Segundo o conservador inglês Financial Times [15/9], "nos últimos dois anos até agosto, as vendas no exterior [do Brasil] cresceram 63%, atingindo US$ 89 bilhões. Nos últimos 12 meses, o superávit comercial chegou a US$ 31,6 bilhões, o maior de qualquer mercado emergente exceto a Rússia, exportadora de petróleo".
Escrevem com alegria que as "exportações cresceram para 17% do Produto Interno Bruto, um aumento em comparação a apenas 6,5% em 1998". Que beleza, todos exportam. Até mesmo "empresas menores", que "também estão embarcando na febre de exportação".
Depois de elogiar também a política externa e a "liderança dos países pobres", o que não deixa de ser verdade, diz que "foi seu [de Lula] antecessor na presidência, Fernando Henrique Cardoso, quem implementou a base econômica e política", logo depois de ressaltar que nosso presidente é de "esquerda". Então FH deve ser também, certo?
Não se sabe bem porque de esquerda, já que a publicação elogia pontos como a liberalização do comércio ("tornou as empresas mais competitivas"), a privatização nos anos 90 ("libertou as empresas estatais ineficientes") e até a crise financeira de 1999 ("os executivos corporativos foram forçados a olhar para o exterior"). Tudo o que o PT critica. Ou pelo menos criticava.
Segundo lembra o diário francês Le Monde Diplomatique [9/9], para o Fundo Monetário Internacional, "caso o antigo sindicalista fosse eleito para a presidência, o caos não demoraria a tomar conta do Brasil, uma vez que os investidores ameaçavam se retirar do país, enquanto os mercados financeiros especulavam contra a moeda, o real". E ironiza: "Vinte meses mais tarde, o tom mudou da água para o vinho".
Em outro trecho diz que desde que administração do presidente Lula assumiu as suas funções, em janeiro de 2003, "deu continuidade a uma política macro-econômica coerente e implantou uma agenda ambiciosa no que diz respeito às reformas estruturais", declarou Rodrigo Rato.
Relembra também o que pouca gente gosta de lembrar: Joaquim Levy, secretário do Tesouro, foi membro do FMI no passado. Está tudo em casa. Em outro trecho: "A instituição não tem interesse algum em ver o gigante latino-americano passar por um novo período de instabilidade". Se tivesse tal interesse, iria afundar o país com o já conhecido terrorismo econômico das eleições de 2002 e de 99.
O Le Monde pelo menos dá nome aos bois. Por exemplo: quem foi o culpado por estarmos hoje na pindaíba? "Desde a liberação, em 2002, de um empréstimo de US$ 30,4 bilhões (R$ 88,57 bilhões, que teve um acréscimo de US$ 6 bilhões - R$ 17,48 bilhões - em 2003), o Brasil tornou-se o principal devedor do FMI e, portanto, um risco financeiro que não deve ser menosprezado".
E mais grave ainda: "Somando-se a dívida do Brasil com a da Argentina, cujas relações com Washington continuam delicadas, obtém-se a metade do total dos investimentos da instituição".
O diário francês também lembra que a meta de superávit primário de 4,25% obriga o governo a reduzir as despesas federais em mais de US$ 20 bilhões (R$ 58,27 bilhões) neste ano, em detrimento dos programas de saúde, de educação e de investimentos que ele havia prometido na sua plataforma eleitoral, os quais são particularmente urgentes para o terço da população que vive na pobreza.
E o mercado interno, que gera crescimento sustentável? E as necessidades básicas do nosso povo? Virá por meio somente de exportações? Aliás, quem disse que nosso crescimento pífio foi citado na "reportagem" do Financial Times? Se as exportações são 17% do PIB, e subindo, em quanto está a porcentagem da Educação e dos investimentos em tecnologia nacional, bases para a conquista da soberania econômica e social?
Se o diretor do FMI, Rodrigo Rato, acha que as despesas em infra-estrutura "não devem ser feitas em detrimento do reembolso da dívida e que cabe ao Brasil financiar os seus próprios investimentos", de onde virá o dinheiro?
Mais importante para os dirigentes do FMI é se perguntar: se Brasil e Argentina se juntam para renegociar de forma veemente a dívida e exigir respeito aos direitos dos cidadãos pobres, o que será do Fundo?
Gustavo Barreto 15 de setembro, 2004
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