Senadora colombiana Piedad Córdoba: gostaríamos que os refugiados estivessem conosco nessa busca pela paz pela Colômbia.
A sala da Universidade de Genebra estava cheia para escutar a senadora colombiana, os presentes a receberam com um forte aplauso de boas vindas. O prefeito da cidade de Genebra, Remy Pagani, lhe deu as boas vindas, em nome do poder executivo da cidade. A senadora surpreendeu-se de ver na sala, a alguns sobreviventes da UP, que estiveram juntos com ela no parlamento, e nas ações pela paz na Colômbia. Gostaríamos que vocês estivessem conosco, disse dirigindo-se aos presentes, muitos refugiados, imigrantes colombianos, suíços, no meio da multidão. Córdoba reconheceu ao ex-senador da UP Hernán Motta, à ex-presidente da UP, Ainda Avella, e a outros tantos rostos familiares da luta na Colômbia - pareceria repetitivo, mas devo lhes dizer que a situação da Colômbia piorou, em relação a como vocês a deixaram quando partiram.
A senadora fez um apanhado, pelos assassinatos a sangue frio, os mal chamados falsos positivos, os grampos do DAS, a infiltração paramilitar nas instituições, o êxodo forçado, o financiamento mafioso das campanhas políticas, em fim, ao ouvi-la as imagens e as más recordações nos invadiram, e muitos na sala não puderam evitar as lágrimas.
O que é um falso positivo, informação para estrangeiros?
Consciente que muitos europeus na sala necessitavam de uma explicação sobre esta modalidade de execuções extrajudiciais, a senadora ilustrou como a política de recompensas que o governo gerou e no qual Juan Manuel Santos, atual candidato do regime e ex-ministro da guerra de Uribe, promoveu nos militares para mostrar resultados vitoriosos da política estatal, para ganhar promoções na cúpula militar, o que na realidade foi a implementação sistemática de assassinatos contra jovens pobres de Soacha e outras regiões, que foram assassinados e apresentados como guerrilheiros mortos em combate. Para os presentes ficou claro que as famosas cifras de guerrilheiros mortos em combate foram insufladas em detrimento da vida de jovens pobres assassinados pela política estatal.
A negativa sistemática do conflito e o nascimento de Colombianos e Colombianas pela Paz
Nessa negativa do conflito colombiano por parte do governo, nasce a organização Colombianos e Colombianas pela Paz, que considera que a solução do conflito colombiano passa pelo reconhecimento do mesmo. Empenham-se em negar a existência do conflito social, político e armado apesar das cifras e dos horrores que temos escutado. Na Colômbia escandalizam-se quando falo dos fornos crematórios com que os paramilitares fazem desaparecer suas vitimas. A senadora mostra para o auditório os diversos testemunhos de paramilitares, aos quais teve acesso. Lembremos que a senadora visitou, nas prisões, os chefes paramilitares extraditados aos EUA e na Colômbia.
Por exemplo, o paramilitar conhecido por o 'Iguano', contou-nos na prisão de Cúcuta, antes de ser extraditado, como funcionam os fornos crematórios. A própria revista Semana revelou uma foto deles. Os fornos foram construídos no Norte de Santander, ali teve gente cremada viva, e isso foi comprovado e ninguém pode negar. O 'Iguano' é um homem pobre, que participou com tal maestria no genocídio cometido em Urabá, que foi enviado ao Norte de Santander, desta vez como chefe. Seu testemunho é indescritível e não dá para explicar como chegamos a tanto horror, como utilizar os famosos lagos com crocodilos para fazer desaparecer as pessoas. O Iguano informou que somente ele, havia matado 5.900 e até agora só pode confessar 132. Nestes números aparecem sindicalistas, intelectuais, defensores dos direitos humanos, opositores políticos, e todo aquele que seja acusado de pertencer à guerrilha.
Com estes depoimentos, tivemos acesso a informação privilegiada sobre quem está por trás dos paramilitares, quem são os seis patriotas de quem fala Castaño, quem são os financiadores e instigadores do paramilitarismo. O relato de o Iguano tem somente quatro meses, assim, estou falando do presente na Colômbia. Em Colombianos e Colombianas pela Paz, desde o intercâmbio epistolar com as FARC-EP e ELN, temos nos comprometido com o intercâmbio humanitário e na busca de caminhos para a solução política, dois momentos foram muito difíceis, o bombardeio no Equador, e a operação Xeque, que poderiam ter feito perder a confiança da insurgência nas gestões pela libertação dos prisioneiros de guerra, principalmente no ambiente do predomínio do resgate militar, e a forma como a mídia informa parcialmente ao país, escondendo deliberadamente a realidade. Estes caminhos, que exploramos desde a sociedade civil, tem se estendido, os estudantes se engajando, e outros setores muito importantes da sociedade colombiana.
Depois da marchas organizadas pelo governo contra o seqüestro, iniciou-se uma guerra contra nós, onde nos insultaram e intimidaram, mas com tudo isso, a paz na Colômbia não tem volta, custe o que custar. Em Colombianos e Colombianas pela Paz somos conscientes de que na Colômbia há partidários das libertações sem contraparte, e outro setor que comparte o intercâmbio humanitário. Pronunciamo-nós contra o seqüestro, temos enviado cartas à insurgência sobre isso, que vocês podem ler no nosso site de internet. Temos contribuído para o esclarecimento dos números sobre os seqüestros, país livre (Vice-presidente F. Santos/Salud Hernández) e outras instâncias que trabalham o assunto falavam de mais de 3.000 seqüestrados, na realidade o número baixou a 132, nós descobrimos que muitas fundações que tratam deste assunto recebiam dinheiro em proporção direta ao número insuflado dos supostos seqüestrados. O fenômeno existe, mas não na magnitude que apregoam certas organizações na Colômbia, nem os 18 milhões de pobres, nem os cinco milhões de deslocados.
Dos cinco mil jovens mortos pelos falsos positivos, onde a responsabilidade do Estado colombiano é inegável, são
fatos que nos animam a não desistir do nosso empenho, e não somos apátridas por dizê-lo.
A lei de justiça e paz, e como se extraditou a verdade
Eu tenho sido uma opositora desta lei, mas temos que reconhecer que é através desta temos conhecido certas confissões e testemunhos que demonstraram os laços com o Estado, através do exército, policia e os paramilitares e seu compromisso nestes massacres contra o povo colombiano, mas veja bem, o governo se assustou com estes testemunhos e, por isso, extraditou os paramilitares para os EUA, o que na realidade significa extraditar a verdade. Eu presido uma comissão de DDHH criada para tentar recuperar estes depoimentos, nossa tarefa foi, e tem sido dura, nós reunimos com Don Berna, Mancuso, entre outros. Estas reuniões permitiram-nos conhecer a realidade. Don Berna, por exemplo, deu a ordem para matar o senador Cepeda, também soubemos, e conseguimos reconstruir o modus operandi destas operações, como funcionaram, como e quem colaborou com esta empresa criminosa.
O relatório que estamos preparando para ser apresentado ao congresso, conterá informação importante que revelará informação que até agora era desconhecida, por isso necessitamos construir uma comissão que busque a verdade na Colômbia.
O preço que tivemos que pagar pela verdade
Numa das visitas que fiz a Mancuso, o pessoal do consulado da Colômbia nos EUA mandou me prender para evitar que tivéssemos acesso aos depoimentos. O que temos passado por encontrar e preservar a verdade do horror paramilitar não tem nome. Mancuso, na primeira visita, pediu-nos perdão por tudo o que nos tinha feito, pelo meu sequestro, pelo desaparecimento da minha filha, e por outros crimes, nós levantamos o assunto das terras, que para a constituição da verdade é muito importante, e nos surpreendemos de que o próprio Mancuso nos dize, que as principais terras expropriadas aos 5 milhões de deslocados agora estão nas mãos de políticos e apoiadores dos paramilitares.
Apesar dos obstáculos e dificuldades, temos avançado, poderíamos tornar a guerra mais fácil ao juntar-nos ao coro dos cultuadores da guerra, como o fazem muitos oportunistas, mas não, nos acreditamos nestes gestos das libertações, que abrem portas para a negociação política. Acreditamos que a paz é possível na Colômbia, apesar da tentativas de nos processar (um dia antes de vir para cá deram entrada em outro processo judicial por supostas ligações com a guerrilha), Colombianos e Colombianas pela Paz, comprometidos como estamos com a solução política, venceremos todos esses obstáculos. Não podemos observar o conflito das nossas casas, nos somos membros da sociedade colombiana, e temos o direito e a obrigação de lutar para viver em paz e com justiça social. (Alguém grita na sala: Intercâmbio humanitário já, seguido de aplausos).
Suíça, mediador privilegiado
Já pedimos ao governo suíço ajuda para a solução política do conflito, pois é um país que dá seriedade e segurança às partes, sobretudo para criar um ambiente propicio de confiança para se sentar a conversar. Mas é claro, esperamos que o governo colombiano aceite a mediação e a intervenção internacional.
Mensagem aos colombianos no exterior
Nós gostaríamos que voltassem para lutar juntos pela paz, e se o retorno não é possível, onde estejamos devemos lutar pela paz. Atualmente o paramilitarismo está mais vivo do que nunca, elegeram parte do novo congresso, não podemos perder a perspectiva de que país viemos e o compromisso diante dele. Estamos armados de vontade e da palavra para continuar lutando pela solução política.
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