O Programa Nacional de Direitos Humanos, apresentado em dezembro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, virou guerra entre setores da sociedade civil e facções ideológicas dentro do próprio Governo, por propor uma comissão da verdade para rever a Lei de Anistia, concebida e sancionada em 1979 pela ditadura militar.
O PNDH-3, como está sendo chamado, foi assinado por 31 ministérios, e cria um grupo de trabalho para propor um projeto de lei que institua a Comissão Nacional de Verdade, com o objetivo de examinar as violações dos direitos humanos ocorridas durante a ditadura militar.
O programa conseguiu provocar reações a favor e contra em vários setores da vida nacional, entre eles a Ordem dos Advogados do Brasil, a Igreja, as Forças Armadas, a Agricultura, os meios de comunicação, tanto entre os progressistas como entre os conservadores.
A criação da Comissão da Verdade não é consenso nem mesmo dentro do próprio governo. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, por exemplo, já se posicionou contra a criação do grupo e ameaçou renunciar junto com os chefes militares do Exército, Marinha e Aeronáutica, que consideraram o programa um insulto e de caráter "revanchista".
Já o ministro da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannucci, mentor intelectual do PNDH-3, disse que pedirá demissão caso o programa seja alterado para permitir investigação de militantes da esquerda armada durante o período da ditadura militar (1964-1985).
O assunto gerou uma queda de braços entre os ministros Paulo Nanucci e Nelson Jobim, enquanto que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tem por estratégia política esperar a poeira baixar para se pronunciar a respeito de temas polêmicos, desta vez, visando as eleições deste ano, anunciou que vai retirar alguns temas polêmicos do programa para não prejudicar a imagem da ministra Dilma Rousseff, candidata do Governo à sucessão presidencial.
O líder do PT na Câmara dos Deputados, Cândido Vaccarezza, disse que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve retirar pontos polêmicos do programa, criticado pelas Forças Armadas, pela Igreja Católica, pela sociedade civil e até por ministros do governo.
"Esse programa é um erro político e atrapalha a candidatura da ministra Dilma. Quem fez isso não quer que ela ganhe a eleição", disse o vice-líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha. "É uma cilada para Dilma porque vai forçá-la a se posicionar sobre temas polêmicos", emendou o vice-líder do DEM, deputado ACM Neto (BA).
Há quem afirme ser uma autoanistia, vedada pelas convenções internacionais, subscritas pelo Brasil. O tema gerou uma queda de braços entre os ministros Paulo Vannuchi (Direitos Humanos) e Nelson Jobim (Defesa) em torno de alguns pontos do programa.
Um analista de política disse que num Brasil com 144 assassinados sob tortura pela ditadura militar e mais 125 desaparecidos das prisões administradas pelos defensores do regime de exceção, a proposta de criação de uma Comissão da Verdade chega em bom momento para levantar todo esse período, abrir arquivos e escrever a verdadeira história, imperativos restauradores da dignidade humana.
Depois de ser alvo de críticas do setor militar, o Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) é contestado agora pelo setor rural. A presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, senadora Kátia Abreu, afirmou que o plano aborda o agronegócio com "preconceito" à medida que estabelece alterações no campo e que favorece as invasões de terra.
O presidente da OAB, Cezar Britto, criticou o que chamou de pressão do ministro da Defesa, Nelson Jobim, e de comandantes militares contra a criação da Comissão da Verdade, prevista no Programa Nacional de Direitos Humanos.
"O Brasil não pode se acovardar e querer esconder a verdade. Anistia não é amnésia. É preciso conhecer a história para corrigir erros e ressaltar acertos. O povo que não conhece seu passado, sua história, certamente pode voltar a viver tempos tenebrosos e de triste memória como tempos idos e não muito distantes", declarou Britto.
"Um país que se acovarda diante de sua própria história não pode ser levado a sério. O direito à verdade e à memória, garantido pela Constituição, não pode ser revogado por pressões ocultas ou daqueles que estão comprometidos com o passado que não se quer ver revelado", disse Britto.
A OAB defende no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal Militar (STM) ações reivindicando a abertura dos arquivos da ditadura e a punição aos torturadores. Já o ministro Jobim disse que a busca pela verdade não pode significar revanchismo. Na avaliação dos militares e do ministro Nelson Jobim, o PNDH-3 tem trechos "revanchistas e provocativos". Os comandantes militares disseram que a manutenção da Lei de Anistia é "ponto de honra".
O programa foi criticado também pela Associação Brasileira das Empresas de Rádio e Televisão (Abert). O plano propõe criar uma comissão para monitorar o conteúdo editorial das empresas de comunicação. Há previsão também de penalidades como multas, suspensão da programação e cassação para empresas de comunicação, que o governo considerar que violam os direitos humanos.
Qualquer iniciativa que visa criar uma comissão que controle, que acompanhe ou que interfira no conteúdo editorial das empresas de rádio e televisão é, do nosso ponto de vista, uma forma de censura e uma forma de interferência na liberdade de expressão e na liberdade de imprensa, afirma o presidente da Abert, Daniel Slaviero.
Foto: Paulo Vannucci
ANTONIO CARLOS LACERDA
PRAVDA Ru BRASIL
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