As bolsas de valores vivem nova euforia, coisa normal em seu usual comportamento ciclotímico. Para ter idéia dessa esquizofrenia vejam-se as ações de empresas.
Nos EUA, o índice Dow Jones, média das ações das 30 empresas mais importantes da indústria (blue chips), estava em 12.000 pontos, em meados de 2008, mesmo com o colapso financeiro já presente. Em abril de 2009, tinha caído para 6.500 pontos, perdendo 46% do valor em menos de um ano. Em agosto de 2009, o índice registra significativa recuperação, atingindo 9.300 pontos, tendo-se elevado em 43%. Reduziu, portanto, a perda, em relação a meados de 2008, para somente 22,5%.
As ações cotadas na bolsa brasileira, BOVESPA, desvalorizaram-se em 45,5% entre agosto e novembro de 2008, ou seja, percentual semelhante ao do Dow-Jones, mas com velocidade muito maior, já que o período da comparação é menor. A recuperação é ainda mais espetacular que a de Wall Street, porquanto, de novembro de 2008 para cá, a valorização foi de 87%, e o índice atual ultrapassa o de agosto do ano passado.
Os mais iludidos pela mídia pensam que a alta das ações das empresas correlaciona-se com a melhora da economia. Isso tem sido desmentido pelos fatos. As bolsas de valores, e sobre tudo as ações, têm sido tradicionalmente os mercados para os quais os concentradores financeiros direcionam os investidores menos avisados. São, na realidade, cassinos manipulados pelos grandes operadores. Nos EUA há canal de TV exclusivo para investimentos, e o mercado com maior cobertura é o de ações. O mesmo, ocorre nos canais das grandes redes nacionais de televisão, como no Brasil.
Nos EUA e em outros mercados mundiais, a alta das ações, do petróleo e das mercadorias (commodities) decorre do que resumo a seguir.
Os grandes bancos deveriam estar falidos, em função das especulações mal-sucedidas com derivativos e demais títulos tóxicos (com os quais haviam obtido lucros enormes em cima do nada). Foram socorridos com trilhões de dólares do contribuinte, por meio do Tesouro dos EUA e do Federal Reserve. Esse banco central, como observou Mike Whitney, é o braço de política dos grandes bancos e distribuidoras de valores.
Ora, os concentradores estão aplicando boa parte do dinheiro recebido do Estado nas bolsas de valores e nas de mercadorias, prosseguindo em sua especialidade: ganhar dinheiro com a manipulação dos mercados financeiros, sem se interessar pela economia real. Por que fazem isso?
Novas bolhas
Explicam competentes analistas estadunidenses, em geral ignorados pela grande mídia desse país e dos demais: os bancos têm rombos potenciais gigantescos, em função das bolhas anteriores, como a imobiliária (residencial) e a dos cartões de crédito, além de novas bolhas, como a dos títulos tóxicos montados em cima de empréstimos referentes a imóveis comerciais. Só essa, em vias de estourar, é estimada em US$ 3 trilhões.
Pretendem, através de ganhos com manobras especulativas em ações, mercadorias, taxas de câmbio etc., compensar as perdas futuras e certas , provenientes de mais estouros de bolhas: antigas e novas. Mas estão criando, bolhas ainda maiores ao tentar salvar-se da ressaca dos títulos tóxicos já riscados no balanço de seus ativos, sem falar nos esperados para breve.
Nos EUA dois bancos apenas lideram os movimentos do mercado financeiro, o JP Morgan e o Goldman Sachs, este, no momento, o de maior influência sobre o governo. Depois de ter sido socorrido com os programas federais, o Goldman vem comandando, entre os outros, a alta do preço do petróleo, com o que obteve boa parte de seu elevado lucro no último trimestre. Usa, ademais, computadores supervelozes para fazer transações em minúscula fração de segundo, antes que os demais possam reagir.
A. Gavin Marshall chama de mãe de todas as bolhas o salvamento dos bancos, por parte do governo. De fato, a grande elevação nos preços das ações e das mercadorias está acontecendo junto com a economia mundial deprimida. Ademais nada se está fazendo de sério para reverter a depressão, que, assim, tende a se acentuar. Estão presentes, portanto, todos os ingredientes para aprofundar-se, em breve, o colapso financeiro.
Há uma diferença importante em relação às sucessivas crises anteriores: na próxima e mais aguda crise, já não haverá como evitar o colapso sistêmico por meio das operações de salvamento com recursos públicos, emissão de moeda e de títulos governamentais.
Os US$ 13 a 14 trilhões, já metidos naquelas operações, são mais que suficientes para tornar incontroláveis os agregados monetários da economia dos EUA, tornar os títulos norte-americanos ainda menos atraentes do que já eram, e afundar o dólar. Entretanto, os cálculos de gente séria apontam para, até o fim deste ano, novos rombos da ordem de US$ 20 a 25 trilhões.
Neil Barofsky, inspetor geral do programa de alívio dos ativos tóxicos (TARP) estima que as várias agências do governo dos EUA já estão expostas a risco de US$ 23,7 trilhões, por causa dos esquemas para salvar os grandes bancos.
Resultados da globalização
Outra coisa: entre as muitas gracinhas que a globalização suscitou, para grande satisfação do demônio, está o fato de os bancos e fundos de investimento de cada país participarem das jogadas financeiras em mercados de outros países ou regiões.
Os prejuízos potenciais dos bancos europeus, a aparecer dentro de meses, podem atingir o equivalente a US$ 25 trilhões. Somados aos que se desenham nos EUA, os rombos em perspectiva aproximam-se de US$ 50 trilhões.
Por conseguinte, pode-se ter certeza de que a próxima crise será generalizada. Além disso, deverá ser sistêmica, por serem as quantias envolvidas insuscetíveis de ser cobertas pelos pacotes de ajuda de governos e entidades multilaterais, como a União Européia, e de instâncias internacionais, como o FMI.
Sem que a oligarquia financeira renuncie a seu poder totalitário sobre nações e governos, falta, dentro das políticas econômicas, saída para escapar ao colapso financeiro sistêmico e à depressão mais profunda da História. Parece, pois, claro que dita oligarquia suscitará, internamente, mudanças institucionais na direção do fascismo e, externamente, recorrerá a guerras de grande porte.
Brasil
Não há como, sem se desatrelar dos vínculos com os centros hegemônicos, livrar-se dos efeitos grandemente danosos do colapso mundia, entre outros: desvalorização das reservas; fuga de capitais; queda no valor das exportações; conseqüente crise nas contas externas; queda dos investimentos produtivos, já diminutos, das transnacionais, que dominam a estrutura produtiva. Perspectiva de progresso: somente fazendo reverter as políticas da globalização, a começar pelas privatizações.
Publicado em A Nova Democracia, nº 56, agosto de 2009
às vésperas do desenlace
Adriano Benayon * 11.08.2009
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