RESPOSTA À CARTA: "CASTELHANO? NO, GRACIAS"

Escrevo esta carta aberta como resposta a HPAP (que imagino sejam as iniciais de um nome) como um brasileiro, falante de português como primeira língua, mas que também conhece e fala fluentemente o castelhano.

Confesso que ignorava por completo os problemas entre Portugal e Espanha pela soberania de Olivença, e não entrarei nesta questão, que não posso julgar. Quero falar mais especificamente sobre os preconceitos e rivalidades que existem entre as línguas portuguesa e castelhana.

Para começar, é preciso notar que esta rivalidade não faz o menor sentido, pelo simples fato que não estamos tratando de idiomas distintos. Português, castelhano e galego são simplesmente variações dialetais, as diferenças entre estas três línguas são quase que apenas fonéticas, ou seja, apenas as mesmas palavras pronunciadas de maneira diferente. De resto (na conjugação de verbos e no vocabulário, por exemplo), português, castelhano e galego são simplesmente próximos demais para serem considerados como línguas distintas.

Mas talvez exatamente por suas semelhanças, há tanta gente, tanto no Brasil quanto em Portugal, que parece querer levantar uma rivalidade forçada entre as duas línguas. Como se, para afirmar a sua própria, fosse preciso denegrir a do outro. O senhor (ou senhora, não sei) HPAP demonstra um preconceito absurdo e ridículo ao afirmar que o castelhano é "a lí­ngua dos feirantes e peixeiros, no sentido em que, para serem ouvidos e compreendidos, têm que falar alto e com palavrões", esquecendo-se (ou fingindo não ver) que o castelhano é a língua de autores clássicos e mundialmente conhecidos como Calderón de la Barca e Miguel de Cervantes, além de grandes escritores latino-americanos como Jorge Luis Borges, Octavio Paz, Gabriel García Marques e Mario Vargas Llosa.

Neste sentido, é natural que no Brasil se queira colocar o ensino do castelhano como obrigatório no currículo de suas escolas. É um fator importantíssimo de integração regional, pois quase todos nossos vizinhos falam essa língua (ou melhor, esse dialeto). Não significa que a longo prazo o Brasil deixará de ser um país lusófono. Mas facilitará as nossas relações com nossos vizinhos, algo importantíssimo considerando-se que o Mercosul (a área de livre comércio entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, com Bolívia e Chile como associados e vários outros negociando para entrar nela) pretende ser mais do que uma associação comercial, assim como a União Européia.

E não são apenas os brasileiros que aprendem castelhano: nos outros países sul-americanos é comum o aprendizado do português. Posso afirmar, por experiência própria, que a demanda por aulas de português é bastante alta na Argentina, e colocar no currículo de trabalho "conhecimento de português" é algo que ajuda a conseguir um emprego neste país, considerando a integração comercial entre os dois países do Mercosul.

Enfim, toda afirmação de sua cultura ou língua através do desprezo da dos outros nada mais é do que nacionalismo grosseiro e obscurantista, um retrocesso numa época em que tantos países (como os da União Européia e, ainda em grau menor, os da América do Sul) buscam aproximar-se e integrar-se. Tenho certeza que há muitos falantes do castelhano que também sentem desprezo pelo português. O que não justifica tanto ressentimento como o expressado por este artigo.

Felizmente, a maior parte dos brasileiros não manifestam tanto desprezo pelo castelhano - e imagino e espero que os portugueses tampouco. Esta última palavra, aliás, é um castelhanismo bastante corrente no português. Carlo MOIANA Pravda.ru Brasil

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