Um estelionatário na praça

Roberto Amaral

O candidato da direita impressa, apoiado pela direita partidária, alardeia, impunemente, que é o autor disto e daquilo. Segundo sua discurseira, tudo o que há de novo no país é velho, pois nasceu de iniciativa sua. Entre outras coisas se diz, agora, o criador dos genéricos. Mente. Mente deslavadamente. Trata-se, a afirmação, de apropriação indébita e grave infração ética. Estelionato e propaganda enganosa. Contemos esta história para que a invencionice não prevaleça sobre a verdade.

A política governamental dos genéricos foi iniciativa do nosso querido e saudoso Jamil Haddad (então presidente nacional do PSB) quando ministro da Saúde do governo Itamar Franco. A ideia remonta ao deputado Eduardo Jorge, na época deputado pelo PT de SP, que, em 1991, apresentara à Câmara Federal projeto de lei (nº 2.022) que proibia o uso de marca comercial ou de fantasia nos produtos farmacêuticos e obrigava a utilização do nome genérico nos medicamentos comercializados no país.

A proposta de Eduardo Jorge, todavia, não caminhava e em 1993, quando Jamil Haddad assumiu o Ministério da Saúde, ela estava engavetada na Câmara, embora, já então, Organização Mundial da Saúde reclamasse de nosso governo a necessidade de liberação dos remédios. Fortalecido com parecer da Assessoria Jurídica do Ministério da Saúde, segundo a qual a fabricação de genéricos não dependia de autorização legislativa, Jamil Haddad elaborou e assinou com o presidente Itamar Franco (que aí está vivo, vivíssimo para testemunhar) [1] o Decreto 793 de 5 de abril de 1993, implantando os genéricos

(seu texto pode ser encontrado em http: www.anvisa.gov.br/hotsite/genéricos/legis/decretos/793.htm ).

O decreto de Jamil Haddad determinava que: a) os nomes genéricos deveriam constar das embalagens de todos os medicamentos, com destaque em relação à marca comercial; b) as receitas médicas ou odontológicas deveriam indicar a denominação genérica do medicamento prescrito; e c) a indústria farmacêutica tinha seis meses (da data do Decreto) para adequar-se às novas normas.

Quando Serra-Pinóquio entra na história, em 1999, já existia a política de genéricos (contestada, é verdade, pela indústria farmacêutica multinacional) e esses remédios já estavam sendo fabricados no Brasil. Mas não para aí a contribuição pioneira de Jamil. Mesmo a lei, de 1999 repita-se, ou seja, passados seis anos da edição do decreto 793, resulta de substitutivo apresentado por Jamil Haddad, deputado federal pelo PSB, ao projeto de lei originário de Eduardo Jorge.

A participação de Serra-Pinóquio é simplesmente nenhuma.

Mas essa não é a história toda.

Dissemos acima que o projeto de Eduardo Jorge dormitava na Câmara e que, apresentado em 1991, só seria aprovado (substitutivo de Jamil Haddad, repita-se) em 1999. Por quê? Porque o governo FHC-Serra/Pinóquio (instalado em janeiro de 1995) cedeu às pressões do poderoso lobby dos laboratórios farmacêuticos e fez corpo mole no Congresso. Nem ajudava a tramitação do projeto Eduardo, nem forçava os laboratórios estrangeiros a cumprir o decreto de Jamil Haddad. Mas não foi só isso o que dupla fez contra os genéricos. Transformado em lei o projeto de Eduardo Jorge com a aprovação do substitutivo de Jamil Haddad, quatro anos após a posse do tucanato no Planalto, em 10 de fevereiro de 1999, somente em setembro do mesmo ano seria regulamentado pela dupla FHC-Pinóquio.

Ao fim e ao cabo: em 2002, quando o tucanato é desalojado do Planalto após oito anos de locação, os genéricos eram responsáveis por 5,8% do mercado de medicamentos no Brasil. Ano passado, após menos de sete anos do governo Lula, a participação dos genéricos no mercado já era de 19,2% e seus preços nas farmácias são até 65% menores que os medicamentos de marca.



[1] Em seu twitter de candidato ao Senado (Somos Minas Gerais') o ex-presidente postou: "(...) presidenciáveis discutindo genéricos me trazem saudades de Jamil Haddad, amigo e guerreiro que criou o Decreto 793, em 504/93".

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