Guiné-Bissau: a verdade não contada pela imprensa ocidental

Kumba Ialá renunciou hoje formalmente à Presidência em Guiné-Bissau, legitimando a autoridade do Comité Militar para a Restituição da Ordem Constitucional e Democrática (CMROCD) mas ao mesmo tempo por duas vezes acrescentou frases que não constavam no texto de demissão que tinha sido elaborado de acordo com membros do CMROCD e a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO).

Numa destas declarações, Kumba Ialá disse que a "luta política vai continuar", e referiu a milhões de USD que tinham sido entregue às chefias militares. Desabafos do homem que nada fez para Guiné Bissau em três anos e cuja actividade política está terminada. O Comité Militar afirmou hoje que Kumba Ialá “é livre para fazer o que quiser”, o que inclui ficar no país ou sair, se quiser.

Porém, Kumba Ialá manteve o seu estilo errático até ao fim. Na mesma declaração, saudou os militares pela sua acção, devido "à situação que vinha prevalecendo no país”.

Dias depois de ter adiado a realização das eleições pela quarta vez, afirmou Kumba Ialá que estas deveriam ser realizadas o mais depressa possível. Se o ex-Presidente tivesse deixado que as eleições se realizassem atempadamente, nomeadamente no dia 12 de Outubro, esta situação nunca teria sido necessário e as muitas pessoas que afirmam hoje que um golpe militar anticonstitucional foi bom, porque foi a única maneira de visar os direitos constitucionais dos guineenses, não teriam crises de consciência.

No entanto, General Seabra já declarou que não ficará no poder e que a única intenção dele e do CMROCD é realizar as eleições o mais depressa possível. Justificando o golpe de estado com a afirmação “Estávamos num país sem constituição, sem judiciária, sem parlamento – um país de malucos”, General Seabra está a ser ajudado pelo Arcebispo de Bissau, José Camnatne, que está trabalhar no sentido de formar um governo de transição, que deverá ser anunciado amanhã.

Numa declaração à imprensa hoje em Bissau, uma fonte do CMROCD disse que as razões pela acção, que insistiu não ser um golpe de estado, mas uma reposição da democracia, foram múltiplas. Os funcionários públicos não tinham sido pagos há nove meses, as eleições eram sistematicamente adiadas mas houve também um motivo mais sinistro, não noticiado pelos órgãos de notícias ocidentais: o Primeiro Ministro, Mário Pires tinha referido à possibilidade de uma guerra civil se o Partido de Renovação Social do ex-presidente não ganhasse.

Mário Pires disse numa convenção eleitoral no início de Setembro que uma vitória nos partidos da oposição traduzir-se-ia em violência. Com o potencialmente frágil estado das relações inter-étnicos em Guiné-Bissau sempre um factor a explorar, o exército decidiu agir antes que fosse tarde demais.

As reacções negativas de certos países e organismos na comunidade internacional mais uma vez demonstra a ignorância generalizada acerca dos assuntos reais e o estado limitado dos Ministérios do Exterior e dos diplomatas de carreira, que ganham fortunas sem serem capazes de analisar uma situação que, a priori, deveriam ser capazes de entender.

Djibril MUSSA PRAVDA.Ru GUINÉ-BISSAU

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