Os europeus estão sempre pregando a liberdade e os direitos humanos, mas praticam pouco esses valores A União Européia foi criada principalmente para constituir uma grande economia e assim poder ser um polo de poder capaz de competir com os Estados Unidos e à Rússia, países muito maiores.
Mas não apenas por este motivo: também deveria ser um espaço para incentivar e preservar a democracia, a liberdade, os direitos humanos, o bem-estar social e a ecologia.
De fato, a União Européia e suas diversas instituições (nem sempre funcionais na prática) estão sempre pregando estes valores, e os europeus gostam de afirmar sua superioridade sobre outros países: são melhores do que os Estados Unidos, porque este país é militarista e conquistador; são melhores do que a Rússia, porque este país é tirânico, imperialista e atrasado; são melhores do que a América Latina, por causa dos vários problemas que assolam esta região: inestabilidade política e econômica, ditaduras sempre renascentes, e falta de respeito ao meio-ambiente.
Mas é, afinal, a Europa tão assim superior ao resto do mundo? Vejamos alguns fatos recentes, para podermos responder a esta pergunta. Os deputados do Parlamento Europeu, tão zelosos dos direitos humanos, querem passar uma lei que proíbe o comunismo como "doutrina criminosa", igualando-o ao nazismo, e tornar passíveis de serem julgados pelo Tribunal Penal Internacional os antigos funcionários soviéticos (talvez, quem sabe, até mesmo o ganhador do Prêmio Nobel da Paz, Mikhail Gorbatchov).
Enquanto os deputados mostram tamanho respeito pelos direitos humanos, na Lituânia, Letônia e Estônia, membros da UE desde 2004, existem monumentos aos "libertadores" nazistas, veteranos da SS marcham orgulhosamente com suásticas, e antigos campos de concentração nazistas onde morreram dezenas de milhares de judeus, comunistas e soviéticos são chamados pelo eufemismo de "centros de reeducação". Como igualar uma doutrina que busca a liberdade e a igualdade de todos os homens, em todo o mundo, com outra que prega a superioridade de um povo sobre os demais e a necessidade de exterminar as "raças infrahumanas"? Um absurdo que só fanáticos do capitalismo poderiam conceber.
É assim que a Europa defende a democracia e os direitos humanos em seu próprio território A União Européia apregoa o livre-comércio (ela começou sendo uma área de livre-comércio) e acusa alguns países, dentre eles os do Mercosul, de protecionismo. Mas o que o Mercosul mais tem buscado nos últimos anos é um tratado de livre-comércio com a UE, que só náo foi possível por causa do protecionismo, principalmente agrícola, dos próprios países europeus.
A proteção e os imensos subsídios dados pela UE a seus produtores rurais fazem com que os países menos desenvolvidos percam bilhões de dólares todos os anos. É assim que a UE defende o bem-estar social e a liberdade comercial no mundo. Os europeus também se gabam de ter as leis de proteção ambiental mais rígidas do mundo. Mas isso só é possível porque as indústrias européias mais poluidoras se instalam em regiões onde a legislação ambiental não é tão severa, muitas vezes por pressão da própria UE.
Recentemente, surgiu o conflito mais grave do Mercosul em toda sua história: os problemas entre Argentina e Uruguai por causa da decisão de duas indústrias de papel (altamente poluentes) de se instalar neste último país, próximas à fronteira argentina.
As duas papeleiras são européias, uma espanhola e outra finlandesa: fecham as instalações industriais em seus países de origem, e abrem outras na América do Sul, onde a poluição que elas gerarão não poderá afetar a limpeza européia. Há fortes rumores de que executivos das indústrias, e talvez funcionários da UE, tentaram subornar membros do governo argentino e uruguaio para que a construção das indústrias possa continuar, apesar dos protestos da população, dos ambientalistas e alguns funcionários. É assim que a Europa defende o seu meio-ambiente e destrói o dos demais. Por fim, a Europa só não é tão militarista e imperialista quanto os EUA porque não tem os recursos suficientes para isso.
No entanto, sempre quando podem, os europeus, inclusive países pequenos como Dinamarca e Noruega, mostram que nunca abandonaram por completo suas ambições coloniais, e ajudam os EUA a conquistar e arrasar o Iraque, assim como tiveram participação crucial no desmembramento e nos massacres na antiga Iugoslávia. Enquanto isso, acusam a Rússia de genocídios no Cáucaso, simplesmente porque este país conseguiu evitar que esta região se tornasse um novo Afeganistão, e está implantando um regime legal e constitucional na Tchetchênia antes dominada por terroristas.
É assim que a Europa defende a paz e a auto-determinação dos povos. Em que então a União Européia é melhor? De fato, eles têm um nível de vida altíssimo, a maior parte de seu orçamento é destinado a programas sociais, e a zona do euro é a maior economia do mundo. Alguns governos europeus se mostraram um tanto racionais, e se opuseram veementemente à conquista do Iraque (como o atual governo francês e o anterior alemão). Alguns poucos países da UE são militarmente neutros (somente a Suécia, a Áustria e a Finlândia), não fazem parte da OTAN e assim contribuem para a estabilidade e a paz. Um pouco melhor do que os EUA, isso a União Européia sem dúvida é. Mas está longe de ser o paraíso da liberdade e dos direitos humanos, como os europeus muitas vezes se jactam.
Carlo MOIANA
Pravda.ru Buenos Aires
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