A Pandemia que matou entre 60 a 150 mil portugueses apresenta características semelhantes ao vírus H5N1 da Gripe de Aves. Os pintores Amadeu de Sousa Cardoso e Guilherme Santa Rita, o compositor António Fragoso e os pastorinhos de Fátima, Jacinta e Francisco foram algumas das vítimas da mais severa epidemia da história da humanidade
O Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL) promove, nos próximos dias 15 e 16 de Novembro, um amplo debate dos maiores realizados até agora em Portugal sobre o tema da Gripe Pneumónica de 1918, os seus efeitos no nosso país e semelhanças com as pandemias da actualidade. O colóquio internacional Olhares sobre a Pneumónica vai contar com a participação de um extenso painel de investigadores nacionais e estrangeiros que se irá debruçar sobre as características deste surto epidémico, as respostas políticas, médico-sanitárias, sociais e culturais que suscitou, as suas percepções e representações e as controvérsias científicas de que foi pretexto.
Um comunicado recente da organização da ONU para a Agricultura e Alimentação (FAO) adverte que a evolução da Gripe das Aves iniciou uma nova etapa de forma silenciosa no coração da Europa e que é possível que existam mais vírus em circulação na Europa do que se pensa actualmente. O alerta surge meses depois de um estudo divulgado pela revista Nature que confirma a semelhança entre vírus H5N1, que está na origem da Gripe das Aves, e o vírus da gripe de 1918.
Crise política e económica agrava efeitos do surto
A mais severa pandemia da história da humanidade foi a causa mais importante de mortalidade do século XX e calcula-se que tenha provocado entre 22 a 50 milhões de mortos em todo o mundo. Em Portugal, a gripe pneumónica atingiu o seu momento culminante no Outono de 1918, prolongando-se até aos primeiros meses de 1919. Não existem estimativas seguras para o número de vítimas no nosso país mas vários estudos realizados admitem baixas entre as 60 e as 150 mil pessoas.
O surto fez sentir os seus efeitos num país submetido ao governo autoritário presidencialista de Sidónio Pais, apoiado pelos meios mais conservadores e envolvido no conflito mundial na Europa e em África. Este clima de convulsão política estava associado a uma conjuntura de crise económica que se fazia sentir no plano de abastecimento alimentar, numa aguda conflituosidade social e uma exacerbada guerra cultural entre a Igreja e os meios religiosos.
Longe de possuir as infra-estruturas públicas aceitáveis, Portugal revelou profundas carências ao nível de serviços de saúde pública e incapacidade médica e sanitária para lidar com este surto que matou milhares de pessoas, entre elas, nomes famosos como os pintores Amadeu de Sousa Cardoso e Guilherme Santa Rita, o compositor António Fragoso e os pastorinhos de Fátima, Jacinta e Francisco.
Este encontro de especialistas corresponde à fase final do projecto de investigação Gripe Pneumónica em Portugal: Gestão do Risco e Saúde Pública no Portugal da Primeira República" , financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e associa investigadores de várias áreas. O colóquio - organizado por José Manuel Sobral (ICS), Maria Luísa Lima, Paula Castro e Paulo Silveira e Sousa (os três do ISCTE) conta com a presença de investigadores que estudaram este tema noutro país como é o caso de David Killingray (University of London), Liane Bertucci-Martins (Universidade Federal do Paraná), Beatriz Echeverri Dávila (Universidad Complutense de Madrid) e Anny Torres Silveira (Universidade Federal de Minas Gerais).
Paralelamente ao debate, o ICS vai realizar o concerto Música no Tempo da Primeira República, que conta com a participação de Lúcia Lemos (voz) e Anne Kaasa (piano) que irão interpretar obras de Maurice Ravel, Franscisco de Lacerda, Manuel de Falla e Pedro Blanco. Uma exposição de fotografias do período de 1918-1919 completa o calendário de acções paralelas ao colóquio.
Fonte: Imago
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