A BOLSA OU A VIDA

Depois de fecundo casamento com a Igreja Católica, que deu ao PT fartos rebentos políticos durante mais de 20 anos, o estranho conúbio está experimentando trepidações com o recente manifesto da CNBB – Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – criticando acerbamente o programa social do governo, taxando-o sem rebuços de meramente “assistencialista”.

Parecem estar novamente ganhando alento as fogueiras do inferno astral do governo petista, com as achas dos resultados pífios e decepcionantes do crescimento da economia nacional, com índices superiores na América Latina apenas ao Haiti, após a passageira onda de felicidade nascida do crescimento do nome do Presidente nas pesquisas de opinião Das manifestações de Dom Odilo Scherer e Dom Cláudio Humes acusando o governo Lula de haver transformado o Brasil num “paraíso financeiro”, o debate resvalou para a questão de ser ou não ser meramente assistencialista o programa social do governo.

Vivendo experiência administrativa numa das áreas mais pobres de Minas, quiçá do Brasil, assisto diariamente ao desfilar da pobreza e de suas dolorosas conseqüências diante das intermináveis filas defronte ao Banco do Brasil, Caixas Econômicas, casas lotéricas e quejandos, uma corrente de despossuídos esperando receber as doações dos programas assistenciais do governo, especialmente a bolsa-família. Desatento ao velho brocardo chinês de que é preferível ensinar o homem a pescar do que lhe dar apenas um pedaço de peixe para saciar a fome, o governo federal sermoneia as vantagens advindas da entrega mensalmente de 65 reais a cada família.

A única e às vezes descumprida exigência de manutenção dos filhos matriculados na escola, transforma a doação num ópio para as famílias, paralisando-as em sua capacidade de buscar melhoria e elevação social. Comprazem-se com as migalhas incorporadas mensalmente ao seu sustento, dispensando-se de procurar qualquer tipo de trabalho, único e válido instrumento real de inclusão social. Falava da experiência administrativa que me permitiu observar e concluir ser este um caminho equivocado, não obstante estar o programa forrado das melhores intenções, exatamente como os caminhos do inferno.

O início de algumas obras de porte em andamento em várias partes do município, absorvendo grande contingente de operários de diversas especialidades, transmitiu-me a sensação de discreta euforia causada pelo pleno emprego, sugerindo-me apontar ser a disseminação de empreendimentos de natureza vária, muito mais que a simples distribuição de benefícios, o caminho mais curto para chegar à meta proposta no discurso governamental.

Tem razão o Arcebispo Dom Cláudio Humes quando assinala “que o Brasil precisa crescer, porque não crescer é não ter emprego”. Fazer doação mensal de determinada quantia para cada família pobre, está muito distante de uma verdadeira política social para eliminar desigualdades e reduzir a pobreza. O verdadeiro centro de gravidade de ações governamentais para obtenção desses resultados deveria ser tão somente investimentos maciços de recursos públicos em obras de grande capacidade de absorção de mão-de-obra.

Um pouco de Keynes não faria mal. Como a capacidade de investir no Brasil está negativa e fortemente pressionada pela alta de juros, ensejando aos bancos brasileiros e estrangeiros a maior lucratividade de todos os tempos, resta ao governo a doação mensal de pequenas quantias aos brasileiros pobres, uma espécie de anestésico que o torna prisioneiro do vício de não trabalhar, na expectativa de que em períodos eleitorais as cornucópias governamentais derramem sobre eles as bondades, com o que por aqui se especializaram partidos e políticos em adiar soluções duradouras. Enquanto isto, “atiram-se aos pobres as migalhas do banquete suntuoso”, lembram os Evangelhos. É a bolsa ou a vida.

* Murilo Badaró Presidente da Academia Mineira de Letras

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