Comunicado da Renovação Comunista

1. Sem prejuízo da consideração de factores desfavoráveis da conjuntura internacional e de atrasos estruturais a diversos níveis em Portugal, é no Governo de Durão Barroso e nas suas políticas que reside o principal factor de agravamento da situação política, económica e social e o quadro de dificuldades sem fim à vista com que a maioria dos portugueses e o país se defrontam.

O Orçamento do Estado para 2004, apresentado pelo Governo e aprovado há dias na generalidade pela maioria na Assembleia da República, insiste na linha do fundamentalismo do défice e do desinvestimento público, da degradação dos serviços públicos, da retracção do consumo privados. Esta orientação já mostrou à evidência a sua incapacidade de inverter positivamente o mau ciclo económico e de relançar uma perspectiva de confiança, estabilidade e desenvolvimento social. E está, pelo contrário, a acentuar todos os factores de crise.

É chocante a insensibilidade que o Governo e em particular o ministro Bagão Félix revelam face à rápida elevação do desemprego, que já atinge quase meio milhão de portugueses e é responsável pela angústia e pela incerteza face ao futuro de muitos milhares de famílias. Para além da exigência de alterações de fundo nas opções fundamentais do Governo, a gravidade do problema impõe medidas públicas de carácter imediato que contenham e invertam um problema social tão insustentável.

A situação atravessada por muitas empresas é muito difícil e a própria sobrevivência de partes significativas do tecido económico está posta em causa, o que objectivamente bloqueia condições para o crescimento da economia e a elevação da sua competitividade.

A postura fatalista do Governo de que nada há a fazer senão esperar por modificações na conjuntura internacional, constitui um erro que está a ter e irá ter consequências graves para o futuro do país. E tornam evidente aos olhos de muitos portugueses o esgotamento da actual solução governativa.

A crescente e diversificada contestação à acção governamental e as manifestações de desagrado que atingem membros do Governo e o próprio Primeiro-Ministro, mostram que a perda de credibilidade do executivo é acelerada. E que a falta de perspectiva de resolução dos problemas, aliada à mediatização de inaceitáveis casos de favorecimento pessoal e político no interior e na área do Governo, está a amplificar naturais sentimentos de revolta e de contestação.

2. As expressões de descontentamento e de contestação social correm, entretanto, o risco de se verem completamente frustradas, e de convergirem num ambiente de acrescido desespero, na medida em que não se perfile uma alternativa credível ao nível de políticas e de medidas com impacto, que dêem resposta real aos problemas da sociedade e do país.

Cada uma das forças de esquerda e a esquerda no seu conjunto, estão assim confrontadas com a inadiável necessidade de preparar e de credibilizar uma alternativa da esquerda à presente situação.

A dinamização de um debate inclusivo à esquerda, centrado na discussão do conteúdo político da alternativa e na criação de condições de convergência para a sua viabilização afigura-se, assim, como uma questão fundamental.

O ponto de partida , quer no seu conjunto da esquerda, quer em cada uma das suas actuais componentes partidárias, é desanimador, como se observa. À confrangedora ausência de reflexão sobre as actuações que no passado recente conduziram à entrega do poder à direita, e à acumulação de impasses em matéria de orientação política, soma-se a persistente incompreensão de que a convergência à esquerda não pode limitar-se à oposição pela oposição, antes tem sobretudo que afirmar-se por uma política de verdade, pela construção de propostas e pela sua afirmação junto dos portugueses.

De um lado reafirma-se a intenção de hegemonizar o espaço da esquerda, apostando na continuação do rotativismo eleitoral ao centro. Esse é o lado dos que, pressionados pelas suas próprias ambiguidades, se têm deixado render, em aspectos fundamentais, ao neo-liberalismo e à direita. De um outro lado mantém-se a visão estreita e sectária de que qualquer convergência do conjunto da esquerda, que ultrapassasse a mera lógica oposicionista, representaria um obstáculo à sua afirmação própria. Esse é o lado dos responsáveis pela posição defensiva em que o movimento dos trabalhadores se encontra.

A Renovação Comunista reitera o seu propósito de contribuir como parte activa para o desenvolvimento do debate à esquerda com vista a gerar uma alternativa real e credível. E manifesta a sua disponibilidade e abertura para colaborar com iniciativas que se desenvolvam, quer na esfera social quer política, com idêntico propósito.

3. Em relação ao actual momento político a Renovação Comunista entende fazer uma particular chamada de atenção para os seguintes pontos e enuncia, em relação, a eles a sua postura e as iniciativas que entende adoptar:

• Segurança social: É particularmente grave que o actual Governo não esteja a cumprir as suas obrigações em relação ao sistema público de Segurança Social, não transferindo o mínimo de dois pontos percentuais das quotizações dos trabalhadores para o Fundo de Estabilização Financeira criado com o propósito de garantir o pagamento das pensões aos actuais e futuros beneficiários. À profunda descapitalização da Segurança Social ocorrida no final da década de oitenta e até meados da década de noventa, durante os governos do PSD chefiados por Cavaco Silva, e que se traduziram na subtracção ilegal de cerca de dois mil milhões de contos ao património da Segurança Social que deveria garantir os direitos adquiridos e em formação dos seus contribuintes/beneficiários, soma-se agora uma política de igual sentido e consequências por parte do actual governo PSD/PP. A Renovação Comunista alerta vivamente em relação às consequências anti-sociais de tal política, adverte em relação aos propósitos privatizadores e redutores de direitos que ela visa justificar, apela ao desenvolvimento de um largo movimento de opinião em defesa do sistema público de Segurança Social, e sustenta a necessidade de desgovernamentalização da sua administração de modo a defender o seu património das práticas predadoras do ministro Bagão Félix.

• Saúde: O Ministério da Saúde prometeu aumentar a produção de cuidados de saúde, mas o que se observa é a estagnação produtiva, a desqualificação técnica e o imobilismo organizativo no SNS, o retrocesso no plano hospitalar para orçamentos em bases históricas com cortes irracionais, a incapacidade para ligar as retribuições dos profissionais à produção e à qualidade, o fracasso no controlo das listas de espera. A Renovação Comunista considera que a fixação dos tempos de espera clinicamente aceitáveis é uma questão decisiva para as garantias de acesso dos portugueses à prestação de cuidados de saúde e por isso participará na dinamização de uma iniciativa legislativa popular que assegure neste domínio os direitos dos cidadãos a uma saúde acessível e de qualidade.

• Ensino Superior: As medidas do Governo restritivas do financiamento público e lesivas da autonomia e da gestão democrática das instituições, têm suscitado uma generalizada discordância e uma crescente contestação. O brutal aumento do valor das propinas no ensino superior público é injusto e socialmente insustentável. A apresentação demagógica do aumento do valor das propinas como um instrumento de justiça social, bem como a tentativa do Governo de endossar o ónus da sua aplicação para as instituições do ensino superior, não tem contido o enorme descontentamento bem patente na manifestação nacional de estudantes do passado dia 5 de Novembro. A Renovação Comunista sustenta a imediata suspensão do aumento do valor das propinas e das alterações à autonomia e o desenvolvimento de um debate democrático sobre uma nova política de financiamento e sobre o aperfeiçoamento da autonomia das instituições do ensino superior e da sua gestão democrática e participada.

• Justiça: A atenção com que a sociedade portuguesa tem vindo a seguir alguns casos que decorrem nos tribunais, está a ser crescentemente acompanhada por preocupações em relação a práticas muito negativas que se manifestam no nosso sistema judicial. A Renovação Comunista considera inaceitável que a realização de escutas telefónicas possa abranger pessoas que não estejam indiciadas nem sejam suspeitas da prática de crimes graves. Considera, por outro lado, que a aplicação da prisão preventiva a qualquer arguido deve ser considerada a título excepcional e reduzida ao mínimo no seu período de aplicação. E manifesta-se abertamente pela alteração do regime legal de protecção do segredo de justiça, de forma a assegurar o seu efectivo respeito.

• Comunicação Social: A intervenção governativa neste sector não está a respeitar princípios básicos de isenção e de não interferência, democraticamente exigíveis. Por um lado o executivo tem procurado obter tratamento favorável por parte dos operadores privados de televisão em troca da limitação e da transferência de espaço publicitário do canal público. Por outro lado tem utilizado a influência directa e indirecta do Estado para assegurar a nomeação de pessoas da sua confiança política para a direcção de importantes órgãos de comunicação social (casos recentes da LUSA e do DN). Por outro lado ainda, os partidos do governo, PSD e PP, votaram recentemente na AR contra uma proposta legislativa do BE que visava impedir a concentração de meios de comunicação social. A questão da isenção, do rigor, do pluralismo dos grandes media, é uma condição fundamental da vida democrática, para a defesa da qual é indispensável empenhar toda a sociedade. É esse o sentido fundamental da nossa intervenção.

4.

Considerando o atraso em que se encontram os trabalhos da Conferência Intergovernamental que está a discutir o tratado da Constituição Europeia e a conveniência de só finalizar o debate em curso na Renovação Comunista quando estiverem apuradas as suas conclusões, a Dinamizadora Nacional da Renovação Comunista decidiu transferir a realização do 2º Encontro Nacional para sábado dia 24 de Janeiro de 2004.

A Dinamizadora Nacional da Renovação Comunista está convicta de que o trabalho de informação e de esclarecimento em torno das questões europeias irá prosseguir de forma activa até essa altura, preparando as melhores condições para o debate que importa abrir e generalizar a todo o povo portugûes.

A Dinamizadora Nacional da Renovação Comunista manifesta o seu apoio em relação à petição para a realização de um referendo para que deixe de constituir crime o aborto realizado nas primeiras dez semanas de gravidez, com o consentimento da mulher, em em estabelecimento legal de saúde.

Realiza-se nos próximos dias 12 a 15 de Novembro, em Paris, o 2º Fórum Social Europeu. A Renovação Comunista participará oficialmente nos seus trabalhos.

A Dinamizadora Nacional da Renovação Comunista

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