Já antes do recesso de agosto na Colina do Capitólio, os cães da guerra atiçados por controle remoto por Telavive, e como se podia prever que fizessem, estão tentando rasgar em tiras o acordo nuclear Irã-P5+1, atacando por todos os lados.
Nem faz diferença que o National Iranian American Council - que é amplamente respeitado na mesma Washington - tenha saído em empenhada defesa do acordo.
Nem faz diferença que o governo Obama possa contar com os esforços combinados dos embaixadores dos chamados E3 (Grã-Bretanha, França e Alemanha) em Washington, que se consomem explicando o óbvio: é um tratado internacional já aprovado pela ONU, não é acerto de bate-boca de paróquia em Idaho.
Por outro lado, faz diferença, sim, que o governo Obama não se tenha empenhado suficientemente para defender sua estratégia bem como o resultado de negociação tão longa e cheia de percalços traiçoeiros.
Assim sendo, o que se tem são duas narrativas que vão modelando a batalha à frente, em Washington.
1) Irã é nação bandida, ameaça existencial a Israel e não merece confiança. Vão desrespeitar o acordo, portanto o acordo tem de ser rejeitado em benefício de... ou sanções perpétuas, ou guerra.
2) Irã é nação bandida, que não merece confiança, mas temos os mecanismos necessários para verificação e controle e, no instante em que o Irã "cometer fraude" - como sem dúvida cometerá -, lançamos imediatamente sanções "de retaliação".
Não surpreende que, nessas circunstâncias, ninguém em Teerã confie em Washington.
Quem é realmente digno de confiança?
Agora, quanto ao outro lado da narrativa.
Dia 18 de julho, quatro dias antes de o acordo ser assinado em Viena, o Líder Supremo do Irã Aiatolá Khamenei - pressentindo de que lado sopraria o vento de D.C. - tratou logo de ir direto ao ponto. A intervenção dele delineou os parâmetros pelos quais o Irã trabalharia ativamente para vencer a máquina de propaganda massiva que continua a demonizar a República Islâmica ao mesmo tempo em que promove uma vitória da diplomacia ocidental.
Em Viena, sim, foi vitória da diplomacia - Oriente e Ocidente trabalhando juntos.
Mesmo antes de seu discurso, Khamenei já tocara o ponto chave, numamensagem curta que enviou ao presidente Hassan Rouhani, na véspera do acordo ser firmado.
O parágrafo que vale ouro é o seguinte:
"...é necessário estudar muito cuidadosamente o texto que foi preparado, para assegurar que pode andar na direção legal que foi determinada para o acordo. Na sequência, no caso de ser ratificado, é necessário estar alerta para possíveis brechas, pelo outro lado, nos acordos, e bloqueá-las. Você sabe muito bem que alguns dos seis governos no campo oposto não são de modo algum confiáveis."
Os E3 podem não ser inteiramente "confiáveis", mas aqui, tudo ébusiness; não há o que Grã-Bretanha, França e Alemanha - e o resto da União Europeia, vale lembrar - desejem mais do que reiniciar os negócios com o Irã no front da energia e desse, adiante.
A batalha em Washington, por seu lado, será cruel, mesmo com o governo Obama confiante de que os cães da guerra não têm número suficiente de votos para bloquear a ratificação do acordo, como diplomatas iranianos confirmaram pessoalmente a mim, em Viena, durante as negociações.
Em Teerã, por sua vez, o acordo deve obter sem problemas a aprovação da Assembleia Consultiva.
O resumo da história em termos de realpolitik, como o próprio Khamenei definiu, é que o Muro de Desconfiança EUA/Irã parece destinado a permanecer onde está - e muito além do acordo nuclear. Múltiplas facções de Washington, para nem falar do Pentágono, continuam a considerar o Irã como "ameaça", nação bandida, o mal encarnado; e Teerã vê Washington como "o coração da arrogância global".
Por tudo isso, a via geopolítica futura do Irã - aconteça o que acontecer depois de o acordo ter sido ratificado nas duas capitais e de o pacote de sanções começar a ser levantado ao final de 2015/início de 2016 - é a integração à Eurásia, como discuto em detalhe em "O Big Bang eurasiano" [traduzido em Oriente Mídia (NTs)].
Implica cooperação mais próxima - e parceria estratégica de três vias - entre Irã, Rússia e China. O que por sua vez implica que os cães da guerra do "Bombardeiem o Irã" ficarão ainda mais sedentos de sangue. *****
30/7/2015, Pepe Escobar, RT
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