Não há data pré-estabelecida para festejar o verdadeiro Natal. O Natal, o nascimento do Cristo e das coisas do Cristo em nossos corações, deve acontecer todos os dias, todas as horas, a cada manhã, a cada instante. Brilhar em imensa luz nos apontando o caminho ao romper da aurora, estar ao lado e dentro de Deus.
O Natal é hoje e sempre, ontem e depois de ontem, há mais de dois mil anos, quando Maria se fez mãe de todos nós, trazendo em seu coração o sofrimento do mundo inteiro. Amanhã distribuiremos presentes para justificar a ausência da irmandade entre irmãos, da amizade entre pais e filhos, e da orfandade nos homens do verdadeiro Natal do Senhor.
A liturgia da palavra deveria ser lastreada em nossas vidas, em nossa caminhada. Mas como a nossa comunhão diária é com o medo que paralisa os braços, definiremos uma data no calendário para sepultarmos em nós e no próximo, dia a dia, a comunhão dos sonhos e desejos do Cristo. Afinal, teremos um momento propício para isso, definido, programado e oportuno. Tudo muito bem planeja, para não haver surpresas. Enquanto isso, vamos vivendo de ausências, distâncias, distanciamento e muito pouco afeto. Viveremos assim para plantarmos tesouros sobre nossos túmulos em que crescerão flores tristes e medrosas, revelando a vida que se encerra no degrau debaixo das relações humanas.
Não sorveremos as palavras embebidas na luz do amor ao próximo, de adoração ao eterno, da comunhão com o belo, do culto ao transcendente, da amizade que irmana os semelhantes em uma grande e luminosa corrente de fraternidade universal, da entrega. Sorveremos o medo da morte, o medo do próximo e, principalmente, o medo de nós mesmo. Pueril e estéril. O medo que faz as ruas desertas em nossos corações em que caminham, de mãos dadas, o vazio e a solidão.
Faz muito que Cristo andou por aqui. Suas pegadas deixadas na areia do pensamento humano parecem levadas pelo vento da história e pela pouca fé dos homens.
Parece que o mundo, o todo, afeiçoou-se muito mais ao escuro da sexta-feira do martírio que ao domingo do renascimento. Faz-se lá fora um mundo cinza moderno, enfumaçado pelo efêmero, debaixo da tempestade das grandes frustrações humanas. Será que nós sabemos exatamente o que fazemos com nós mesmo, dia a dia?
Enquanto isso, debaixo do imenso pinheirinho do tempo, o meninozinho, em algum canto esquecido do mundo, brinca com as sedutoras bolas da árvore de Natal, imaginando ter a beleza do mundo inteiro bem na palma da sua mão.
Petrônio Souza Gonçalves é jornalista e escritor - petroniosouzagoncalves.blogspot.com
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