregulação, tirar toda restrição aos fluxos monetários de modo que o capital possa entrar e sair livremente de qualquer país, buscando seu maior lucro.
Pergunto: qual o interesse deste capital que apenas busca lucro financeiro no desenvolvimento nacional brasileiro? Nota dez para quem respondeu: nenhum.
Então sabemos o que significa "desburocratização para destravar a economia".
O sistema financeiro nacional, que é bastante forte, está apoiado em bancos estatais (Banco do Brasil e Caixa Econômica) e dois grandes bancos privados que estão vencendo a concorrência com bancos estrangeiros. O que significaria "estimular a maior competitividade no setor bancário"? Obviamente transformá-lo de nacional em estrangeiro. Aumentar as vantagens para que bancos estrangeiros venham obter maiores ganhos no Brasil, em detrimento dos bancos nacionais, públicos e privados. Em resumo, na desnacionalização da economia brasileira. E como criar um Estado Nacional Brasileiro com a economia dominada por empresas e agentes estrangeiros?
Chega a dar calafrio imaginar o que significaria "administrar o tripé fiscal, cambial e monetário". Mas temos um antecedente nos governos de seu partido. O tripé macroeconômico que constitui, além de uma excrescência econômica, o desabar da economia nacional, como ocorreu no período 1995/2002.
Para que tenhamos um Estado Nacional, o controle dos principais instrumentos da economia tem que estar nas mãos do Estado.
Veja o período que o Brasil cresceu a taxas na ordem de 10% ao ano. Não estou defendendo tortura, arbítrio, nem concentração de renda, mas observando que o câmbio era fixado pelo Governo Brasileiro e não pela ficção do câmbio flutuante. O que significa na prática, na realidade, o câmbio flutuante: que o valor da nossa moeda será decidido pelo interesse da especulação cambial internacional.
Há um caso célebre em que o especulador George Soros derrubou a libra esterlina, inglesa. Imagine o que investidores de menor porte poderão fazer com o real!
Outro ponto do tripé é a meta fiscal. Diz simplesmente que não haverá recurso público disponível para despesas que não seja o pagamento de juros, o que significa afirmar não haver saúde, educação, transporte acessível à quase totalidade dos brasileiros, que tem renda igual ou menor do que três salários mínimos, mensais.
O controle monetário nada mais é do que as estratosféricas taxas de juros. No governo tucano de FHC os juros foram 26,6% ao ano, na média dos oito anos. Com Lula, a média baixou para 13,7% a.a. e para 9,9% a.a. durante o governo Dilma.
Vemos portanto, pelos próprios projetos do candidato, que seu objetivo não é um país soberano, livre, cidadão, mais um instrumento de transferência de renda de toda uma nação para o sistema financeiro internacional. Tal qual o realizado por Temer/Meirelles e, igualmente, pois os projetos são idêntico nos conceitos apenas distintos na forma de expressar, da Marina Silva, do Álvaro Dias, do João Amoêdo e do Jair Bolsonaro.
RACIOCÍNIO BIPOLAR
Há pessoas que só conseguem raciocinar com as bipolaridades, isto é, com um sistema que apresente dois polos contrários. A guerra fria, no século passado, trabalhou com a oposição comunismo versus democracia, esquecendo que na democracia estava a ditadura de Stroessner (Paraguai), de Somoza (Nicaragua) e de Ibn Saud e descendentes (Arábia Saudita) e no comunismo a Albânia, a Iugoslávia e até o Egito de Nasser e a Indonésia de Sukarno.
Embora seja uma simplificação, com variantes de várias ordens, podemos dizer que a bipolaridade do mundo de hoje, do século XXI, está na banca, de um lado, e no desenvolvimento econômico capitalista, de outro.
A banca domina o Brasil, a Argentina, a França, a Alemanha, e o desenvolvimentismo, a China, a Rússia, a Índia, a Bolívia. Nos países dominados pela banca, as metas efetivas (por trás dos discursos farsantes e projetos tipo Alckmin) são a financeirização da economia e a permanente concentração de renda.
No desenvolvimentismo cito o projeto "Um Cinturão, uma Rota", apresentado há cinco anos pela China e que envolve centena de bilhões de dólares em projetos de transporte na Ásia, em geral, no Paquistão, em Myanmar, no Quênia, na América Central e mesmo na América do Sul, obstaculado pelos golpes da banca no Brasil e no Peru.
Se não pensamos, como os medievais britânicos, na defesa do líder, nem na submissão a ideologias, temos que, em primeiro lugar, marcar nossa inserção no mundo de hoje, não num mundo de fantasias ou paradisíacos de toda natureza.
Querem ficar no mundo banca?
Então tem-se como opção Álvaro Dias, do Podemos, Cabo Daciolo, do Patriota, Geraldo Alckmin, do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Henrique Meirelles, do Movimento Democrático Brasileiro (MDB, ex PMDB), Jair Bolsonaro, do Partido Social Liberal (PSL), João Amoêdo, do Novo, José Maria Eymael, da Democracia Cristã (DC, ex PSDC) e Marina Silva, da Rede Sustentabilidade (Rede).
Se queremos voltar para o mundo do desenvolvimentismo, dos BRICS?
Também, em ordem alfabética, teremos Ciro Gomes, do Partido Democrático Trabalhista (PDT), Guilherme Boulos, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), de João Vicente Goulart, do Partido Pátria Livre (PPL) e Lula/Haddad/Manuela, do Partido dos Trabalhadores (PT).
ANALISANDO CANDIDATOS
Não são, como é óbvio, idênticos os candidatos, como não eram democratas e comunistas, no século passado. Mas este grupamento ajuda a distinguir as principais matrizes políticas contemporâneas.
Não inclui o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU) por não ter chegado a uma conclusão se é de ultrarradicais socialistas, anarquistas ou agitadores para interesses estrangeiros.
O PT tem o projeto de criação de um estado de bem-estar social, diria ser o modelo que já existiu em países europeus, em especial nos nórdicos. Hoje a banca interfere fortemente naqueles países e muitas conquistas populares vem sendo eliminadas. Isto reforça o pensamento que a constituição do Estado Nacional soberano, forte e livre é condição primeira para qualquer projeto que não se subordine à banca, ao sistema financeiro internacional.
O PPL, com o filho do Presidente João Goulart como candidato, é o que apresenta o programa mais nacionalista. Mas, a exemplo de outros, não coloca a reforma do Estado para lhe dar musculatura suficiente ao embate com a banca. O exemplo da França parece ser muito interessante. Um país com forte tradição nacionalista, vinda de De Gaulle, com avanços sociais notáveis de governos socialistas, caiu sob domínio da banca ao eleger Emmanuel Macron. Em ano e meio, o Presidente Macron, saído do Banco Rothschild, já mostrou a quem serve: orçamentos com cortes de direitos sociais, privatizações e proposta de redução da representação eleita para Assembleia Nacional.
Este fato mostra-nos também que não podem conviver Estados Nacionais Soberanos com a mídia hegemônica, propriedade de grupos privados. Além de determinar o fim das concessões das redes de televisão comercial, familiares, por descumprimento dos deveres contratuais e por sonegação fiscal, o próximo governante deve incluir a regulamentação dos artigos 220 a 224 da Constituição de 1988, em seu programa.
Precisaria conhecer melhor o programa do PSOL. A pouca divulgação pelas mídias cria muitas suposições. O que foi divulgado é mais um diagnóstico e uma crítica aos governantes até hoje do que um projeto mais focado de um socialismo democrático.
Quanto ao PDT parece mais interessado em conquistar eleitores, venha de onde vierem, do que defender e convencer os eleitores a elegerem seu projeto de Nação. Na referida matéria do Monitor Mercantil lê-se que Ciro Gomes propõe criar, para previdência social, um regime de capitalização, o que faz alegria da banca. Também bastante coerente com os interesses da banca é "superar o déficit primário brasileiro", ao invés de realizar a auditoria da dívida ou como vem sendo denominada "auditoria cidadã da dívida".
E, contrariando o atendimento à vontade popular, temos a séria ameaça de fraude eleitoral quando o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal Eleitoral (STE) não decidem implantar o voto impresso, procuram com legislação casuística e decisões controvertidas eliminar um candidato do veredito popular.
O que queremos então? Um führer? Um estado ideológico favorável aos trilionários? Um governo plutocrata? Teocrático?
Exigir de todos candidatos, a presidente, senador, deputado federal sua definição sobre o Estado Nacional Brasileiro será fundamental para a escolha. A regulamentação da imprensa televisiva, radiofônica e a licitação em novas condições para estas mídias, outra questão fundamental, como também prioritária é a auditoria da dívida e o fim da chantagem dos déficits públicos.
Não sendo assim, por mais que se esconda em critérios metafísicos ou fora das reais opções, o caro leitor estará afundando o País, prestigiando o golpe de 2016 e transferindo as decisões nacionais ao entregá-las aos interesses egoístas e discriminadores do capital financeiro internacional, da banca.
Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado
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