O primeiro automóvel que chega a Portugal em 1895, é um Panhard & Levassor,importado de Paris por Jorge Avilez de Sousa Feio, 4º Conde de Avilez. Algumas histórias da época contam que foi difícil catalogar aquele novo espécimen, que não fazia parte das listas aduaneiras, e relatam a extraordinária viagem deste veículo, desde a alfândega de Lisboa até Santiago do Cacém, localidade onde residia aquele titular, na companhia do seu amigo e conterrâneo José Benedito Hidalgo de Vilhena e de um mecânico.
Em 1901 foi vendido, consecutivamente, a Mariano Sodré de Medeiros, que o quis embarcar para os Açores e que acabou por vendê-lo a João Garrido. Já mais recentemente, nos anos 50 do século 20, foi doado pela família Garrido ao Automóvel Clube de Portugal com a condição de que ficaria na cidade do Porto. Desde então está exposto em permanência no museu dos Transportes e Comunicações da Alfândega daquela cidade. Excecionalmente em exposição em Lisboa, no Museu Nacional dos Coches de 1 de setembro a 3 de outubro. Visitas comentadas pelo especialista em automóveis clássicos Manuel José de Araújo e Cunha Baptista 15.09 às 11h e 17.09 às 11h e às 16h com estas e outras histórias para explicar. (sem marcação) Quando o Museu Nacional dos Coches foi inaugurado em 1905, o Panhard et
Levassor que se encontra agora em exposição entre nós, tinha 10 anos de fabricado. Era já uma famosa marca francesa de automóveis, e dentro de poucos anos, em 1911, seria erigido na Porta Maillot, junto ao Parque de Boulogne, um monumento comemorando uma vitória desportiva famosa em que um Panhard et Levassor tinha sido o vencedor. Em 1895, um Panhard et Levassor sagrou-se vencedor na maior prova automobilística até então realizada no mundo: Uma prova de resistência e velocidade Paris-BordéusParis, sem paragens intermédias, e com chegada à Porta Maillot.
A melhor forma de continuar esta evocação é transcrever algumas partes dum dos extensos textos publicados na imprensa parisiense de então. " Paris-Bordéus-Paris (10 - 12 de Junho de 1895) Foram dados 5 meses aos construtores para a preparação dos veículos. Que cada um metesse mãos à obra, até Junho de 1895. ... No dia 10 de Junho de 1895, sob um sol radioso, faz-se a concentração das viaturas junto do Arco do Triunfo, para onde acorre uma enorme multidão. Mas a partida não será desse local. Uma a uma as viaturas dirigem-se a Versailles, onde terá início a grande prova ...... Os veículos a vapor estavam bem representados com 4 unidades, e a gasolina estão ainda mais bem representados, com 10 unidades. Um deles é o Panhard et Levassor conduzido por Emile Levassor ... ...
Doze horas após a partida de Versailles ainda nada se sabia sobre o que se ia passando na prova quando, de repente, chega a notícia que Emile Levassor, no seu carro de 2 lugares, tinha já hora e meia de avanço sobre os outros concorrentes ... ... Vinte e quatro horas após ter partido de Versailles, chega a Bordéus, e ei-lo que retorna imediatamente para Paris, cruzando-se no caminho com todos os outros concorrentes, com 4 horas de avanço sobre o segundo concorrente. Homem e máquina são duma resistência maravilhosa. Finalmente, na manhã do dia 12 de Junho, às 10 horas, Levassor assina, junto da Porta Maillot, a folha de controlo, exactamente 48 horas e 47 minutos após ter deixado Versailles. O vencedor da prova tinha gasto menos de metade do tempo máximo imposto para cobrir os 1.200Km do percurso. A velocidade média foi de 24,6Km/h ..." São alguns extratos de um longo texto publicado num jornal de Paris, repescados numa extraordinária publicação de 1935, um enorme e fascinante livro intitulado "Histoire de la Locomotion Terrestre".
Se compararmos o Panhard et Levassor com os seus mais directos concorrentes, numa perspectiva histórica em que tal trabalho é relativamente fácil, vemos que o P&L foi, em inúmeros aspectos, um verdadeiro precursor naquilo a que hoje se chama a arquitectura automóvel. Motor à frente, caixa de velocidades com carretos e um sistema de mudanças ainda hoje universalmente utilizado com, claro está, as melhorias de um século de experiencia e progressos tecnológicos, caixa essa situada a seguir ao motor, por baixo do condutor e com comando directo, a alcance da mão, exactamente como hoje, veio de transmissão e um diferencial com ligação às rodas traseiras. Basicamente, e sem alterações de fundo, o mesmo sistema que nos é oferecido num Mercedes, BMW, Jaguar, etc. etc., o mesmo sistema utilizado em qualquer veículo.
O motor do P&L de 1895 era fornecido por um fabricante também famoso, Gottlieb Daimler, que anos mais tarde, juntamente com outro famosíssimo construtor - Carl Benz, formaram o gigante que é hoje a Daimler-Benz. Tinha 2 cilindros em V, 1290cc de cilindrada e uma potência de 4CV a 750rpm. A ignição era feita por dois queimadores, situados na parte dianteira superior do motor e o arranque era por manivela. Ainda estava por inventar o magneto de alta tensão e velas de ignição. Robert Bosch, estava já, contudo, ao virar da esquina. A caixa de velocidades tinha 3 velocidades para a frente e uma marcha atrás, e a transmissão do movimento às rodas era feita por duas correntes. As rodas eram com cubos e raios de madeira, com aros em ferro, havendo também a possibilidade da instalação de bandagens em borracha maciça. A lubrificação do motor era feita por um sistema de tubos conta-gotas situado na parte superior do painel, e a direcção era feita com auxilio dum timão, o volante estava já, também, ao virar da esquina. Mas também aqui, o P&L foi inovador: no sistema de direcção estava já incorporada a geometria Ackermann (um engenheiro alemão que emigrou para a Inglaterra e que nesse país tinha patenteado uma solução.
Museu Nacional dos Coches
Lisboa, Portugal
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