Mauro Lourenço Dias (*)
Em meados do século XVIII, quando assumiu de vez as rédeas do governo português, depois do terremoto de 1755, que destruiu boa parte de Lisboa e arredores, o ministro Sebastião José de Carvalho e Melo (1699-1782), que passaria para a História como marquês de Pombal, inspirado no capitalismo inglês que conhecera de perto ao viver como diplomata em Londres, decidiu implantar uma política que estimulava a criação de empresas monopolistas sob à sombra do Estado.
Se não se pode dizer que essa política constituiu um rotundo fiasco, por outro lado, não é possível afirmar que tenha tirado Portugal do atraso secular em que se encontrava. Pelo contrário. Foram os interesses das empresas monopolistas de Lisboa que estimularam boa parte dos parlamentares das Cortes a uma cartada decisiva em 1822 que levaria aquele país a perder a "jóia da coroa", ao tentar obrigar o Brasil a voltar ao status de colônia, em vez de reino unido.
Àquela época, a cegueira desse parlamentares não os deixava ver que os papéis haviam sido invertidos. E que fora Portugal que virara colônia, o que, aliás, já havia sido reconhecido pelos revoltosos liberais do Porto no manifesto que divulgaram em 1820. Sob essa ótica, quem ficou independente em 1822 foi Portugal e não o Brasil, que já era a maior e mais essencial parte dos domínios da coroa, como dizia D. Rodrigo de Sousa Coutinho (1745-1812), o maior ministro que o príncipe regente D. João (1767-1826) teve.
Ainda que em outras circunstâncias, reeditar aquela velha política pombalina é o que tem feito o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ao escolher empresas privadas consideradas vencedoras para serem engordadas com dinheiro público, ainda que estas organizações exibam saúde financeira, além de meios de buscar crédito no exterior a custo baixo. Faz-se assim, por critérios nunca totalmente claros, uma brutal transferência de renda da população, sobretudo das camadas mais pobres, para poucos empresários já bem ricos.
Segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a população tirou do bolso R$ 21 bilhões para custear subsídios a R$ 236 bilhões em empréstimos que o Tesouro repassou ao BNDES para suprir grandes empresas de crédito. Já as pequenas e médias empresas nem passam pela porta do BNDES: na maioria, ou não têm acesso ao crédito ou, então, levam tanto tempo para conseguir a aprovação de um financiamento que desistem a meio caminho.
Como se sabe, a atual política industrial foi bancada praticamente pelo BNDES. E, convenhamos, sem a participação desse banco de fomento, a situação teria sido ainda pior. Mas uma nova política industrial não pode depender apenas de financiamentos públicos. É necessário criar condições para que a indústria nacional se torne mais competitiva. Hoje, o que se vê é a indústria perder não só espaço no exterior como no mercado interno.
A esperança é que o novo governo democratize o acesso ao financiamento pelo BNDES. Ou, ao menos, reserve recursos para criar uma política industrial e de comércio exterior que afaste de vez o perigo da desindustrialização que ronda vários setores. É o que se espera que ocorra com a entrada em funcionamento "em breve" do BNDES-Exim, braço do banco voltado para o financiamento do comércio exterior. Só assim o País poderá exportar mais produtos manufaturados e serviços de alto valor agregado. Vamos aguardar para ver.
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(*) Mauro Lourenço Dias é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br
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