Palavras de Timoleón Jiménez na entrega do Prêmio pela Paz e a Reconciliação

Me atrevo a afirmar que as FARC-EP fizemos muito mais que colaborar na assinatura da Paz, na medida em que a saída pacífica, civilizada e dialogada à confrontação interna em nosso país, foi uma palavra de ordem desde o mesmo momento de nosso alzamento em armas.

Escrito por  Timoleón Jiménez

Fonte: www.farc-ep.co

O compromisso é acabar para sempre a violência política, o paramilitarismo e o crime como mecanismos de dominação nacional, regional ou local.


Senhoras e senhores:

O horror do bombardeio de Guernika cumprido há oitenta anos, passaria a se converter num canto universal de condena à guerra e à destruição que ela produz.

Hoje, junto ao dedicado fotógrafo e jornalista Gervasio Sánchez, comparecemos a este Ajuntamento, o Presidente da Colômbia, por intermeio de seu delegado, Sergio Jaramillo, Alto Comissionado para a Paz e, eu, que tive também que designar um representante, o jurista espanhol Enrique Santiago, devido a que as autoridades do meu país não entregaram o passaporte para viajar pessoalmente, como o desejava, no intuito de receber o prestigioso Prêmio pela Paz y Reconciliação na sua versão de 2017, por ter obtido chegar à assinatura do Acordo que encerrou o conflito armado que por mais de meio século assotou nosso país.

O jurado integrado por representantes do Ajuntamento do Gernika-Lumo, o primeiro Vereador da cidade alemã de Pforzheim, a Fundação Gernika Gogoratuz, a Casa da Cultura e o Museu da Paz, considerou meu nome com fundamento na minha colaboração para a assinatura da Paz, a fim de prosseguir minha atividade pela via política.

Devo dizer, antes de mais nada, que recebo o Prêmio não a título pessoal, mas como reconhecimento à nossa Organização FORÇAS ARMADAS REVOLUCIONÁRIAS DA COLÔMBIA - EXÉRCITO DO POVO (FARC-EP) e, ao conjunto do povo colombiano que durante décadas clamou e trabalhou pela solução política em nosso país.

Me atrevo a afirmar que as FARC-EP fizemos muito mais que colaborar na assinatura da Paz, na medida em que a saída pacífica, civilizada e dialogada à confrontação interna em nosso país, foi uma palavra de ordem desde o mesmo momento de nosso alzamento em armas. Houve que transcorrer quase vinte anos de guerra para que o Estado colombiano aceitara iniciar pela primeira vez algum tipo de conversação encaminhada à Paz e, logo passar mais de trinta anos de processos frustrados com diversos governos, em meio de uma grave confrontação, para que lográssemos por fim alcançar o sonhado Acordo.

Um Acordo Final para a Terminação do Conflito e a Construção de uma Paz Estável e Duradoura, cujos termos mesmos põem de presente a realidade da democracia a economia e da sociedade colombiana, em nada coincidentes com a imagem que desde o poder se transmite para o exterior. Uma Reforma Rural Integral que pretende a diminuição da exagerada concentração da propriedade da terra em um setor privilegiado e, tirar os camponeses do atraso e pobreza, mediante o compromisso do Estado de construir vias e moradias, levar luz elétrica, saúde educação e oportunidades de progresso com planos de desenvolvimento.

Um capítulo sobre participação política que abre pela primeira vez as comportas da democracia às organizações, partidos e movimentos políticos e sociais de oposição, com garantias plenas para o direito à vida, a integridade e à liberdade de seus integrantes. O compromisso é acabar para sempre a violência política, o paramilitarismo e o crime como mecanismos de dominação nacional, regional ou local. Uma obrigação que o Estado colombiano promete assumir com seriedade, em meio da ola de assassinatos e ameaças contra líderes sociais e populares em diversas regiões do país

Também, contempla o Acordo um tratamento diferente à guerra e à repressão para los campesinos plantadores de coca, papoula e maconha, que obrigados pela miséria recorrem a essa atividade ilícita para poder manter suas famílias que moram nas mais apartadas regiões do país. Haverá programas de substituição de plantios ilícitos, com pleno apoio estatal para as famílias dedicadas a essa atividade, no intuito de criar-lhes condições para produzir alimentos e viver dignamente. Só assim se romperá a cadeia do narcotráfico pelo seu eslabão mais débil: as centenas de milhares de camponeses sem a possibilidade de progresso algum.

As FARC-EP efetivamente, passaremos de ser movimento em armas a ser um partido político na legalidade, que terá como sua única arma a palavra. De fato, já se cumpre o Cessar de Fogo e de Hostilidades bilateral e definitivo, ao mesmo tempo que estamos na deixação das armas, que ficarão em mãos da Organização das Nações Unidas para sua transformação em três monumentos históricos, um na sede delas, outro em La Habana, Cuba, e o terceiro em Bogotá. Temos cumprido fielmente cada um dos nossos compromissos e, esperamos que do Governo seu culto à palavra comprometida, sem pretextos e dilações a esgrimir, como infelizmente está ocorrendo em várias matérias.

Estamos aqui para falar de Paz e de Reconciliação, do propósito que se impôs em nosso país de deixar a guerra definitivamente para trás e empreender conjuntamente a edificação de uma Nação nova, na que os ódios e as retaliações não tenham cabida alguma. Foi com esse espírito que empreendemos as Conversações e, depois de cinco anos de discussões, assinamos o Acordo Final. Consideramos que assim como o fiz Viscaya, é urgente que os olhos do mundo se fixem na Colômbia, não só para garantir o cumprimento do pactuado , mas para advertir sobre as perniciosas influenças e atividades de setores políticos da ultradireita, que contra toda racionalidade e justiça, se opõem abertamente aos Acordos de La Habana e, que prometem revogar caso ganem as eleições do próximo ano. Isso não se pode permitir.

Foram mais de oito milhões de colombianos e colombianas os afetados pela longa confrontação, cuja imensa maioria foi vítima do despojo violento de suas terras, em benefício de um nefasto projeto empresarial de agro industria e agro combustíveis. A morte, a desaparição forçada, a privação arbitrária da liberdade e outras muitas formas de vitimação não podem volver a se repetir jamais. Por isso o Acordo contempla um Sistema Integral de Verdade, Justiça, Reparação e Não Repetição, que honra às vítimas e seus direitos da forma mais completa possível, sobre a base do direito que elas têm e os colombianos de conhecer a verdade do sucedido e receber satisfações.

Obrigado, Garnika, obrigado País Vasco, obrigado Espanha. Muito belo receber esse abraço de parabéns desde o outro lado do Atlântico, desde essa Europa que tem sofrido a guerra e seus horrores em carne própria. Já o cantou Gabriela Mistral em seu poema ao árvore de Gernika:

"Los heridos y aventados y los que a mitad de ruta dizque se quedaron muertos, todos volveremos, todos, el árbol, al ruedo".

Aqui estamos, reconciliados, sonhando com um mundo inteiro, governado pela Paz e o amor antes que pela avarícia e a intolerância.

Guernika, 26 de abril de 2017.

 

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey