Milton Lourenço (*)
Estudo do Departamento de Competitividade e Tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) mostrou que, entre agosto e dezembro de 2008, 18 setores da economia, responsáveis por 76% das vendas externas, tiveram suas receitas de exportação reduzidas em 30%, apesar da alta de 49% na cotação do dólar. Em volume exportado, a queda ficou ao redor de 20%.
Em janeiro, o resultado acumulado piorou, o que levou o governo a buscar saídas para evitar que o déficit da balança comercial se agravasse ainda mais. Pena que o tenha feito de maneira atabalhoada, sem refletir sobre as conseqüências de seu ato.
Ao estabelecer a exigência afinal, revogada de licença automática a produtos acabados de 24 setores, a pretexto de monitorar dados estatísticos, o governo pretenderia dificultar a entrada de quinquilharias asiáticas, mas não imaginou que a medida poderia também levar indústrias de São Paulo, da Zona Franca de Manaus e outros Estados a interromper suas produções. Até porque essas indústrias dependem de componentes importados e, nas atuais circunstâncias, há muito deixaram de fazer estoques, dependendo de uma importação rápida.
Como a exigência de licença prévia para importação atingia setores que representam 60% das importações brasileiras, prevaleceu o bom senso e a medida foi revogada em menos de 24 horas. A decisão demonstrou a preocupação do governo com a acentuada desaceleração das exportações brasileiras no início deste ano. Afinal, o déficit de janeiro ficou bem acima das previsões, pois a maioria dos especialistas esperava um pequeno superávit. Isso, porém, não justificaria a adoção de medidas protecionistas, já que o País possui reservas de US$ 202 bilhões, que seriam mais do que suficientes para cobrir esse déficit.
Com o recuo do governo, só cerca de 10% da pauta dos produtos continuam a depender de licença de importação não automática, o que exige a emissão de Licença de Importação, como é o caso de material usado ou de produtos que gozem de algum benefício tributário, conforme estabelece a portaria Secex nº 25, de 27/11/2008.
Até quando o governo irá manter-se nessa posição é impossível saber, mas a expectativa é que, a partir de maio, quando começa a safra agrícola, o cenário para o comércio exterior brasileiro comece a ficar mais claro. Por enquanto, ao contrário dos anos anteriores, o governo não faz previsões nem estabelece meta para as exportações. Na melhor das hipóteses, seus técnicos arriscam que as exportações em 2009 vão chegar a US$ 202 bilhões, aceitando, porém, um resultado mínimo de US$ 158 bilhões, se nada correr bem.
Em compensação, as importações deverão cair não em razão de medidas burocráticas como a que o governo ensaiou adotar e, depois, voltou atrás, mas em função da queda na atividade doméstica. Seja como for, o País deve refletir muito bem antes de adotar uma medida que possa significar mudança significativa de rota de sua política de comércio exterior. Afinal, até aqui, o Brasil tem se destacado como defensor em fóruns internacionais, especialmente na Rodada Doha, de maior abertura de mercados. E não pode aparecer agora como paladino de medidas protecionistas.
Portanto, o que se espera, nos próximos meses, é que as autoridades brasileiras tenham muita habilidade para não deixar o País cair numa armadilha, especialmente em relação ao comércio com a China, hoje um grande comprador e o segundo parceiro brasileiro. Está claro que, com os EUA em fase de desaceleração, a China também vai desacelerar, já que é dependente em grande parte do mercado norte-americano, embora em menor velocidade porque ainda tem muito a crescer. Isso quer dizer que, com menor perspectiva de ampliar os negócios nos EUA e na Europa, chineses e demais exportadores asiáticos deverão buscar outros alvos, o que inclui a América Latina.
Isso não significa apenas maior competição para os exportadores brasileiros de manufaturados em países latino-americanos, mas que o mercado nacional também ficará mais vulnerável à competição. Mesmo porque a China em dezembro concedeu novos incentivos fiscais às suas exportações, estendendo-os a 3.770 produtos, 28% dos itens normalmente vendidos ao exterior.
O que fazer? É certo que não se pode fechar o mercado brasileiro a produtos asiáticos, até porque o Brasil, se cresceu bastante nos últimos cinco anos de bonança mundial, foi porque, em grande parte, aproveitou-se do crescimento da China, hoje igualmente um grande comprador. Encontrar a medida certa nesse relacionamento comercial é o grande desafio que se avizinha para os próximos meses. Que haja sabedoria entre os nossos negociadores para que possamos superá-lo sem traumas.
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(*) Milton Lourenço é diretor-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São Paulo-SP.
E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br
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